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    Incêndio em galpão da Cinemateca foi acidental, conclui PF

    Chamas destruíram parte do acervo da entidade na zona oeste de São Paulo em julho do ano passado

    Carolina FigueiredoLéo Lopesda CNN , em São Paulo

    A investigação conduzida pela Polícia Federal (PF) sobre o incêndio em um galpão da Cinemateca Brasileira no ano passado concluiu que o episódio foi acidental.

    “Segundo o laudo da PF os peritos consideraram a causa do incêndio como acidental, durante a manutenção do sistema de climatização realizado por empresa terceirizada”, informou a Secretaria Especial de Cultura, em nota.

    “A Secretaria Especial da Cultura avalia medidas administrativas/judiciais no sentido de apurar responsabilidades com vistas a recomposição ao dano ao patrimônio público”, acrescenta.

    O incêndio aconteceu em um galpão da Cinemateca no bairro da Vila Leopoldina, na cidade de São Paulo. A estimativa do Corpo de Bombeiros indicou que o fogo atingiu cerca de 300 m², o que incluiu três salas com arquivos históricos.

    As chamas apagaram uma parte relevante do registro audiovisual do país, de importância mundial, e o caso foi visto como um desastre anunciado. O governo já tinha sido alertado sobre o risco pelo Ministério Público, pela imprensa e por especialistas.

    Na manhã seguinte ao incêndio, o governo federal publicou um edital para contratar uma entidade para cuidar da instituição em São Paulo.

    Cerca de quatro toneladas de documentos sobre a história do cinema no Brasil, incluindo parte do acervo de Glauber Rocha, estavam entre os materiais armazenados no galpão da cinemateca.

    Tradicional logo da Cinemateca foi criticado / Sociedade Amigos da Cinemateca/ Divulgação

    A Cinemateca é de responsabilidade do governo federal e é gerida por meio da secretaria especial de cultura em Brasília.

    Por não ter o auto de vistoria do Corpo de Bombeiros, o imóvel recebeu uma advertência e tem um prazo de 180 dias para a regularização. Em uma audiência pública no dia 20 de julho do ano passado, o Ministério Público em São Paulo alertou para o risco de incêndio.

    Um documento registra que após uma visita ao local, o MP identificou risco, principalmente, em relação aos filmes de nitrato.

    Cinemateca em chamas: qual o melhor modelo de gestão na cultura

    O incêndio que atingiu o galpão da Cinemateca reativou o debate em torno do modelo de gestão da entidade, que guarda o maior acervo da América Latina dedicado ao cinema.

    Há um ano, ela vinha sendo administrada diretamente pelo governo federal. Na manhã seguinte ao incêndio, a Secretaria Especial de Cultura publicou um edital para a escolha de uma organização da sociedade civil que ficará responsável por cuidar do espaço.

    A gestão da Cinemateca era feita pela Associação de Comunicação Recreativa Roquette Pinto (Acerp), organização social baseada no Rio de Janeiro que já fazia a gestão da TV Escola para o governo federal, desde 2018.

    O contrato se encerrou no final de 2019 e não foi renovado. Em agosto de 2020, todos os funcionários ligados à Acerp foram demitidos e o governo federal retomou a gestão, prometendo o lançamento de um novo edital para escolha de uma nova entidade gestora – o que só aconteceu na manhã seguinte ao incêndio.

    A demora na publicação das regras para o processo vinha sendo criticada pelo setor audiovisual.

    Cinemateca na Vila Leopoldina pega fogo
    Fogo na Cinemateca: sem vistoria dos Bombeiros e sob administração federal, acervo está sob risco / ESTADÃO CONTEÚDO

    Como revelou a CNN, o Ministério Público Federal chegou a questionar o que chamou de “estrangulamento financeiro e abandono administrativo” da instituição e alertou o governo, em audiência no dia 20 de julho, da possibilidade de incêndio nas instalações da Cinemateca.

    Procurados pela reportagem, o Ministério do Turismo e a Secretaria Especial de Cultura não responderam.

    Especialistas se dividem sobre qual modelo de gestão é mais eficiente e adequado para a Cinemateca e outros equipamentos culturais.

    “O modelo de gestão é central no que aconteceu”, diz o pesquisador e professor da Universidade de São Paulo (USP) Carlos Augusto Calil, presidente da Sociedade Amigos da Cinemateca.

    Vista aérea do galpão da Cinemateca Brasileira na Vila Leopoldina, em São Paulo
    Vista aérea do galpão da Cinemateca Brasileira na Vila Leopoldina, em São Paulo, após incêndio / Ronaldo Silva/Futura Press/Estadão Conteúdo

    “Escolher uma organização social não vai resolver o problema. A Cinemateca precisa ser reestatizada, precisam ser realizados concursos para a contratação de pessoal especializado.”

    O grupo Trabalhadores da Cinemateca Brasileira, que inclui funcionários demitidos pelo governo federal em agosto do ano passado, também questionou o edital.

    “O incêndio da noite de ontem é mais um motivo pelo qual não podemos esperar para dar um basta à política de terra arrasada e de apagamento da memória nacional”, afirmaram em comunicado divulgado na manhã de sexta-feira, no qual reclamam da “falta de transparência” na condução do processo.

    Vista aérea do galpão da Cinemateca Brasileira na Vila Leopoldina
    Vista aérea do galpão da Cinemateca Brasileira na Vila Leopoldina, nesta sexta-feira (30), um dia depois do incêndio / Ronaldo Silva/Futura Press/Estadão Conteúdo

    “O modelo proposto não dá conta da complexidade de um órgão desse porte”, completa o texto.

    Professora de Gestão Pública da Fundação Getúlio Vargas, Regina Silvia Pacheco discorda.

    “Em quarenta anos de pesquisas e trabalhos sobre administração pública, eu posso afirmar com toda a certeza que não existe gestão eficiente na cultura por meio de administração direta. Falar em reestatizar é um retrocesso”, diz.

    Ela lembra que o Museu Nacional, que pegou fogo em 2018 no Rio de Janeiro, é administrado diretamente pelo estado.

    Outros incidentes, como os incêndios no Teatro Cultura Artística, em 2008; no Museu da Língua Portuguesa, em 2015; e no Teatro Municipal do Rio de Janeiro, em 2017, aconteceram em instituições com diferentes formas de gestão.

    “O problema não está no modelo, mas no modo como a gestão é feita, na atenção que de fato se dá a ela.”

    Fachada da Cinemateca Brasileira
    Fachada da Cinemateca Brasileira / Cinemateca

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