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    Entenda o conflito entre polícias de São Paulo que envolve a possível mudança de registro de ocorrências

    Grupo de trabalho foi criado para estudar, durante os próximos 45 dias, a viabilidade da implantação do Termo Circunstanciado de Ocorrência (TCO) pela Polícia Militar

    Imagem de viatura da Polícia Militar de São Paulo
    Imagem de viatura da Polícia Militar de São Paulo Reprodução/ Twitter PMESP

    Marcos Guedesda CNN

    São Paulo

    Desde a última semana, o governador Tarcísio de Freitas (Republicanos) tenta apaziguar os ânimos de policiais civis e entidades de classe, que reagiram a uma possível mudança no registro do Termo Circunstanciado de Ocorrência (TCO), que atualmente é elaborado pela corporação, e passaria a ser responsabilidade da Polícia Militar.

    Após as reclamações e a crise, até então negada pelo governo, um grupo de trabalho foi criado para estudar, durante os próximos 45 dias, a viabilidade da implantação do TCO pela Polícia Militar e o boletim de ocorrência único, antiga demanda da Polícia Civil.

    A CNN teve acesso a documentos, ouviu especialistas e representantes das classes que permeiam o tema para entender como funciona a elaboração do TCO e o que as mudanças poderiam acarretar na prática.

    Atualmente, a Polícia Civil de São Paulo é a organização responsável por elaborar o TCO, que nada mais é do que um registro de ocorrência relativa a infrações de menor potencial ofensivos, com penas máximas de até dois anos.

    O registro é feito em uma delegacia da área dos fatos depois que equipes da Polícia Militar atendem o chamado via 190 (ou presenciam a ocorrência) e acompanham os envolvidos até a elaboração do documento.

    Depois do registro, a documentação é encaminhada aos Juizados Especiais Criminais (Jecrim) para audiência e resolução.

    Mudança de atribuição

    A documentação que tiraria a atribuição da Polícia Civil ainda está em trâmites iniciais. Em linhas gerais, a minuta diz que um policial militar passaria a registrar os crimes de menor potencial ofensivo no local da ocorrência, sem a necessidade de ir até uma delegacia.

    Nesse formato, as informações seriam transmitidas diretamente aos Juizados Especiais Criminais, sem a presença da polícia judiciária. Segundo fontes consultadas, no caso de aprovada, a modalidade será colocada em prática já em dezembro deste ano.

    De acordo com o cronograma da proposta de mudança da elaboração do TCO que, neste momento, tramita nos gabinetes do governo do estado e da Secretaria de Segurança Pública (SSP), ainda há diversas etapas a serem cumpridas.

    Caso seja aprovada na SSP, a documentação é devolvida ao palácio do governo, que em tese faz uma nova avaliação. Estando de acordo com os termos, o governador pode assinar para dar prosseguimento no processo.

    Em uma terceira etapa – e no caso de seguir o rito sem intercorrências – a documentação segue para o Tribunal de Justiça, que faz uma nova avaliação. Somente depois dessa possível aprovação, é que um convênio seria assinado juntamente com o governo do estado e representantes da SSP.

    Posições divergentes

    De acordo com o coronel da reserva e advogado Frederico Afonso, que também é membro permanente da Comissão de Direitos Humanos da OAB/SP, a mudança no registro significa um ganho de tempo e também economia de verbas públicas.

    Ele ressalta que com a mudança, não haveria a necessidade de deslocamento de uma viatura da PM até a delegacia e que a elaboração do Termo Circunstanciado já seria feita no local da ocorrência e enviada ao juizado.

    “Para a PM, a importância maior é ter uma viatura no local dos fatos que já registra a ocorrência, de forma que não tenha o afastamento desnecessário da área de atuação. O cenário também aumenta o policiamento ostensivo”, explica.

    Por outro lado, representantes da Polícia Civil, entre eles, o deputado federal Delegado Palumbo (MDB), criticaram o cenário chamando a situação de “usurpação” e “equívoco”, segundo publicação do Sindicato dos delegados de Polícia de São Paulo.

    “Quantas chamadas do telefone 190 deixam de ser atendidas, atualmente? Milhares. A população liga no 190, não vai viatura, não vai ninguém. E vão colocar a PM para fazer Tcs?”, teria questionado o parlamentar.

    O delegado-geral da Polícia Civil de São Paulo, Artur José Dian, também reagiu e disse em um vídeo publicado nas redes sociais que o registro das ocorrências não dá o direito de investigação.

    “Referente ao termo circunstanciado elaborado por outras instituições através do registro de ocorrências, não as dá direito de efetuar investigações criminais e somente se ater aos limites das decisões do nosso Supremo Tribunal Federal”, explicou.

    O tema também foi comentado por Coronel Frederico, que explicou que o TC não é ato de investigação, e sim um simples registro de ocorrência, que pode ser feito pelas Polícias Militares.

    “Os crimes temáticos, crimes com especificidades, a pessoa terá que ir à delegacia. Em casos de violência doméstica ou casos envolvendo a criança e adolescentes, o procedimento será o mesmo de hoje. Ou seja, o policial vai até a delegacia para registro da ocorrência e devidas providências”, explica.

    Secretário de Segurança Pública de São Paulo, Guilherme Derrite, em vídeo gravado com a cúpula da Polícia Civil sobre imbróglio entre as polícias em relação aos termos circunstanciados de ocorrência / Reprodução

    O que dizem os juristas

    As posições divergentes também avançam sobre quem não está diretamente envolvido no cenário.

    Para o advogado constitucionalista e criminalista Adib Abdouni, a discussão sobre o Termo Circunstanciado ser elaborado pela PM já aconteceu no Supremo Tribunal Federal (STF), que se posicionou pela ausência de inconstitucionalidade.

    “Considerando-se que o Termo Circunstanciado não encerra em si um procedimento investigativo, mas sim, peça informativa com descrição detalhada do fato delituoso de menor ofensividade, é correto o entendimento de se reconhecer que não há razão constitucional para restringir sua lavratura pela Polícia Judiciária”, explica.

    Em contrapartida, o advogado criminalista e sócio de Bialski Advogados Bruno Borragine, bate na tecla que a PM é uma polícia ostensiva e que a atribuição da Polícia Civil é de investigação.

    “A Polícia Militar não tem poder de investigação. A lei não permite que a Polícia Militar faça investigação. E se o Estado de São Paulo expedir essa portaria que eles estão querendo fazer, eu já te adianto que é inconstitucional”, finaliza.