Em conversa com Mourão, embaixadores europeus cobram resposta ao desmatamento
Segundo diplomatas, encontro também abordou as relações entre Brasil e União Europeia, acordo UE-Mercosul, a proteção do meio ambiente e a pandemia da Covid-19
O vice-presidente, Hamilton Mourão (PRTB), atendeu, por videoconferência, nessa quinta-feira (14), 29 representantes de países europeus e o próprio embaixador da União Europeia (UE) no Brasil, Ignacio Ibáñez, para um diálogo sobre o aumento no desmatamento ilegal da Amazônia. O vice, que coordena o Conselho da Amazônia criado no início deste ano, foi cobrado por embaixadores estrangeiros sobre o aumento nos índices de desmatamento em plena pandemia do novo coronavírus.
De acordo com a consultoria Eurasia Group, os alertas de desmatamento no mês de abril, emitidos pelo Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais (Inpe), subiram 51% com relação ao mesmo período do ano passado.
Diplomatas ouvidos pela CNN relataram que a reunião também abordou as relações entre Brasil e União Europeia, o acordo UE-Mercosul, a proteção do meio ambiente e a pandemia da Covid-19.
Há duas semanas, o Itamaraty não deu resposta ao convite feito pela União Europeia e outros países europeus para que o Brasil se juntasse à aliança global para o combate ao novo coronavírus. Ao todo, a iniciativa captou € 7,4 bilhões, mas não contou com a participação brasileira e nem dos Estados Unidos.
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“Foi uma reunião muito produtiva em que discutimos a relação UE/Brasil, o Acordo de Associação UE/Mercosul, a Covid-19, a proteção do patrimônio natural do Brasil e a importância da cooperação internacional. Tivemos a oportunidade de conversar com o vice-presidente sobre a preservação da Amazônia e também sobre a situação dos povos indígenas na Amazônia. Foi um encontro muito útil para todos nós”, disse à CNN o embaixador Ignacio Ibáñez.
Outro diplomata que esteve no encontro relata ainda que Hamilton Mourão é “mais conciliatório que Ricardo Salles”, referindo-se à dificuldade de dialogar com o Ministro do Meio Ambiente.
“Tive a impressão de que ele entende que a UE leva a sério o meio ambiente e a Amazônia, e que o acordo UE-Mercosul está na equação, uma vez que a ratificação parlamentar é necessária em todos os países da UE”, afirmou à CNN o embaixador de um país europeu. “Em muitos de nossos países, as novas estatísticas sobre desmatamento foram manchetes no fim de semana.”
Uma fonte ligada ao Serviço Europeu de Ação Exterior (EEAS) avalia que a ratificação do tratado de livre comércio entre Mercosul e União Europeia será permeada pela política ambiental do governo de Jair Bolsonaro (sem partido). “Quando chegar o momento da ratificação, o Brasil vai precisar demonstrar melhora nesses indicadores ambientais, incluindo a redução no desmatamento ilegal”. Atualmente, o acordo se encontra em fase final de ajustes no texto e nas traduções para as 24 línguas oficiais dos países da UE. Depois disso, será submetido à aprovação pelo Conselho Europeu e pelos parlamentos europeu e nacionais.
Um embaixador que esteve com Mourão na quinta, no entanto, é cético quanto às ações do governo brasileiro. “O que o governo está fazendo é suficiente? Terá resultados em longo prazo na redução do desmatamento? É questionável”, avalia. “Mourão falou muito sobre a cooperação com o Ibama, mas por outro lado o governo demite funcionários do Ibama que fazem ações efetivas contra o desmatamento”, disse ele.
“Estamos também preocupados com a MP 910. Os pequenos proprietários de terra já têm possibilidades de regularizar suas terras sob as leis atuais. Essa MP vai apoiar apenas os grandes empresários”, afirmou o diplomata, referindo-se à medida provisória que flexibiliza normas para a regularização fundiária.
O governo Bolsonaro defende que as mudanças introduzidas pela 910 simplificam o processo e vão beneficiar cerca de 300 mil famílias que ocupam terras da União há mais de cinco anos. Mas a oposição alega que a MP facilita a grilagem e anistia criminosos ambientais.
Fundo Amazônia
Em seu primeiro pronunciamento como presidente do Conselho da Amazônia, em março, Mourão disse que se envolveria pessoalmente nas negociações com Alemanha e Noruega para desbloquear os repasses dos dois países para o Fundo. Em 2019, os recursos foram congelados pelos dois governos, em virtude do aumento no desmatamento da Amazônia e também do escândalo das queimadas.
À CNN, uma fonte no governo norueguês, maior contribuinte do Fundo, avalia que não há perspectiva de desbloqueio desse dinheiro no curto prazo, enquanto o Brasil não demonstrar resultados no combate ao desmate ilegal da floresta amazônica.