Discord: MP de SP trabalha para identificar agressores de pelo menos 50 vítimas
Força-tarefa dedicada a identificar abusadores na plataforma tem sete promotores. "Crimes praticados de uma forma nunca antes vista", avalia investigador
O Ministério Público de São Paulo trabalha desde o mês passado em uma força-tarefa para identificar pelo menos 50 crianças e adolescentes vítimas de abusos na plataforma Discord.
Nas últimas semanas, cinco pessoas foram presas por incitar mutilações, realizar estupros virtuais e praticar uma série de ameaças usando a rede social.
O MP pede para que denúncias sobre crimes no aplicativo sejam enviadas para o e-mail nai.intolerancia@mpsp.mp.br. Em reação, o Discord atualizou suas políticas de segurança e lançou na terça-feira (11) um serviço para apoiar os pais na observação do que os adolescentes e crianças estão fazendo na rede social.
Sem saber o teor das conversas, os responsáveis poderão saber quais as comunidades que os filhos estão usando, usuários com quem fizeram chamadas e pessoas adicionadas.
Menos conhecido que os já tradicionais Facebook, Twitter, Instagram e WhatsApp, o Discord surgiu como um fórum de discussão de jogos de videogames em 2015, mas, no Brasil, se tornou célebre pela explosão de crimes cometidos na plataforma.
O MP criou uma Força-Tarefa com sete promotores e partiu do relato de uma testemunha que entregou aos investigadores um conjunto grande de vídeos e áudios sobre diversos canais no Discord.
Nas mídias, meninas jovens são ameaçadas, incitadas a se mutilar, sofrem estupro virtual e tortura em um ambiente impregnado de racismo, misoginia e apologia ao nazismo, de acordo com documentos das investigações obtidos pela CNN.
Além da identificação das vítimas, o MP investiga a utilização da plataforma como um banco de dados para materiais de pedofilia.
Também há um inquérito para investigar e apurar a responsabilidade civil do próprio Discord: para os investigadores, há falta de segurança na plataforma e que propicia a ocorrência de diversos crimes, e os mecanismos que a plataforma tem para filtragem de conteúdo a crianças e adolescentes e de moderação de conteúdo criminoso ainda não são claros.
“Destacam-se aqueles praticados contra crianças e adolescentes do gênero feminino, nos quais as ofendidas, seduzidas ou de alguma forma colocadas em erro, cedem imagens e vídeos de si mesmas com conteúdo pornográfico ou de nudez e, posteriormente, são constrangidas pelos agentes, mediante ameaça de exposição de tais imagens e vídeos, a cumprirem suas ordens, que abrangem, nos casos concretos até então verificados, a exposição de seus corpos até a automutilação em transmissões online na plataforma Discord”, diz trecho da manifestação do MP, feita no mês passado.
“São crimes praticados de uma forma que nunca antes foi vista neste ambiente virtual. Há muito sadismo e perversidade no material”, diz o promotor Danilo Pugliesi, que atua na força tarefa. “Uma testemunha conseguiu acesso a esses grupos e estamos trabalhando para identificar dezenas de logins. São pelo menos 50 vítimas, mas o número vai crescer”, resumiu.
Ministério da Justiça enxerga mudança de postura
As discussões do projeto de lei 2630, conhecido como projeto de Lei das Fake News, e os ataques às escolas realizados em São Paulo e Santa Catarina fizeram o Ministério da Justiça aumentar a atenção com as plataformas digitais.
Muitas pressões e cobranças depois, a avaliação é de que o problema ainda persiste e a colaboração dos portais com os investigadores ainda precisa melhorar – mas alguns avanços foram perceptíveis em casos como o do Discord.
“Nós temos um longo caminho a percorrer, mas temos o indício de que uma colaboração das plataformas com o atendimento das demandas do Ministério está sendo feita. No caso do Discord, abrimos conversa durante a operação de segurança nas escolas, e eles estão montando um sistema para colaborar”, comentou a coordenadora de Direitos Digitais do Ministério da Justiça, Estela Aranha.
Discord informa ter removido 12 mil usuários que cometeriam crimes na plataforma
A CNN questionou o Discord sobre as queixas do Ministério Público de São Paulo sobre a falta de colaboração da plataforma com as investigações.
Em nota, o aplicativo informou que não pode comentar investigações específicas, mas está “empenhado em cooperar com as agências de aplicação da lei no Brasil e empenhada em prevenir danos”.
Em seis meses o Discord informa ter removido proativamente 12 mil usuários que traziam material nocivo para as comunidades brasileiras da rede. Além disso, a plataforma informou que deu dados cruciais a investigações que levaram à prisão de indivíduos que preparavam ataques a escolas.