Dez mil imóveis com títulos cancelados no Pará foram usados para grilagem, diz estudo
Imóveis "fantasmas" poderiam ser retomados pelo estado, mas apenas um foi recuperado em 12 anos
Um estudo do Imazon da Clínica de Direitos Humanos da Universidade Federal do Pará (UFPA) aponta suspeita de grilagem no cancelamento dos títulos de mais de 10 mil imóveis no Pará.
Os títulos cancelados chegam a uma área que corresponde a 73% do estado. Isso seria impossível, já que o Pará já possui quase 50% de seu território formado por áreas protegidas.
Segundo o levantamento, cerca de 332 desses imóveis realmente existem. Mas, em 12 anos, apenas um foi retomado pelo estado.
Há, por exemplo, uma área de floresta pública equivalente a dez vezes o tamanho da cidade de São Paulo, que poderia ser recuperada e destinada para a conservação.
Os números reforçam a suspeita de grilagem de terras públicas e a existência de registros fantasmas, ou seja, de títulos que só existem no papel para obter vantagens econômicas.
O total de 10.728 registros de imóveis foram cancelados seguindo um entendimento do Conselho Nacional de Justiça (CNJ) de 2010.
Segundo o texto, os registros que afrontam determinações previstas na Constituição Federal poderão ser cancelados sem a necessidade de processo judicial. Os títulos cancelados correspondem a uma área de 91,12 milhões de hectares.
Além do registro ilegal, na prática, com o registro de imóveis em mãos, os grileiros usavam os documentos como garantias para hipoteca.
Os municípios de São Félix do Xingu e Altamira têm, pelo menos, 50% dos títulos cancelados com mais de 45 milhões de hectares. Além disso, são os recordistas históricos em áreas desmatadas.
A partir do cruzamento dos dados de georreferenciamento das áreas com dados de mudança no uso e cobertura da terra, descobriu-se que 811 mil hectares já haviam sido desmatados até 2020, o que corresponde a 34% desses imóveis. O uso irregular é, principalmente, para agropecuária.
Em nota, o Instituto de terras do Pará argumentou que 75% do território do estado está sob gestão federal, com “as medidas de arrecadação, matrículas e retomadas de terras públicas competem exclusivamente aos órgãos públicos federais”.
O instituto disse também que “constatou-se que as áreas indicadas nas matrículas não poderiam ser localizadas por não terem informações geoespaciais, prejudicando qualquer tentativa do Poder Público em utilizar esse material para as suas ações de arrecadação de terras ou retomadas”.