Brasil tem maior taxa de emissão de gases do efeito estufa dos últimos 19 anos
Relatório do Observatório do Clima é lançado a cinco dias da COP27; em 2021, o desmatamento da Amazônia respondeu por 77% das emissões por mudanças de uso da terra
As emissões de gases do efeito estufa no Brasil atingiram maior alta dos últimos 19 anos. As informações foram divulgadas nesta terça-feira (1), pelo Observatório do Clima, uma rede que reúne 77 organizações da sociedade civil dedicada a discutir mudanças climáticas no Brasil. Os dados fazem parte da 10ª edição do Sistema de Estimativas de Emissões de Gases do Efeito Estufa (SEEG), e foram publicados a cinco dias da COP27, a Conferência Mundial do Clima, que irá ocorrer em Sharm el-Sheikh, no Egito.
De acordo com o SEEG, o Brasil emitiu 2,42 bilhões de toneladas brutas de CO2e (uma unidade que engloba todos os gases do efeito estufa) em 2021. O dado representa um aumento de pouco mais de 12% em relação a quantia registrada em 2020. Dezenove anos atrás, em 2003, o brasil bateu 3,02 bilhões de toneladas brutas de gás carbônico.
O SEEG divide as emissões totais entre cinco setores: resíduos, processos industriais, energia, agropecuária e mudanças de uso das terras e florestas (MUT). O último setor, que engloba desmatamento, calagem (tratamento de solo para usos agrícola), carbono orgânico no solo e a queima de resíduos florestais, aumentou 18,5%, em relação ao ano anterior e representa 49% de todas as emissões do país. Em 2021, o desmatamento da Amazônia respondeu por 77% das emissões por MUT.
Tanto em 2003 quanto em 2021, o desmatamento foi o principal responsável pela elevação das emissões. Dados do sistema Prodes, produzidos pelo INPE (Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais), mostram que em 2003, o desmatamento na Amazônia chegou a 25,4 mil Km², terceiro pior resultado desde 1988. Já em 2021, taxa foi de 13 mil Km². Apesar de o número absoluto ser menor, as taxas de desmatamento vêm aumentando nos últimos quatro anos.
Aumentos na emissão de gases em outros setores
Ainda que o setor de mudança do uso da terra tenha sido o que mais impactou a alta na emissão de gases do efeito estufa no Brasil, quase todas as outras áreas avaliadas no SEEG também apresentaram altas, como agropecuária (+3,8%), processos industriais e uso de produtos (+8,2%) e energia (12,2%). O setor de resíduos, foi o único que se manteve estável entre 2021 e 2022, principalmente por causa do metano recuperado em aterros sanitários.
No caso da energia, a alta se deve a diferentes fatores, como a retomada da economia após o período mais grave da pandemia da Covid-19, quando o consumo era menor. Além disso, houve a crise hídrica de 2021, que secou hidrelétricas e forçou o acionamento de termelétricas, o que reduz a parte das energias renováveis utilizadas no Brasil. A seca também fez com que houvesse uma queda na safra da cana no Sudeste, o que aumentou o preço do etanol e reduziu a participação dos biocombustíveis na matriz energética.
Uma das apostas para o Brasil é na produção de hidrogênio verde por meio do uso de energia renovável, por exemplo, a partir da produção de energia eólica. De acordo com o coordenador do SEEG, Tasso Azevedo, o uso de energias alternativas deve andar em conjunto com a redução do uso de combustíveis fósseis. “A gente não reduz a emissão se a gente não reduzir a quantidade absoluta que a gente tem de uso de combustíveis fósseis”, afirmou.
No caso da agropecuária, segundo setor que mais emitiu de gases do efeito estufa, o maior vilão é o arroto do gado. De acordo com um levantamento do IBGE (Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística), em 2021, o Brasil chegou a ter 224,6 milhões de cabeças de bois, o maior número da série histórica. O estado do Mato Grosso, um dos principais motores do agronegócio brasileiro, apresentou a quantidade mais alta de emissões na área da agropecuária.
Para a coordenadora de clima da ONG Imaflora (Instituto de Manejo e Certificação Florestal e Agrícola), Renata Potenza, o sequestro de carbono, prática na qual o CO₂ da atmosfera é transformado em Oxigênio por meio do tratamento de pasto degradado e lavouras com sistema de plantio convencional, pode contribuir para a redução das emissões de gases do efeito-estufa. ““A gente vê a importância de olhar para esse pasto, fazer um bom manejo, contribui com 257 milhões de toneladas de remoção desse Carbono”, explica.
Metas do Acordo de Paris
O aumento na emissão de gases do efeito-estufa distancia o Brasil de metas traçadas no Acordo de Paris, em 2015. O compromisso mundial prevê reduzir as emissões para chegar a um aumento na temperatura de no máximo a 2°C em 100 anos, com meta ideal de 1,5°C, quando comparado com níveis pré-industriais.
O Brasil também se comprometeu a ser carbono neutro até 2050 e cortar ao menos 50% das emissões até 2030. A meta anterior era de chegar a 2030 com uma redução de 43% nas emissões. Apesar de o objetivo atual parecer mais ambicioso, a nova meta foi traçada com uma alteração na base de comparação, de maneira que o Brasil teria mais margem para emitir gases do que o objetivo anterior. O mecanismo é chamado por ambientalistas de “pedalada climática”.
O coordenador do SEEG avalia que mesmo com uma meta essencialmente menos ambiciosa, o Brasil está se distanciando do objetivo. Ainda assim, Azevedo entende que é possível alcançar o objetivo, contanto que o foco esteja na redução da área desmatada. “Se o desmatamento [no Brasil] cair 50%, a gente se aproximaria da meta que a gente tem para 2030”