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    Basília Rodrigues: Ninguém solta o cacho de ninguém

    Neste 25 de julho, dia da mulher negra e caribenha, comemore cada anel do seu cabelo cacheado e todas as vitórias de nós, mulheres negras que, por anos, tivemos como única versão validada de um belo cabelo, o liso

    Basília Rodriguesda CNN , em Brasília

    “Boa tarde! Vejo todos os dias os jornais da CNN, e sempre vc. está falando. O que enfeia na tela, é o seu cabelo, horrível, parece vassoura de varrer forno de lenha, é uma tocha”.

    O parágrafo acima traz alguns erros, inclusive de pontuação, porque é trecho inalterado de uma carta registrada e assinada que recebi, em maio deste ano.

    O texto foi escrito à mão com caneta, por um remetente que colocou nome, sobrenome e ainda disse assinar pela sua família também. Alguém inconformado com uma das características que mais evidencia quem eu sou, como sou e com o que me identifico: meu cabelo cacheado.

    Não é possível, a olho nu, comprovar que o nome e o endereço na carta sejam verídicos. Este é um trabalho para polícia. Mas, além do cometimento de um crime, o mau gosto, ao não reconhecer a beleza do cabelo afro, é inegável.

    Neste 25 de julho, dia da mulher negra e caribenha, comemoro cada anel do meu cabelo e todas as vitórias de nós, mulheres negras que, por anos, tivemos como única versão validada de um belo cabelo: o liso. Isso sem contar todas aquelas maquiagens de tom controverso com a cor da nossa pele, mas hoje vou falar de cabelo.

    Assim como todas as mulheres, também as negras podem escolher se liso, cacheado, loiro, preto, azul, verde, castanho, longo ou curto. O livre arbítrio sobre a própria imagem deveria ser entendido como um direito universal, natural e apolítico.

    Algumas palavras estão sublinhadas na carta: “cabelo horrível”. Outro trecho, em que a palavra “não” é destacada, diz: “esse negócio de cabelo enroladinho não usa”. A vontade é mesmo de ferir a imagem e autoestima de uma mulher negra, o que não é propriamente uma novidade. Isso precisa parar.

    O que o cabelo de uma mulher negra diz sobre ela carrega mais valor do que a opinião de quem o acha feio. “Será que vc. não olha no espelho? Por favor: estique esse seu cabelo, alise porque assim, vc. fica mais simpática”, afirma outro vexaminoso trecho do texto.

    Quando recebi essa carta, eu mal acreditei no que estava lendo. Foi em um dia de fim de expediente em que me avisaram que havia chegado uma carta para mim. Infelizmente, desse emaranhado racista, sempre vem mais.

    Características combinadas de traços negroides, peles um pouco ou muito escuras, cabelos “aneladinhos”, quase sempre, não deixam dúvidas: é uma mulher negra.

    E trajetórias de mulheres negras bem sucedidas impactam de maneira inestimável a vida de outras. Periodicamente, recebo mais mensagens positivas do que negativas sobre este aspecto da minha imagem. Isso quando as pessoas não falam pessoalmente, o que me enche de gratidão.

    Há mulheres negras felizes com seus cachos que assistem CNN também; há, em especial, mães e pais de meninas cacheadas que dizem que suas filhas se sentiram encorajadas, depois de ver a TV, a colocarem o cabelo pra jogo.

    Não tem carta, post na internet ou meme que tenha mais relevância do que isso. Aceite, o seu racismo não vale um cachinho da identidade de alguém.

     

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