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    Vontade de não voltar ‘ao normal’ vai além do trabalho no escritório

    Pesquisa nos EUA mostra que 50% dos funcionários não querem retornar ao trabalho presencial; isolamento criou aversão a passatempos sociais antes agradáveis

    Allison Hope, da CNN, em São Paulo

    Algumas pessoas estão ansiosas para retomarem interação; outras, mudaram hábitos
    Enquanto algumas pessoas estão ansiosas para retomarem interação social após a pandemia, outras mudaram definitivamente seu padrão de comportamento
    Foto: Freepik/rawpixel.com

    Quando os restaurantes reabriram em minha cidade, vi três mulheres de 20 e poucos anos falando alto enquanto conversavam sobre vinhos em um estabelecimento local. Estive lá, brevemente, com minha máscara N95 para buscar minha comida. 

    Naquele momento, ocorreu-me que, por mais que eu sentisse falta de jantar em restaurantes, não sentia falta disso. Eu não queria estar à mesa ao lado de pessoas barulhentas, mesmo quando seus aerossóis não contivessem mais um contágio mortal.

    Para ser clara, quero que a pandemia de Covid-19 acabe, mas há muitas coisas que não quero que voltem mais. Colegas de trabalho espirrando em espaços abertos, por exemplo. Shoppings lotados em fins de semana. Almoços obrigatórios de aniversário ou coquetéis de qualquer tipo em que temos que nos misturar e bater papo com estranhos. 

    Um dos pontos positivos do distanciamento social forçado tem sido a chance de repensar e manter perto aqueles que consideramos queridos e, alegremente, deixar de ter que dar desculpas a todos os outros. 

    “Eu nunca quero voltar ao que o normal costumava significar”, disse Tori Neville, uma profissional de comunicação que trabalha de casa, em Hudson Valley, Nova York, desde o início da pandemia no ano passado.

    “Eu adoro trabalhar em casa e não ter que fazer coisas só para mostrar a cara. Minha vida é mais calma, minha ansiedade diminuiu. Estou mais ligada à minha família e a mim mesma. Meu foco está mais claro do que nunca.”

    Quem vai voltar para espaços lotados? 

    Mais de 50% dos funcionários não querem retornar à vida no escritório, de acordo com um estudo recente do Pew Research Center. Mas, embora seja bom não ficar preso no trânsito na hora do rush e não ter que enfrentar as salas de conferências geladas, muitos também criaram uma aversão a passatempos sociais anteriormente agradáveis e agora não se imaginam fazendo essas coisas mais. 

    Ady Humm, ativista LGBTQ+ e criador de conteúdo que escreveu críticas de teatro por mais de 30 anos, não pretende frequentar espaços lotados como antes. “Se voltarmos, mesmo que a pandemia tenha acabado completamente, espero que o uso de máscaras nos cinemas e teatros se torne regra”, afirma. 

    Alguns de nós, que antes se consideravam borboletas sociais, tornaram-se flores de parede durante um ano em casa? Será que estamos, talvez, mais criteriosos sobre como podemos planejar passeios após um ano repensando como os encontros sociais podem nos prejudicar?

    Sabemos mais do que nunca que nosso tempo neste planeta é limitado, e simplesmente não vale a pena nos encontrarmos com aquele velho amigo de faculdade que nunca gostamos tanto assim. Ou nossa relação recompensa / risco não valoriza mais uma refeição com clientes barulhentos na mesa ao lado.

    Algumas pessoas estão mais ansiosas 

    Alguns de nós estão mais ansiosos socialmente do que antes. Afinal, muitos passaram mais de um ano treinando para desfazer os impulsos sociais que construímos ao longo da vida: abraçar aquele amigo, ajudar aquele idoso a atravessar a rua, conversar com aquele colega após a reunião.

    Um ano evitando interações sociais, porém, com máscaras que tornam esses encontros que temos mais embaraçosos, transformou alguns de nós em idiotas desajeitados que se sentem mais confortáveis plantando tomates em jardins pandêmicos do que conversando sobre o clima com um conhecido em um jantar de aposentadoria de um colega de trabalho.

    Pesquisa indica que mais de 50% dos funcionários não querem voltar a escritórios
    Pesquisa recente nos EUA indica que mais de 50% dos funcionários não querem retornar à vida no escritório
    Foto: Freepik/marymarkevich

    Talvez sempre tenhamos sentido essa aversão às obrigações sociais e queiramos nos apegar a uma vida de eremita pós-pandemia.

    “Como nosso calendário social foi limitado no ano passado, preenchê-lo pode ser estimulante para alguns, mas causar ansiedade para outros”, disse Judith Zackson, diretora clínica do Grupo de Psicologia Zackson em Greenwich, Connecticut.

    Algumas pessoas vão correr para sair de casa

    Os mais jovens se sentirão mais desesperados para se reconectar socialmente, de acordo com Zackson, e correrão para retornar à pompa e circunstância das rotinas diárias e compromissos sociais, algo que ela chama de “reverso do confinamento”.

    Pessoas mais velhas, no entanto, podem demorar mais para voltar ao antigo normal, a fim de minimizar o risco. O padrão pode ser o mesmo para introvertidos e extrovertidos, respectivamente, com alguns inclinando-se em seu nível de conforto para permanecer em casa e outros correndo com os braços abertos de volta para a multidão.

    A pandemia também pode ter revelado partes previamente desconhecidas de nós mesmos, o introvertido se tornado a borboleta social expansiva e vice-versa.

    “Alguns de meus pacientes que lutavam contra a ansiedade social começaram a flexionar seus músculos da comunicação durante a pandemia”, disse Zackson. “Estar em seu próprio espaço aumentou a confiança, a abertura e o pensamento reflexivo com pessoas diferentes, com pontos de vista diferentes.”

    “Essa experiência deu a eles uma nova perspectiva, desafiou suas crenças negativas e facilitou o retorno às atividades pessoais normais enquanto continuavam as interações online”, disse ela.

    Isolamento também pode levar à disfunção social

    O isolamento social, no entanto, também pode levar à disfunção social, conforme evidenciado por vários estudos, incluindo um de 2019 publicado no The New England Journal of Medicine

    Os pesquisadores estudaram os efeitos dos expedicionários em isolamento social extremo na Antártica e afirmaram que “a exposição à monotonia ambiental e ao isolamento social têm efeitos danosos ao cérebro”.

    Pode-se argumentar, no entanto, que uma nova orientação é necessária e que um ano de distanciamento social induzido por uma pandemia não é totalmente negativo.

    Se você fosse uma pessoa norturna antes da Covid-19, sempre presente nos bares lotados, e agora sua busca por prazer vem na forma de ler um bom livro sozinho, enrolado no sofá com uma xícara de chá quente ou um copo de chardonnay, não é de todo ruim.

    Sair da pandemia com mais discernimento sobre como gastar seu precioso tempo e com quem é uma decisão somente sua. E se flor de parede ou eremita não são apelidos que você está pronto para usar a longo prazo, apenas esteja preparado para colocar seu chapéu de paciência na próxima vez que seu colega alugar seu ouvido para falar do jogo da noite passada enquanto pegam uma água no bebedouro.

    Allison Hope é uma escritora nova-iorquina nativa que prefere o humor à tristeza, as viagens do que a televisão e tomar café em vez de dormir. 

    (Texto traduzido; leia o original em inglês)