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    UE lidera em vacinação contra Covid-19, mas distribuição entre países é desigual

    Alguns países atingiram uma vacinação quase universal, mas Romênia e Bulgária vacinaram completamente apenas 33% e 22% de sua população adulta

    Vacinação contra a Covid-19 em Sófia, na Bulgária
    Vacinação contra a Covid-19 em Sófia, na Bulgária Nikolay Doychinov/AFP via Getty Images

    Ivana Kottasováda CNN

    (CNN) – Com quase três quartos de todos os adultos totalmente vacinados contra a Covid-19, a União Europeia é hoje líder mundial em vacinação. Porém, esse número impressionante oculta uma realidade incômoda: a distribuição de vacinas extremamente desigual.

    Alguns países, incluindo Irlanda, Malta, Portugal e Dinamarca, atingiram uma vacinação quase universal, ostentando taxas de cobertura de cerca de 90%, de acordo com o Centro Europeu de Controle de Doenças (ECDC). Do outro lado do bloco, Romênia e Bulgária vacinaram completamente apenas 33% e 22% de sua população adulta, respectivamente.

    O problema não se resume à escassez de vacinas. Todos os países da UE têm acesso às vacinas aprovadas pela UE: Pfizer/BioNTech, Moderna, AstraZeneca e Johnson & Johnson. As nações também têm liberdade para adquirir outras vacinas individualmente. A Hungria, por exemplo, comprou a vacina russa Sputnik para sua população.

    “Eles têm as vacinas. Qualquer um que quiser, pode se vacinar”, disse à CNN Ivan Krastev, cientista político búlgaro e membro fundador do Conselho Europeu de Relações Exteriores.

    Mas em vez disso, disse Krastev, a Bulgária luta contra uma hesitação profunda em relação à vacinação, alimentada pela instabilidade política, teorias de conspiração e falta de crença nas autoridades.

    “Existe um alto nível de desconfiança, e isso vale tanto para a Bulgária quanto para a Romênia”, comentou. “Mesmo a comunidade médica, doutores, enfermeiras, muitos estão hesitantes em se vacinar, então não surpreende que a sociedade como um todo também esteja”, acrescentou.

    Tanto a Romênia quanto a Bulgária têm lutado contra picos de novos casos do novo coronavírus desde o início de setembro. A Romênia registrou mais de 45 mil novos casos e mais de 800 mortes na semana até domingo, quase o mesmo nível do pico da segunda onda da epidemia no país, em abril.

    O ECDC alertou na quinta-feira (30) que os países com baixas taxas de vacinação correm o risco de ter um aumento nos números de hospitalizações e mortes no período do outono no hemisfério norte se relaxarem as medidas de distanciamento social.

    “Considerando esse cenário, devido à alta circulação do vírus, as populações vulneráveis totalmente vacinadas também correm o risco de se infectar e ter desfechos graves”, afirmou o ECDC em seu último relatório de avaliação de risco sobre a Covid-19, pedindo que os países com dificuldades de vacinação tentem entender por que sua população permanece hesitante e, em seguida, aborde essas questões.

    Em novembro, a Bulgária irá realizar sua terceira eleição parlamentar neste ano. As duas eleições anteriores, em abril e julho, terminaram em um impasse, sem nenhum governo formado. Como resultado, o país está preso em uma campanha eleitoral perpétua, com pouco espaço para qualquer outra coisa.

    “Tem havido muito mais campanha eleitoral do que campanha pela vacinação”, disse Krastev. “Nem o governo que estava no poder nem o governo provisório priorizaram as vacinas”.

    Krastev disse que a questão das vacinas não dividiu a sociedade búlgara em termos partidários, porque a maioria das pessoas estava, em geral, unida na desconfiança em relação à classe política. “Os Estados Unidos têm um grande nível de polarização; aqui não se trata tanto de polarização política, mas de confusão e repulsa a qualquer coisa política, o que acaba prejudicando muito o sucesso da campanha [de vacinação]”, disse o cientista político à CNN.

    No ano passado, alegações de corrupção no governo levaram a protestos generalizados em toda a Bulgária. A polícia reagiu com uma violência que chocou a nação, o que fez com que as pessoas confiassem ainda menos nas autoridades.

    A imprensa também teve seu papel, comentou Krastev. “Para tornar o debate mais interessante, os veículos apresentaram as opiniões a favor e contra as vacinas de forma igualmente relevante, o que gerou confusão para as pessoas”, afirmou.

    O governo romeno atribuiu a má distribuição de vacinas a notícias falsas e teorias da conspiração disseminadas online.

    Além disso, existe grande desigualdade nos dois países. As comunidades ciganas na Romênia e na Bulgária estão entre as menos vacinadas. Dimitar Dimitrov, diretor do Programa Cigano do Instituto Open Society na cidade de Sofia, disse que o problema está nas relações tensas entre as comunidades e a sociedade em geral.

    “Muitos bairros ciganos na Bulgária foram colocados em lockdown sem uma explicação razoável, embora o nível de infecções em outras partes dos mesmos municípios tenha sido mais elevado. Assim, essa atitude das instituições em relação ao povo cigano e seus bairros mostra por que essa população não confia nas instituições”, disse Dimitrov à CNN.

    Dimitrov disse que muitas pessoas, em especial nas áreas rurais, também podem ter dificuldade de acesso aos centros de vacinação. “Se você tem que pegar um ônibus ou trem e viajar 100 quilômetros para chegar ao hospital e depois esperar na fila, isso exige tempo e dinheiro. A vacinação em si é gratuita, mas chegar ao posto de vacinação custa caro”, afirmou Dimitrov.

    Recentemente, o governo romeno anunciou que aplicaria recursos extras para garantir que as pessoas que não têm acesso às clínicas possam tomar a vacina, como, por exemplo, solicitando que médicos façam consultas residenciais.

     

    A divisão Leste-Oeste

    A Bulgária e a Romênia não são as únicas a enfrentar problemas de hesitação em relação às vacinas. A União Europeia parece estar dividida em duas partes. Metade abraçou a vacinação e imunizou quase todas as pessoas. A outra está lutando para convencer um grande número de pessoas em meio a uma profunda desconfiança sobre a imunização.

    A linha divisória fica aproximadamente ao longo da fronteira da Cortina de Ferro, que antes dividia a Europa em Oriental e Ocidental.

    Dos 27 estados-membros do bloco, os 15 países com melhor desempenho em termos de taxas de vacinação fazem parte do que costumava ser o bloco ocidental, enquanto os dez últimos são todos ex-países comunistas. A Grécia e a Lituânia são os únicos dois países que contrariam essa tendência, com a Lituânia em 16º e a Grécia em 17º.

    Todos os antigos países ocidentais, com exceção da Grécia, vacinaram totalmente pelo menos 70% de sua população adulta. Nenhum dos países do leste europeu chegou a esse limiar.

    Krastev disse que a forma como a pandemia se desenrolou em diferentes países pode ser um fator que explica as diferenças. “Os países mais atingidos pela primeira onda, em 2020, quando o impacto foi maior, países como a Itália ou a Espanha, por exemplo, têm mais sucesso com a vacinação em geral do que países atingidos pela segunda onda”, contou Krastev, acrescentando que o governo búlgaro nunca conseguiu convencer as pessoas de que uma alta taxa de vacinação era prioridade.

    “Em vez disso, tornou-se uma questão de orgulho nacional nunca termos feito um lockdown”, relatou.

    Anna Nicińska, professora assistente da Faculdade de Ciências Econômicas da Universidade de Varsóvia, estudou as razões para a hesitação em relação às vacinas e disse que a história também desempenha um papel importante em influenciar as decisões das pessoas.

    Nicińska e seus colegas analisaram dados sobre a confiança nos sistemas de saúde e nas autoridades médicas de 100 países e descobriram que a descrença era muito maior em nações que haviam passado pelo comunismo soviético. Pessoas que vivenciaram, em primeira mão, as mentiras de seus governos tinham dificuldade para confiar nas autoridades, mesmo anos após a revolução, explicou a professora. Quanto mais tempo as pessoas viveram sob o comunismo, maior a desconfiança.

    “Pessoas expostas ao comunismo soviético confiam menos nas outras pessoas, no governo e também nos sistemas de saúde; a experiência gerou desconfiança no domínio público e em qualquer coisa formal”, acrescentou.

    Nicińska disse que essa é uma das razões pelas quais a exigência da vacinação pode não levar a uma aceitação significativamente maior em tais países.

    “A decisão de se vacinar se baseia em confiança, e torná-la uma exigência seria contraproducente. É preciso lembrar que, em muitos países, existe uma longa tradição de resistência ao Estado, então as pessoas encontraram uma maneira de evitar a vacinação obrigatória”.

    A Comissão Europeia reconhece que as baixas taxas de vacinação em alguns de seus estados-membros é um problema.

    “Enquanto o vírus não for derrotado em todos os estados-membros, ele simplesmente não será derrotado”, afirmou em um comunicado um porta-voz da Comissão à CNN. A entidade relatou ainda que os países lutando para aumentar os níveis de vacinação devem se concentrar em campanhas voltadas especificamente para as pessoas hesitantes e enfatizar a importância da ciência.

    (Texto traduzido. Clique aqui para ler o original em inglês).