Trump encoraja governadores a usarem táticas agressivas contra manifestantes
Áudio obtido pela CNN mostra o presidente dos EUA classificando ação local como "fraca"
O presidente dos Estados Unidos, Donald Trump, agitado após três noites de protestos em várias cidades americanas, incluindo a capital, disse aos governadores em uma teleconferência nesta segunda-feira (1º) para responderem manifestantes violentos com agressividade.
“Vocês tem que dominá-los ou vão parecer um bando de idiotas, vocês têm que prender e julgar as pessoas”, disse o presidente, em uma ligação feita do porão da sala de emergência da Casa Branca, de acordo com uma gravação de áudio obtida pela CNN.
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No diálogo, Trump pareceu irritado e criticou o que caracterizou como um gerenciamento fraco em alguns lugares, que ele responsabilizou pela escalada na violência. Trump enfatizou sua crença que a agressividade está sendo fomentada por forças da “esquerda radical“.
Protestos irromperam nos Estados Unidos desde a última segunda-feira (25), quando George Floyd, um homem negro, foi morto em uma abordagem por um policial branco.
Ele, então, sugeriu aos governadores que era responsabilidade deles —não da Presidência — fechar o cerco ao cenário instável.
“É um movimento, se você não o dissipar, vai ficar pior e pior”, disse Trump. “Ele só é bem-sucedido quando vocês são fracos, e a maioria de vocês é fraco”.
Nessa bronca aos gestores estaduais por não fazerem mais para arrefecer a violência, que irrompeu novamente na noite deste domingo (31), Trump volta a seu mantra de “lei e ordem”, que ele acredita ser a melhor maneira de confrontar a agitação racial em toda a nação.
Em uma conversa com o governador do estado de Minnesota, o democrata Tim Walz, Trump disse que o estado era uma “piada em todo o mundo” por não responder com mais severidade durante a primeira noite de protestos.
“Foi tão ruim em algumas noites que a população não se importaria com uma ocupação militar”, disse Trump. “Eu queria que tivesse uma ocupação militar aí”.
Na ligação, o governador de Illinois, J.B. Pritzker, disse ao presidente que a nação precisava de uma mão firme no alto do poder.
“A retórica da Casa Branca está piorando as coisas, as pessoas estão vivendo dores reais”, disse o democrata Pritzker. “Precisamos de uma liderança nacional pedindo calma e demonstrando preocupação real com os manifestantes”.
“Eu não gosto muito da sua retórica também”, rebateu Trump. “Você poderia ter lidado muito melhor com o coronavírus”.
A mensagem para os governadores veio em um momento em que o presidente e seus conselheiros continuam a debater a possibilidade de um pronunciamento nacional sobre os protestos —um deles fora da Casa Branca, que forçou Trump e sua família a se recolherem em um abrigo subterrâneo na noite de sexta-feira (29).
‘Sessões de escuta’
Junto com a ligação a governadores, que também incluiu agentes da polícia e de segurança nacional, conselheiros estavam contatando líderes do movimento negro para testar o interesse e disponibilidade para uma “sessão de escuta” mais tarde nesta semana, o que a equipe de Trump julga necessário antes que o presidente faça um pronunciamento nacional.
Durante seu mandato, Trump contratou poucos conselheiros sênior negros. Seu gabinete é branco, em sua maioria, com o secretário de Moradia e Desenvolvimento Urbano, Ben Carson, como o único membro negro.
Trump tem buscado conexões com eleitores afro-americanos nos últimos meses, sugerindo —como fez nas eleições de 2016 — que eles não têm nada a perder ao apoiar sua candidatura. No entanto, o presidente não focou nas questões da violência policial e do racismo institucional durante seus três anos e meio de mandato.
Apesar de ter apoiado uma reforma da justiça criminal, encabeçada pelo seu genro Jared Kushner, ele também manteve o mantra de “lei e ordem”, que acredita ter lhe dado vantagem para a Casa Branca, e trabalhou para reverter iniciativas da era Obama para desmilitarizar polícias locais.
Se havia qualquer dúvida de que lado Trump estava depois de três noites de protestos —incluindo um fora dos portões da altamente protegida Casa Branca — a ligação aos governadores cimentou a impressão de que ele está focado em passar uma mensagem de lei e ordem, e não necessariamente a de combate ao racismo e brutalidade policial, que deram origem às manifestações.
“Você tem que dominar”, disse. “Se não dominar, está perdendo seu tempo”.
Trump fora de vista
O presidente não foi visto em público desde sábado, quando viajou para a Flórida, e sua agenda não incluía nenhuma aparição nesta segunda. Sua equipe ainda avalia como e se Trump deve aparecer para responder uma das mais sérias agitações da década.
Alguns dos aliados do presidente têm ficado frustrados com o que sentem que é um silêncio da presidência em relação às crescentes tensões raciais.
Muitos, de doadores de campanha a republicanos do Capitólio, já reclamaram em privado que o presidente já deixou muitos dias se passarem sem uma declaração ou apelo formal por união.
O que Trump tem feito publicamente —publicar extensivamente no Twitter sobre suas rusgas com líderes democratas locais e estaduais e mencionar as manifestações no meio de um outro compromisso —no melhor dos cenários não foi levado em conta, e no pior, ajudou a inflamar o ultraje para uma segunda semana.
Alguns apoiadores externos contataram a Casa Branca para pressionar por uma aparição presidencial, em que confrontaria a crise que tem assistido desenrolar por trás de portas fechadas ou em um abrigo subterrâneo. Um grande doador de campanha se preocupa que a ausência de Trump durante esse fim de semana histórico de dor e violência pode arriscar sua reeleição.
Essa pessoa também notou um sentimento crescente entre parlamentares republicanos, até mesmo aliados, de que tweets em caixa alta não estão ajudando a situação.
O senador republicano Tim Scott, da Carolina do Sul, disse ao canal Fox News que falou com Trump no fim de semana sobre seus tweets exaltados, que descreveu como “não construtivos”.
Porém, o desabafo do presidente nesta manhã aos governadores ilustrou o risco de colocar o presidente para confrontar os protestos quando ele está irritado.