Sem opções, refugiados ucranianos são levados para Rússia
Pessoas abrigadas em Mariupol relatam terem sido deportadas para Rússia contra a vontade, por meio de “centros de filtragem” em Donetsk
Quando as forças russas e os soldados separatistas aliados chegaram oferecendo um caminho para a segurança, isso parecia uma reviravolta doentia do destino.
Era meados de março e os moradores de Mariupol, na Ucrânia, haviam passado semanas em porões gelados e úmidos, escondendo-se do implacável bombardeio russo e temendo por suas vidas. Agora, eles estavam sendo informados de que, para sobreviver, havia apenas uma saída: ir para a Rússia.
Se não saíssem, morreriam nos escombros, alertaram os soldados russos. Eles disseram que tinham pouca escolha.
O cerco do presidente russo, Vladimir Putin, a Mariupol veio para resumir sua guerra de terra arrasada na Ucrânia. O ataque por terra, ar e mar derrubou a cidade portuária do sul, destruindo ou danificando 90% da infraestrutura, segundo o prefeito. Um teatro e uma escola de arte que abrigavam centenas de mulheres e crianças foram destruídos. Uma maternidade foi bombardeada.
Mais de 100 mil pessoas permanecem presas em Mariupol, vivendo em condições terríveis e em rápida deterioração, sem água, comida, aquecimento ou eletricidade. Como a comunicação com a cidade foi em grande parte cortada, é quase impossível para os moradores saberem quando pode ser seguro sair de abrigos antiaéreos ou como pegar os ônibus de evacuação da cidade. Muitas tentativas de criar corredores de evacuação fracassaram devido aos ataques contínuos.
Em vez de permitir a saída segura da cidade, tropas russas e separatistas estão levando dezenas de milhares de civis para os chamados “centros de filtragem” na autoproclamada República Popular de Donetsk (RPD), no leste da Ucrânia, que Moscou reconhece como independente, antes de transferí-los para a Rússia, de acordo com o governo da Ucrânia, agências humanitárias e autoridades dos Estados Unidos. A vice-primeira-ministra da Ucrânia, Iryna Vereschuk, estimou que cerca de 45 mil cidadãos ucranianos foram deportados à força desde o início da guerra.
O Conselho Municipal de Mariupol disse em nota que o fracasso da Rússia em chegar a um acordo sobre corredores de evacuação e a criação de centros de filtragem fazem parte de um esforço mais amplo para encobrir possíveis crimes de guerra cometidos na cidade. “Os ocupantes tentam identificar todas as testemunhas potenciais das atrocidades deles através de campos de filtragem e destruí-las”, disse o Conselho. A CNN não pôde verificar essa afirmação.
A prática despertou memórias dolorosas da deportação forçada de milhões de suas terras natais feita pelo líder soviético Joseph Stalin, incluindo mais de 230 mil tártaros da Crimeia, para partes remotas da União Soviética durante a Segunda Guerra Mundial. As forças russas também usaram “campos de filtragem” durante a guerra na Chechênia, na década de 1990, onde grupos de direitos humanos documentaram extensos abusos, incluindo tortura, tomada de reféns e execuções extrajudiciais.
“Eu não preciso explicar o que esses chamados ‘campos de filtragem’ são uma reminiscência. É assustador e não podemos desviar o olhar”, disse a embaixadora dos EUA nas Nações Unidas, Linda Thomas-Greenfield. Ela citou relatórios confiáveis, inclusive do Conselho Municipal de Mariupol, dizendo sobre agentes do Serviço Federal de Segurança da Rússia (FSB) confiscando passaportes e identidades, levando telefones celulares e separando famílias ucranianas umas das outras.
Poucas famílias em Mariupol saíram ilesas do reinado de terror da Rússia. Em uma recente entrevista coletiva, o prefeito de Mariupol disse que alguns de seus vizinhos e colegas municipais foram levados para a Rússia contra sua vontade. “Um homem com uma arma chega à noite e diz que é uma evacuação. As pessoas que estão no abrigo há cerca de 20 dias saem, são colocadas em carros e enviadas para algum lugar. De manhã, elas veem que não é a Ucrânia”, disse Vadym Boychenko. “Então eles foram colocados em trens e já estavam indo para o interior da Federação Russa”.
Moscou denunciou as alegações como mentiras, afirmando que a Ucrânia impediu seus esforços para “evacuar” as pessoas para a Rússia. O coronel-general russo Mikhail Mizintsev disse que mais de 550 mil pessoas foram evacuadas de “regiões perigosas da Ucrânia” para a Rússia desde o início da guerra, incluindo mais de 121 mil pessoas de Mariupol, segundo a agência de notícias estatal russa TASS.
Mas uma investigação da CNN sobre deportações revela uma realidade muito diferente, na qual as pessoas tinham apenas duas opções: ir para a Rússia ou morrer. Em entrevistas com 10 pessoas, incluindo moradores locais de Mariupol e seus entes queridos, muitos descrevem soldados russos e da RPD descendo em abrigos antiaéreos e ordenando que os que estão dentro saiam imediatamente. Nenhum deles sabia para onde estavam sendo levados.
Alguns disseram que, após semanas de incerteza, não se importavam com o destino – que qualquer lugar seria mais seguro do que Mariupol, na opinião deles. Cinco acabaram sendo enviados para a Rússia; três já conseguiram escapar.
Eles pediram para serem identificados apenas pelo primeiro nome ou por pseudônimos para sua proteção. Todos compartilharam evidências de sua jornada com a CNN, incluindo cópias dos cartões de migração russos que preencheram e tiveram carimbados na fronteira. Aqueles que ainda estão na Rússia, tentando encontrar um caminho de volta para casa, estão preocupados com sua segurança.
Essas são algumas das histórias.
Andrey, 45
Após semanas de bombardeios pesados, o porão onde Andrey estava se abrigando com seus vizinhos começou a desmoronar. Eles tinham que sair, ele pensou, antes que o teto desabasse.
Andrey, um treinador esportivo de 45 anos, tentou repetidamente escapar pela margem esquerda do rio Kalmius, em Mariupol, e se juntar aos comboios de evacuação que saem da cidade pelo outro lado. Mas ele não conseguiu – de carro ou a pé – percorrer ruas repletas de cadáveres e destroços para atravessar a ponte central. A CNN analisou imagens de satélite das quatro pontes do Kalmius; todas estavam intransitáveis ou destruídas em 22 de março.
Nos raros momentos em que Andrey tinha rede disponível no celular, ele ligava e mandava mensagens para sua esposa Iryna, uma professora de inglês de 50 anos que mora em um subúrbio de Kiev. Ele estava desesperado para encontrar uma passagem segura de Mariupol, para que o casal que está há junto há 15 anos pudesse se reunir novamente. E, no entanto, parecia não haver saída.
Parecia que não havia opções. Por causa disso, já sabíamos que iríamos parar na RPD ou na Federação Russa. Havia a sensação de que a margem esquerda havia sido simplesmente abandonada.
Andrey
Iryna compartilhou as mensagens no WhatsApp e Telegram com a CNN, revelando suas tentativas angustiantes de ajudar o marido. Cada mensagem de texto foi marcada com a data e hora, para que eles pudessem ter certeza de quando foram enviadas. Em resposta, Andrey, frustrado, disse a ela que não conseguiu localizar os comboios de evacuação que ela mencionou, mas continuaria tentando.
Em um último esforço, Iryna procurou sua mãe na Rússia, com quem havia parado de falar por causa de divergências sobre a guerra. Se Andrey não tivesse outra saída de Mariupol, ela perguntou se ele poderia ficar com ela. Sua mãe disse que sim. “Ele não queria ir para a Rússia, ele queria ir para casa, ele realmente queria ir para casa. Mas em tal situação era necessário decidir. Ou ir para lá e permanecer vivo ou ficar em Mariupol e morrer por um tiro ou sob os escombros”, disse ela.
Em 17 de março, Andrey foi informado por um vizinho que tropas russas estavam entrando nas casas das pessoas e exigindo que os moradores evacuassem. No dia seguinte, ele e seus vizinhos fugiram do abrigo e correram para um posto de controle perto do mar. Lá, os soldados da RPD disseram aos homens para se despirem até a cintura e os revistaram em busca de “tatuagens”, depois verificaram seus passaportes, antes de levá-los em carros para Bezimenne, uma cidade litorânea a cerca de 26 quilômetros ao leste.
Andrey foi colocado em uma escola, onde disse que seu passaporte e celular foram verificados novamente; ele ouviu rumores de um acampamento nas proximidades, mas não foi levado para lá. Autoridades na escola perguntaram se ele planejava ficar na RPD ou ir para outro lugar. “Talvez houvesse apenas alguns conhecidos que queriam ir para a Rússia. Mas basicamente, todos que queriam ir embora queriam ir para a Ucrânia”, disse ele. Nenhum teve essa opção.
Em 21 de março, Andrey disse que foi levado para Dokuchaevsk, 105 quilômetros ao norte da região de Donetsk, para o que descreveu como um “centro de filtragem”, onde os ucranianos foram registrados. Ele teve suas impressões digitais colhidas, foi fotografado, seu celular revistado e os contatos baixados.
Imagens de satélite fornecidas pela Maxar Technologies mostraram ônibus brancos estacionados do lado de fora do Centro de Cultura e Lazer, em Dokuchaevsk, onde Andrey disse que foi registrado. O “centro de filtragem” em Dokuchaevsk foi citado pelo embaixador dos EUA na Organização para Segurança e Cooperação na Europa, Michael Carpenter, entre outros funcionários.
Dois dias depois, Andrey disse que foi levado de volta ao sul, para Novoazovsk, e depois pela fronteira com a Rússia, onde passou pela alfândega, teve seu passaporte verificado e o cartão de migração carimbado. No início de 24 de março, ele foi levado de ônibus para Taganrog, uma cidade portuária russa no Mar de Azov, onde foi instalado um centro de refugiados em uma escola de esportes olímpicos. Andrey pegou um trem de 10 horas de Taganrog para Voronezh, onde ele está hospedado agora com sua sogra. Ele disse que na estação de trem em Taganrog, ele viu outros ucranianos que não tinham dinheiro ou documentos sendo levados à força para Penza, quase 1 mil quilômetros a nordeste, no interior do território russo.
Andrey está tentando descobrir como voltar de Voronezh para a Ucrânia, possivelmente por Belarus.
Algumas pessoas na Ucrânia podem pensar que aqueles que partiram para a Rússia são traidores, mas isso é uma exceção à regra. A maioria das pessoas entende que estávamos indo para onde pudemos sair. Mas alguns não entendem que não tínhamos escolha – tínhamos apenas uma estrada, e ela era para Novoazovsk.
Andrey
A defensora de direitos humanos, Svetlana Gannushkina, que dirige uma organização de refugiados em Moscou, disse à CNN que recebeu dezenas de pedidos de ajuda de ucranianos como Andrey, agora presos em cidades espalhadas por toda a Rússia. Muitos decidiram ficar com amigos ou parentes, com o maior número reunido na região de Rostov, perto da Ucrânia. Aqueles que entraram em contato disseram a ela que a escolha de vir para a Rússia foi feita para eles.
“São pessoas que se encontram entre dois incêndios em uma situação completamente terrível”, disse Gannushkina. “Não há questão de livre arbítrio aqui. Eles foram para onde podiam ir naquele momento. E não havia outro caminho além do caminho para a Rússia”.
Anna, 24
Anna estava morando em um bunker há duas semanas, abrigada em um subúrbio ao norte de Mariupol com sua família, quando os soldados invadiram o local. “Eles entraram e disseram: ‘É uma ordem: mulheres e crianças têm que sair’. Alguns pediram para ficar, eles disseram não”, disse a tradutora de 24 anos à CNN.
Os homens estavam vestidos com uniformes militares e portando armas, mas ela disse que era impossível dizer se eram da RPD ou das forças russas, porque eles não estavam usando insígnias e não se identificaram.
Todas as mulheres e crianças foram forçadas a sair – cerca de 90 no total, incluindo sua mãe, irmão adolescente, avó, tia e os dois filhos de sua tia. Quando Anna saiu do esconderijo, ela mal conseguia reconhecer a paisagem. “Tudo foi completamente destruído”, disse ela.
Anna descreveu ter sido levada de ônibus para uma cidade próxima, onde foi interrogada por policiais da RPD durante a noite em uma escola. Em 16 de março, ela disse que todos foram enviados para o leste, para a vila ucraniana de Bezimenne, onde foram direcionados para um “campo de registro”.
Em uma enorme tenda militar, eles se juntaram a centenas de outras pessoas de Mariupol – ela foi informada por um soldado que haviam cerca de 900 ao todo – onde eles tiveram as impressões digitais coletadas e foram fotografados, seus telefones pesquisados e contatos baixados. “Depois que você entrega seu telefone, eles fazem o check-in para a primeira fase do processo.
Eles fotografam você de todos os ângulos, para reconhecimento facial, eu suspeito. Em seguida, você dá a eles suas impressões digitais e, estranhamente, impressões das palmas das mãos também. Eu não sei por quê”, disse Anna. “Depois disso, eles inserem seus dados no banco de dados, como seu endereço, número de telefone e informações do passaporte. Na próxima etapa, você passa para um interrogatório”.
Eles foram interrogados sobre suas políticas, atitudes em relação à RPD e às autoridades russas. As perguntas incluíam informações sobre parentes que servem no batalhão Azov, a principal presença do exército ucraniano em Mariupol, disse ela.
Imagens de satélite da Maxar Technologies mostram um acampamento de barracas em Bezimenne, perto da escola onde Andrey e outros moradores de Mariupol disseram que ficaram.
A Missão de Monitoramento de Direitos Humanos da ONU na Ucrânia não conseguiu verificar o número de residentes de Mariupol levados para Bezimenne ou outras partes da RPD, mas dizem acreditar que o número é “considerável” com base em declarações de funcionários da RPD e entrevistas com várias pessoas que se mudaram para Donetsk.
“Em alguns casos, os moradores expressaram sua clara preferência de serem evacuados para território controlado pelo governo, mas foram informados de que apenas a evacuação para o território da autoproclamada ‘república’ ou da Federação Russa era possível”, disse um porta-voz da missão à CNN.
A agência de notícias estatal russa RIA Novosti publicou um relatório sobre os refugiados de Mariupol em Bezimenne em 25 de março, descrevendo funcionários da RPD fornecendo comida, assistência médica e abrigo para pessoas deslocadas da cidade para “ajudá-las a se sentirem seguras”. Uma legenda da foto diz: “As pessoas precisam decidir o que fazer a seguir”. Autoridades da RPD dizem que mais de 11 mil pessoas de Mariupol estão agora em Donetsk.
Depois de várias horas, Anna disse que foi levada de ônibus para a fronteira russa, onde recebeu um cartão de migração e um voucher de 10 mil rublos (cerca de US$ 100). Eles foram levados pela alfândega russa, tiveram seus documentos carimbados e então, disse Anna, ela foi selecionada para interrogatório por alguém que ela suspeitava ser um oficial do FSB.
Fomos tratados como criminosos, sendo mantidos como propriedade da Federação Russa. Não senti que estávamos livres para sair.
Anna
A polícia acompanhou o ônibus até Taganrog, onde foram deixados em uma estação ferroviária. Aqueles que não tinham família ou amigos na Rússia, ou dinheiro para transporte, estavam sendo enviados para Vladimir, uma cidade a quase 1 mil quilômetros ao leste. Anna disse que sua tia e filhos, que fugiram de Mariupol sem qualquer documentação, foram levados para lá.
Anna, sua mãe, avó e irmão se separaram para ir para Rostov; eles foram autorizados a fazê-lo porque eles tinham amigos lá, disse ela. De Rostov, Anna viajou de trem para Moscou, depois para São Petersburgo, e acabou cruzando a fronteira da Rússia para o norte da Estônia em 22 de março. Em uma entrevista separada, a mãe de Anna, que também conseguiu deixar a Rússia, corroborou com o relato.
Anna disse que sentiu que a evacuação era uma espécie de “armadilha o tempo todo”. E embora ela tenha ficado com medo de ir para a Rússia, ela disse que o medo de ficar em uma área ocupada da Ucrânia era maior.
Dmytrii, 21
Dmytrii mudou-se para Mariupol em fevereiro para cursar a universidade. Menos de um mês depois, o estudante de mestrado de 21 anos se viu escondido com milhares de outras pessoas em Terrasport, um complexo esportivo que virou abrigo na cidade.
Em 14 de março, ele disse que os soldados da RPD apareceram no centro. “Eles disseram: ‘Estamos assumindo o prédio. Vá embora para evacuação’, mas não disseram para onde ir”, lembrou Dmytrii. “Eles estavam sorrindo e tivemos que sorrir de volta para ficarmos seguros, ninguém queria ter problemas”.
Multidões de pessoas fugiram a pé para um posto de controle perto do shopping Portcity, a cerca de 2,4 quilômetros de distância, onde avistaram ônibus com a letra Z – um símbolo que se tornou sinônimo de apoio à guerra brutal da Rússia. Dmytrii disse que eles nunca tinham visto o sinal antes.
No posto de controle, os homens foram solicitados a se despir para que pudessem ser verificados quanto a tatuagens. Dmytrii disse que os deslocados foram informados de que poderiam ser levados para a Rússia ou encontrar seu próprio caminho na Ucrânia, mas mais tarde foram avisados de que os ucranianos não fariam nada para ajudá-los. “’Ninguém vai evacuar vocês. As autoridades ucranianas não dão a mínima para vocês’”, Dmytrii lembrou os soldados dizendo.
Oleksandra Matviichuk, chefe do Centro Ucraniano para as Liberdades Civis, com sede em Kiev, disse que entrevistou várias pessoas transferidas de Mariupol para a Rússia, que descreveram ultimatos semelhantes. “Disseram a eles: ‘Vocês têm a opção de ficar e morrer, ou ir para a Rússia’. E, com certeza, não é uma opção”, disse Matviichuk à CNN, acrescentando que eles foram pressionados pela desinformação sobre a disposição da Ucrânia de acolhê-los. “Eles foram informados de que, ‘Não há espaço vazio nas cidades ucranianas, eles não poderiam fornecer acomodação. Somente a Rússia pode fazer isso’”.
Ela continuou: “Independentemente de as tropas russas usarem violência física para transferí-los para a Rússia ou não. É ilegal. Por quê? Porque, de acordo com os padrões do direito humanitário internacional, os lados do conflito precisam abrir corredores humanitários e fornecer uma possibilidade para os civis serem evacuados com segurança da zona perigosa. Mas o problema é que a Rússia não permitiu esses corredores”.
Dmytrii disse que os ônibus “Z” os levaram 16 quilômetros a noroeste de Nikolske, uma cidade na RPD, onde foram levados para um “campo de registro” montado em uma escola. “Havia ajuda humanitária russa, cartazes – tudo para fingir que ‘nós ajudamos você’”, contou. Lá eles foram registrados, o passaporte verificado e colocados na lista de “refugiados”.
Logo depois, eles foram informados de que não havia espaço para eles ficarem na cidade e foram carregados em 13 ônibus com destino à Rússia. No posto de fronteira de Novoazovsk, eles foram novamente interrogados e seus telefones verificados. “Tivemos muito medo por nossos documentos – pensamos que eles poderiam tirá-los. Mas isso não aconteceu”, disse Dmytrii.
O grupo foi informado de que seria enviado para Rostov, mas acabou em um centro de refugiados na escola de esportes olímpicos de Taganrog. Lá, disse Dmytrii, ele recebeu um chip de celular, comida e produtos de higiene pessoal para tomar banho. Ele não tinha dormido por 48 horas e estava exausto.
Quando ele ouviu o anúncio de que um trem estava partindo para Yaroslavl, a nordeste de Moscou, decidiu apanhá-lo. Dmytrii disse que ele e outros ucranianos foram levados para um centro de recreação em Sakharezh, na região de Yaroslavl, onde centenas estavam sendo processadas para o status de refugiado, as biometrias registradas, receberam cartões bancários russos, ofereceram empregos e foram interrogadas por quem ele acreditava serem agentes do FSB. “Foi muito bem organizado. Na minha opinião, eles estavam tentando nos assimilar”, disse ele.
Em conversas silenciosas, os ucranianos do centro passavam informações e planejavam como poderiam sair. A Estônia parecia ser a melhor opção. Dmytrii registrou um cartão bancário para que parentes russos pudessem lhe enviar rublos. Ele comprou passagens de trem para Moscou, depois para São Petersburgo e finalmente para Ivangorod. Na fronteira entre Ivangorod e Narva, para a Estônia, Dmytrii disse que foi perguntado por uma autoridade russa por que ele estava viajando sem documentos – ele tinha a identidade ucraniana, mas não um passaporte.
Se fomos levados para Novoazovsk com sorrisos, já havia uma atitude grosseira. Era visível. Uma mulher que pegou meus documentos para registrar me perguntou: ‘Por que diabos você veio para a fronteira sem passaporte internacional? E por que diabos você me levou à força para esta terra fora da minha Ucrânia?
Dmytrii
Eliza Mackintosh escreveu o artigo e relatos de Lviv. Oleksandra Ochman colaborou de Lviv. Gianluca Mezzofiore e Katie Polglase colaboraram de Londres. Teele Rebane colaborou de Hong Kong. Nathan Hodge e Yuliia Presniakova contribuíram com reportagens.