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    Ruanda se prepara para receber refugiados deportados do Reino Unido

    Requerentes de asilo ficarão no Hope Hostel, local que abrigou os estudantes sobreviventes do genocídio de 1994

    Larry MadowoBethlehem Felekeda CNN , Ruanda

    Hope Hostel, em Ruanda, não é um hotel de 5 estrelas. Mas também não é um lixo qualquer. As instalações dos 50 quartos foram renovadas com uma nova camada de tinta, roupas de cama limpas, muitas câmeras de segurança novas e uma missão alterada: depois de abrigar estudantes sobreviventes do genocídio de 1994 por quase três décadas, o Hope Hostel será o primeiro lar para migrantes deportados do Reino Unido.

    O governo ruandês disse à CNN que os migrantes receberão pensão completa, assistência médica e apoio por cinco anos ou até serem autossuficientes. É um esquema controverso que o Reino Unido apresentou como uma “abordagem inovadora para asilo seguro e legal que interromperá o negócio perigoso dos contrabandistas de pessoas”. O projeto, porém, foi condenado por dezenas de grupos de direitos dos refugiados, agências internacionais, líderes britânicos, o chefe da Igreja Anglicana e até mesmo políticos da oposição ruandesa.

    Uma semana antes das primeiras chegadas, os trabalhadores estavam dando os retoques finais em um pequeno galpão de madeira ao lado do restaurante do hostel. “Esta será uma loja para que eles possam comprar o que precisam aqui em vez de sair”, explicou o diretor-gerente, Ismael Bakina. Duas áreas cobertas nos jardins servirão como autódromos e uma tenda mais afastada funcionará como sala para entrevistas e área de jogos.

    Há uma vistoria de segurança semelhante ao que ocorre em aeroportos antes do embarque, incluindo um scanner de bagagem e guardas com detectores de metal. Eles são educados, profissionais e minuciosos. “Como vocês podem ver, estamos prontos para receber os imigrantes ainda hoje”, diz Bakina em entrevista à CNN poucas horas antes da primeira rodada de processo legais contra a deportação ser lançada no Reino Unido. Os procedimentos contra a política não tiveram sucesso até agora, e o primeiro voo do Reino Unido para Ruanda deve decolar nesta terça-feira (14).

    Assim que chegarem, dois migrantes dividirão cada um dos quarto, com banheiros comunitários e áreas de lavanderia em todos os andares. Eles também terão duas áreas de oração com tapete vermelho com vista para as colinas de Kigali, Wi-Fi gratuito e computadores para acompanhar seus processo legais. As autoridades ruandesas ressaltam o relativo privilégio que os migrantes terão aqui, em comparação com as instalações de detenção britânicas.

    “Queremos que eles tenham acomodações seguras e dignas, e também há um pacote que eles receberão para que possam estudar, adquirir habilidades e, quem sabem, iniciar um negócio”, afirmou a porta-voz do governo de Ruanda, Yolande Makolo, à CNN.

    Reino Unido fechou um acordo de R$ 740 milhões

    O Reino Unido diz que pagará 120 milhões de libras (R$ 740 milhões) a Ruanda nos próximos cinco anos para financiar o programa. Além disso, o governo britânico também prometeu pagar os custos de processo e integração para cada pessoa realocada, cobrindo o custo de aconselhamento jurídico, assistentes sociais, tradutores, acomodação, alimentação e saúde. A gestão do Reino Unido espera que os gastos sejam semelhantes aos custos dos processos de asilo no país, que são de cerca de 12.000 libras por pessoa.

    O Reino Unido se recusou a divulgar o valor dos voos fretados para transportar deportados para Ruanda. O Ministério do Interior disse em seu último relatório anual que pagou 8,6 milhões de libras para fretar 47 voos de deportação transportando 883 pessoas em 2020. Embora o custo de voos individuais varie dependendo do destino, os números significam que, em média, a pasta gastou 183.000 libras por voo ou £ 9.700 por pessoa.

    Como não há limite para o número de migrantes, milhares podem entrar em Kigali nos primeiros cinco anos do projeto. A suposta segurança que Ruanda está oferecendo foi questionada por organizações internacionais de direitos humanos como a Human Rights Watch (HRW), que argumenta que o país “não pode ser considerado um país de terceiro mundo seguro para enviar requerentes de asilo”.

    A HRW vem monitorando e investigando as condições dos direitos humanos em Ruanda há décadas e documentou abusos que vão desde “repressão à liberdade de expressão, detenção arbitrária, maus-tratos e tortura pelas autoridades ruandesas”.

    A organização acusou as autoridades ruandesas de matar pelo menos 12 refugiados e prender mais de 60 em 2018, depois que a polícia atirou em um grupo de manifestantes que protestavam contra cortes nos pacotes de comida. A Comissão Nacional de Direitos Humanos de Ruanda investigou o incidente e afirmou que a polícia “teve que recorrer à força depois que as atividades pacíficas falharam”, mas classificou a tragédia como um “evento isolado”.

    O plano do Reino Unido também atraiu críticas do único partido de oposição que concorreu contra o presidente de Ruanda, Paul Kagame, na última eleição, o Partido Democrático Verde de Ruanda. A legenda alega que o país não pode pagar pelo projeto. “Ruanda é o país mais densamente povoado da África. Você acha que para Ruanda será fácil ajudar essas pessoas?”, questionou o secretário-geral Jean Claude Ntezimana à CNN.

    Ruanda tem quase um décimo do tamanho do Reino Unido, mas abriga cerca de 13 milhões de pessoas, aproximadamente um quinto da população do Reino Unido.

    O Partido Verde acusa o Reino Unido de violar suas obrigações internacionais ao enviar seus migrantes indesejados a 4.000 milhas de distância para Ruanda. “Como não é a escolha dos refugiados, é desumano e ilegal”, afirmou Ntezimana.

    O governo ruandês, por outro lado, afirma que é perfeitamente legal.

    “Não há leis sendo quebradas com esse acordo, disse Makolo à CNN. “Não há nada na Convenção de Refugiados que impeça que os requerentes de asilo sejam realocados para outro país seguro.”

    Programa pode ser replicado em nova parceira entre Ruanda e Dinamarca

    Makolo admite que um programa semelhante com Israel não funcionou, mas, segundo ela, o acordo de imigração do Reino Unido é totalmente diferente e terá sucesso. Na verdade, Makolo disse, Ruanda poderá em breve aceitar imigrantes da Dinamarca também — as negociações perto de uma conclusão.

    Mais recentemente, Ruanda fez parceria com a agência de refugiados da ONU para acolher requerentes de asilo vulneráveis ​​evacuados da Líbia. Pouco mais de mil migrantes passaram pelo Centro de Trânsito de Emergência de Gashora nos três anos em que o programa está ativo. Os migrantes ficam, em média, entre quatro a oito meses antes de serem reassentados no exterior, segundo o gerente do centro. Os migrantes têm três opções: reassentamento em outro lugar, repatriação voluntária para seu país de origem ou integração local na sociedade ruandesa. Ninguém escolheu os dois últimos, de acordo com o gerente Fares Ruyumbu.

    “Não dá para comparar (Líbia e Ruanda)”, disse Zemen Fesaha, de 26 anos, refugiado eritreu no Centro de Trânsito de Emergência de Gashora. Ele passou quatro anos no que descreveu como “condições horríveis” na Líbia, enquanto tentava repetidamente, mas sem sucesso, cruzar o Mar Mediterrâneo para chegar à Europa. “É como ir do inferno ao céu.”

    Apesar dos 11 meses que passou em Ruanda no acampamento terem sido mais seguros e fáceis, ele está determinado a partir. E não está sozinho nessa. Nenhum dos refugiados no entro de emergência com quem a CNN falou desejava ficar em Ruanda.

    Nyalada Gatluak Jany, de 26 anos, do Sudão do Sul, sonha em se mudar para a Finlândia com seu filho de 1 ano e meio. “O que eu quero não está aqui, está lá”, afirmou.

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