Réu e fichado, Trump se apresenta como vítima até eleição e segue como opção para parte do eleitorado dos EUA
Trump se defende das acusações apresentando-se duplamente como vítima
Um cidadão comum que responde a dois processos federais e dois estaduais, nos quais é acusado de 91 crimes, teria muita dificuldade de conseguir um emprego. Esse réu em série também teria imensa dificuldade de obter liberdade condicional sob fiança, dado o risco de alguém com um histórico de crimes tão longo reincidir.
Pois o ex-presidente Donald Trump é o candidato favorito do Partido Republicano para a eleição presidencial de 2024, e figura empatado nas pesquisas com o seu rival democrata, o atual presidente Joe Biden.
VÍDEO – Trump deixa presídio na Geórgia após pagamento de fiança
Além disso, nessa quarta apresentação à Justiça, na Geórgia, os advogados de Trump negociaram uma fiança de US$ 200 mil (cerca de R$ 1 milhão) e pagaram apenas 10% desse valor, não em dinheiro vivo, mas por meio de uma agência especializada em caução.
Mesmo assim, Trump se defende das acusações apresentando-se duplamente como vítima: de fraude nas eleições de 2020 — a versão não comprovada que levou precisamente a essas investigações — e de perseguição de uma Justiça supostamente controlada por seus adversários democratas.
Até que ponto os eleitores do Partido Republicano, considerado tradicionalmente o partido da lei e da ordem, estão dispostos a aceitar um presidente com tantos problemas na Justiça? Até uma eventual condenação, indicam as pesquisas. Todos esses julgamentos passam por um júri, e a condenação tem que ser unânime.
Se a defesa de Trump não conseguir convencer ao menos um jurado de sua inocência, raciocina uma parte dos eleitores republicanos, então Trump deve ter mesmo feito algo errado.
As pesquisas indicam que um terço dos eleitores americanos está disposto a segui-lo aconteça o que acontecer. Mas esse índice de apoio está longe de ser suficiente para elegê-lo presidente.
Daí a importância política de ao menos um desses quatro processos ser julgado antes da eleição de 5 de novembro do ano que vem. É um tempo relativamente curto, para processos complexos, que envolvem múltiplas provas e testemunhas. No caso da Geórgia, com uma agravante: são 19 réus, o que multiplica as chances de apelações que retardam o julgamento.
Mesmo assim, há uma Lei de Julgamento Rápido na Geórgia, que obriga o Ministério Público e os juízes a evitar atrasos. Isso é visto como um direito do réu de não ter uma acusação formal pesando sobre sua reputação por um longo período, sem chance de provar logo sua inocência. A promotora Fani Willis tem a intenção de iniciar o julgamento no dia 23 de outubro.
Da mesma forma, a juíza Tanya Chutkan, que conduz o processo federal em Washington relacionado com a invasão do Capitólio, tem reputação de julgar rapidamente. Ela também deve iniciar o julgamento em breve.
Trump tem alguns dos melhores advogados dos Estados Unidos, e farão tudo para protelar os julgamentos. Mas a Justiça americana não tem uma tolerância infinita com manobras desse tipo.