Reconhecimento da Palestina indica fim da perspectiva por acordo, diz professor
Países europeus anunciaram nesta quarta-feira que vão reconhecer Estado palestino oficialmente no próximo dia 28
O reconhecimento do Estado palestino por países europeus — decisão anunciada nesta quarta-feira (22) por Irlanda, Espanha e Noruega — indica o fim da perspectiva de que Israel e as lideranças palestinas conseguirão chegar a um acordo para a garantia da paz duradoura na região, avalia Michel Ghetman Professor de Sociologia e do Programa de Pós Graduação em História Social da UFRJ.
O processo será oficializado no dia 28 deste mês, quando os três países se juntarão ao grupo de mais de 130 nações que reconhecem o Estado palestino. A decisão, classificada por Ghetman como acertada, aponta para uma mudança de paradigma na forma como a comunidade internacional encara as tensões no Oriente Médio.
“Até então, o debate era sobre a criação de um Estado palestino fruto de negociações. É isso que acontece desde 1991. Agora, efetivamente, o horizonte de expectativas é de que a ideia de negociação está saindo do trilho”, afirma Ghetman. O que, segundo o professor, indica a “sinalização de um esforço internacional para formular esse acordo”.
No início de maio, a Assembleia-Geral das Nações Unidas aprovou, por larga maioria, a elegibilidade da Palestina para se qualificar a Estado-membro da entidade. A decisão, entretanto, exige o aval do Conselho de Segurança, onde os EUA detêm poder de veto.
Fim do diálogo
A guerra na Faixa de Gaza entre as Forças de Defesa Israelenses e o Hamas, que controla o enclave, representa o ápice do distanciamento de qualquer solução diplomática entre palestinos e israelenses. Mas a corrosão das bases que sustentavam esse diálogo já havia começado há anos.
Segundo Ghetman, dois movimentos distintos, mas que tem relação entre si, explicam a perda de confiança nas negociações por uma solução de dois Estados.
Primeiro, o fortalecimento do Hamas como principal representante dos palestinos em razão do esvaziamento dos poderes da Autoridade Palestina, que governa a Cisjordânia e partes de Jerusalém. E segundo, a falta de interesse da coalizão de partidos liderada por Benjamin Netanyahu em, de fato, implementar um Estado palestino.
“O Hamas se tornou a alternativa concreta de poder muito pela relação que construiu com os governos de Benjamin Netanyahu até aqui. E a coalizão que Netanyahu lidera não é apenas contrária à solução de dois Estados, mas está impossibilitando também qualquer avanço no reconhecimento da existência da possibilidade de um povo palestino ter um Estado-nação”, avalia Ghetman.
EUA lideram pedidos por negociação
Apesar da maioria dos países-membro da ONU aprovar o reconhecimento do Estado palestino, um grupo relevante para a comunidade internacional segue distante dessa postura: os países do G7, bloco formado por Alemanha, Canadá, Estados Unidos, França, Itália, Japão e Reino Unido.
Nesta quarta-feira (23), a Casa Branca classificou como um erro o anúncio da decisão dos países europeus de reconhecer a Palestina como um Estado. E voltou a reafirmar a confiança dos EUA no diálogo entre Israel e os palestinos para a criação da solução de dois Estados.
“No G7, estamos pensando nas economias vinculadas ao bloco estadunidense, onde ainda há a percepção de que é possível chegar a um acordo. E há, também, um outro movimento. Algumas das economias do G7 estão sob influência de políticos radicais, o que faz esses países recuarem de uma posição mais avançada de reconhecimento do Estado palestino por conta das configurações específicas desses países comandados por partidos de extrema-direita”.
Enquanto não há qualquer perspectiva pela criação do Estado palestino ou, sequer, por um acordo que leve a um cessar-fogo permanente na Faixa de Gaza, israelenses e palestinos que vivem no território compartilhado seguem como as principais vítimas da disputa.
No ataque de 7 de outubro, que deu início à guerra, o Hamas matou cerca de 1,2 mil israelenses e sequestrou mais de 240 pessoas. Até aqui, operação coordenada pelo gabinete de guerra de Netanyahu, por sua vez, levou à morte de mais de 35 mil palestinos.
“A única possibilidade de segurança na região, tanto para palestinos quanto para israelenses é a criação de um Estado palestino o mais rápido possível. A não-criação do Estado palestino fortalece grupos como a extrema-direita israelense e o Hamas, que dialogam numa espécie de dança mórbida pelo menos desde 2009”, finaliza Ghetman.