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    “Quero voltar. Minha vida não vale a pena sem minha família”, diz palestino retido fora da Faixa de Gaza

    Refugiados na Cisjordânia, 180 homens de Gaza que trabalhavam em Israel no momento do ataque estão quase sem comunicação e sem acesso às suas famílias em meio à guerra

    Ivana KottasováAbeer SalmanWisam Jafarida CNN* , Cisjordânia

    Os homens no salão de festas do campo de refugiados de Dheisheh, na Cisjordânia, passam a maior parte dos dias e das noites colados aos telefones, fumando e atualizando constantemente o feed de notícias. Eles parecem exaustos: os horrores dos últimos dias claramente visíveis em seus rostos.

    Estes 180 homens são refugiados de Gaza. Eles estão entre os cerca de 18 mil residentes do enclave que possuem autorizações para trabalho em Israel e podem cruzar a fronteira de um lado para o outro. Quando as Forças de Defesa de Israel (FDI) fecharam todo o acesso a Gaza após o ataque terrorista do Hamas no dia 7 de outubro, esses homens ficaram presos.

    Alguns têm esposas e filhos em Khan Younis, uma cidade no sul de Gaza que é agora o epicentro da sua própria crise de refugiados, que se desenrola rapidamente, e não conseguem sair.

    As FDI têm atacado incansavelmente Gaza depois que os extremistas do Hamas realizaram um ataque terrorista e lançaram milhares de foguetes que até agora mataram pelo menos 1.400 pessoas. O Hamas também sequestrou cerca de 150 outras pessoas no sábado passado, durante sua violência sem precedentes.

    Os militares de Israel afirmam que o seu objetivo é destruir o Hamas e garantir que este nunca mais possa realizar tal ataque. Mas o custo civil da campanha foi imenso. O Ministério da Saúde palestino em Gaza disse que 2.450 pessoas foram mortas nos últimos oito dias, o que é mais do que durante toda a guerra de 2014, que durou 51 dias.

    A esposa e os cinco filhos de Ismail Abd Almagid – quatro meninas e um menino – estão em Gaza enquanto ele permanece no campo de refugiados. Ele tem vídeos de todos eles em seu celular. Um deles mostra sua filha Misk comendo um pedaço de manga. Quando ele reproduz o vídeo, lágrimas começam a escorrer por seu rosto.

    Tala, a sua segunda filha mais velha, ficou ferida na guerra de 2014, quando a família estava hospedada na casa dos seus pais. “Ela adora patins, então eu disse a ela que trarei patins para ela quando voltar”, disse ele.

    Abd Almagid, 44 anos, disse à CNN que tenta manter contato com sua esposa o tempo todo, mas a comunicação tem sido difícil desde que Israel cortou o acesso de Gaza à eletricidade, alimentos e água.

    “Meus filhos estão me dizendo para orar por eles. A situação lá é muito difícil”, afirmou. “Eu voltaria [para Gaza] agora mesmo… mesmo com tudo o que está acontecendo, me leve para Gaza, irei com você agora mesmo, minha vida não vale a pena sem minha família”.

    Ismail Abd Almagid está em um campo de refugiados na Cisjordânia / Ivana Kottasova/CNN

    Neste momento, está em curso uma enorme movimentação populacional em Gaza, com centenas de milhares de pessoas se dirigindo para sul, muitas delas para as ruas superlotadas de Khan Younis.

    Os militares israelenses disseram às pessoas que viviam no densamente povoado norte de Gaza, incluindo a Cidade de Gaza, que se mudassem para o sul da faixa. As Nações Unidas disseram que a instrução, que afeta 1,1 milhão de pessoas, causaria “consequências humanitárias devastadoras”.

    As Forças de Desfesa de Israel disseram à CNN no domingo (15) que estimam que 500 mil pessoas deixaram o norte de Gaza em direção ao sul até agora.

    Quando Abd Almagid obteve autorização para trabalhar em Israel, em outubro do ano passado, foi como se estivesse ganhando na loteria. A economia de Gaza, que é governada pelo Hamas mas bloqueada por Israel e pelo Egito, foi dizimada e a taxa de desemprego é de 45%, segundo o Gabinete Central de Estatísticas palestino.

    “Sempre quis esta licença porque a situação em Gaza é muito grave. A situação financeira, a dívida, a economia é zero. Não há oportunidades de trabalho”, disse ele, acrescentando que estava desempregado desde que se formou, em 2004, até quando obteve a licença.

    Israel começou a emitir milhares de autorizações de trabalho para os habitantes de Gaza atravessarem para Israel como parte de uma estratégia de incentivo econômico que as autoridades israelenses esperavam que pudesse dissuadir o Hamas de novos conflitos armados.

    Vista do campo de refugiados de Dheisheh, na Cisjordânia. A pequena área abriga hoje mais de 18.500 pessoas / Ivana Kottasova/CNN

    Sua esposa, formada como professora de inglês, também está desempregada. Ele disse que passava semanas alternadas em Israel, onde trabalhava em uma padaria.

    Muitos dos homens no campo de refugiados de Dheisheh estão na mesma situação – são os únicos membros das suas famílias que têm emprego. Os salários que ganham em Israel são muitas vezes superiores a qualquer coisa que conseguiriam em Gaza.

    Marwan Saqer, 55 anos, é o único de toda a sua família que tem um emprego – e o único que já pisou fora de Gaza.

    Ele trabalhava em um canteiro de obras em Kafr Qassem, uma cidade árabe perto de Tel Aviv, quando o Hamas atacou Israel. Ele afirmou que a Autoridade Palestina disse a ele e a outros habitantes de Gaza para virem para a Cisjordânia depois que suas autorizações de trabalho israelenses foram canceladas.

    Ele disse que o povo de Dheisheh os recebeu de braços abertos, trazendo-lhes colchões, cobertores e suprimentos básicos, além de proporcionar conforto e companhia.

    O campo de Dheisheh, em Belém, foi estabelecido pela primeira vez em 1949, quando 3.000 palestinos se estabeleceram lá depois de serem expulsos ou fugirem de aldeias a oeste de Jerusalém.

    Desde então, a população do campo cresceu para mais de 18.500 pessoas que ainda vivem numa área agora construída de um terço de quilômetro quadrado, de acordo com a Agência das Nações Unidas de Assistência aos Refugiados da Palestina.

    Marwan Saqer olha para seu telefone enquanto sua família tenta ligar para ele de Gaza, mas não consegue / Ivana Kottasova/CNN

    As paredes do campo estão decoradas com retratos dos seus residentes, na sua maioria jovens, que foram mortos no conflito Israel-Palestina que já dura décadas. A tradição começou na década de 1990 como forma de celebrá-los e persiste até agora.

    Enquanto o campo está sob controle palestino, as Forças de Defesa de Israel realizam regularmente incursões, prendendo pessoas e conduzindo ataques. Residentes locais disseram à CNN que as FDI chegaram na manhã de domingo e detiveram três pessoas. Embora 180 pessoas de Gaza já tenham chegado ao campo, espera-se que mais cheguem nos próximos dias.

    Marwan Saqer disse que, pelo que ele saiba, a sua esposa e oito filhos deixaram a sua casa no centro de Gaza três ou quatro vezes na semana passada, mas agora regressaram.

    Enquanto falava com a CNN, o telefone de Saqer tocou várias vezes – o seu filho estava ligando de Gaza. Ele atendeu, mas foi desconectado quase imediatamente, pois o sinal do outro lado falhou. “Nós conversamos, mas eles só me dizem metade da verdade. Eles não querem me deixar mais preocupado”, disse ele à CNN.

    O fato de serem os maridos e os pais que estão na relativa segurança do campo de refugiados, enquanto as mulheres e as crianças estão em Gaza, pesa muito sobre estes homens. “É difícil. Todos nós nos sentamos juntos e compartilhamos nossos sentimentos. Todos nós sentimos o mesmo, todos os pais. Todos sentimos o sofrimento dos nossos filhos”, disse Saqer.

    O espaço está ficando claustrofóbico e a atmosfera está tensa. Discussões podem surgir facilmente sobre questões como um ponto de energia. “Há pessoas em nosso grupo que ficam acordadas a noite toda chorando”, disse Saqer. “Todos nós, fisicamente, estamos aqui, mas as nossas mentes estão em Gaza”.

    *Com informações de Jeremy Diamond, Matthias Somm, Kareem Khaddar e Hamdi Alkhshali, da CNN.

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