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    Por que Sunak trouxe ex-premiê Cameron de volta à política britânica

    Movimento do governo Conservador pode ser manobra para agradar eleitores em momento de baixa de popularidade

    Análise por Luke McGeeda CNN , Londres

    Desde que se tornou primeiro-ministro britânico há pouco mais de um ano, Rishi Sunak tentou trazer um pouco de calma para o governo caótico que herdou.

    As políticas econômicas da sua predecessora Liz Truss fizeram com que a moeda do país, a libra, caísse para o seu nível mais baixo em relação ao dólar em décadas. A inflação atingiu a casa dos dois dígitos. As taxas de juros só subiram.

    Por sua vez, o Partido Conservador, do governo, já lutava para se recuperar dos anos tumultuados do primeiro-ministro de Boris Johnson antes mesmo da chegada de Liz Truss – uma fase que terminou em escândalo, fúria do povo e números péssimos nas pesquisas de popularidade.

    Apesar de lutar em sua meta de estabilizar o navio, Sunak tem dificuldade para convencer a todos sobre a sua personalidade política e a qual tipo de conservadorismo pertence.

    Tudo isso pode ter mudado na segunda-feira (13), quando Sunak surpreendeu a classe dirigente da política britânica em Westminster ao nomear o ex-primeiro-ministro David Cameron como o seu novo ministro das Relações Exteriores.

    A indicação aconteceu depois da dispensa de Suella Braverman – um nome forte da direita do partido que recentemente descreveu manifestações pró-palestinas como “marchas de ódio” e chamou a situação de rua de “escolha de estilo de vida”. Braverman era Ministra do Interior.

    Cameron, é claro, é mais conhecido como o premiê que convocou o referendo do Brexit em 2016. À época, como membro do centro do Partido Conservador , ele liderou a campanha para permanecer na União Europeia.

     

     

    A chocante votação pela saída do Reino Unido da União Europeia fez com que Cameron renunciasse ao cargo, logo na manhã do resultado, e deu início a sete anos de amarga política partidária entre os conservadores sobre o Brexit, levando até a uma discussão sobre a alma do partido.

    Quase de um dia para o outro, a reforma pró-meio ambiente, as pró-pautas sociais e o conservadorismo liberal centrista de Cameron foram jogados na sarjeta, abrindo um espaço enorme para pessoas da direita, como Braverman, mudarem todo o partido na sua direção.

    A opinião convencional era que Sunak era fraco demais para demitir Braverman, mesmo depois de ela ter feito declarações controversas durante meses e tenha, segundo o senso comum, estabelecido as bases para substituir Sunak se ele perder as próximas eleições.

    Muitos também acreditavam que manter Braverman num cargo fundamental no gabinete era uma questão de gestão partidária, feita para apaziguar a direita do partido – que suspeitava que Sunak era um liberal no armário.

    A nomeação de Cameron e a demissão de Braverman podem sugerir a esses críticos que Sunak está finalmente mostrando suas verdadeiras cores e abrindo o campo para os moderados, distanciando-se assim das guerras culturais e das pancadas de Johnson, Truss e da própria Braverman.

    Puxar o governo de volta para o centro pode parecer sensato, uma vez que as pesquisas mostram números péssimos para os Conservadores e a população em geral parece cansada dos tumultos políticos.

    Mas ele terá de ajustar a nova direção em seu próprio partido, o que não será fácil, uma vez que os deputados, membros e eleitores conservadores permanecem divididos em inúmeras facções.

    O primeiro-ministro britânico Rishi Sunak e a ex-ministra do Interior, Suella Braverman / Phil Noble – Pool/Getty Images

    Alguns adoram a política de guerra popular e cultural de Boris Johnson e pensam que forçá-lo a sair do cargo já custou aos conservadores as próximas eleições. Outros são libertários que pregam cortes nos impostos.

    À direita do partido há um grupo que defende a linha dura contra criminosos e imigrantes. Já à esquerda do partido estão os moderados, que pensam que o povo está farto do psicodrama conservador e quer voltar a ter um governo maduro.

    Sunak tentou, até certo ponto, ser todas essas coisas ao mesmo tempo no ano passado. Ele se pintou como um agente de mudança que não se moldou pelos últimos 13 anos do governo conservador – no qual ele serviu como ministro das Finanças.

    No mês passado, ao palestrar na conferência anual conservadora, o primeiro-ministro criticou os últimos “30 anos de um sistema político que incentiva a decisão fácil, não a correta”.

    Nesse discurso, Sunak apoiou sentenças mais duras para criminosos, defendeu uma inversão de marcha sobre a transição verde do Reino Unido, fez comentários desonestos sobre os direitos de pessoas trans e apoiou, de forma empolgada, os planos de Braverman de deportar refugiados para Ruanda – algo que os tribunais britânicos impediram o governo de fazer.

    É meio misterioso como uma mudança para o centro e Cameron se encaixam em tudo isso. Afinal, Cameron foi um dos muitos líderes anteriores dos quais Sunak tentou se distanciar.

    Cameron, por sua vez, vem com uma bagagem pesada.

    Primeiro, há o Brexit, que ele, aos olhos dos seus críticos, permitiu que acontecesse ao convocar o referendo, convencendo os seus colegas líderes mundiais de que o lado do “fica” ganharia. Muitos na política britânica não o perdoaram por isso e por ter renunciado imediatamente depois de perder.

    Mais recentemente, Cameron foi envolvido num escândalo de lobbying no qual ele pessoalmente pressionou Sunak (então ministro das Finanças de Boris Johnson) para garantir fundos do governo e assim evitar que uma empresa de serviços financeiros para a qual trabalhou falisse durante a pandemia da Covid-19. Seus pedidos foram negados.

    Para alguns à direita do partido, o ex-primeiro-ministro é visto como inimigo. Antes de se tornar líder do partido em 2005 e PM em 2010, Cameron era um modernizador.

    Pouco depois de virar líder em 2006, ele fez um discurso sugerindo que os jovens que usavam capuz (vistos como criminosos) não deveriam ser temidos, mas receber mais amor. Ele também foi fotografado abraçando cães da raça husky siberiano na neve para provar suas credenciais verdes.

    A partir de 2010-2015, Cameron governou em coligação com os Democratas Liberais centristas, pró-europeus. Muitos dos seus deputados mais de direita acreditavam que ele estaria mais à vontade com os Democratas Liberais do que com os “verdadeiros” Conservadores.

    Alguns membros do Partido Conservador acreditam que a nomeação de Cameron é uma boa ideia, dizendo que o ato mostra que o partido está pronto para ser sério e maduro novamente. Mas é provável que eles estejam em minoria.

    Um ministro do gabinete disse à CNN que o fato é a prova de que o partido está completamente sem ideias.

    A nomeação continuará a suscitar mais questões nos próximos dias, à medida que os observadores buscam quaisquer mudanças perceptíveis na política do governo ou seu aceno para o centrismo.

    É difícil até saber exatamente como Sunak podia fazer isso. Foi  apenas na semana passada que a sua agenda política para o próximo ano, contendo muitas posições de direita, foi oficialmente apresentada no parlamento. Mas isso não quer dizer que ele estivesse firme em alguma posição antes disso. O primeiro-ministro não pode mudar de uma posição para outra quando, de fato, ele nunca convenceu num lugar ou noutro.

    Com a proximidade das eleições, provavelmente em algum momento do próximo ano, talvez as maiores conquistas do governo não importem.

    Talvez isto seja mais uma mudança do clima geral: trazer mãos seguras para demonstrar estabilidade aos eleitores, mantendo políticas mais duras para fazer com que os seus críticos conservadores saiam do seu pé.

    Seja qual for a verdade por trás do rearranjo pouco ortodoxo de Sunak em sua equipe de elite, ele não tem muito tempo para causar impacto no seu destino político.

    A próxima eleição desponta no horizonte e o seu partido ainda está muito, muito atrás nas pesquisas.

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