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    O que a vitória de Trump ou Biden significaria para o Oriente Médio

    Uma calmaria assustadora paira sobre o Oriente Médio à medida que a eleição presidencial dos EUA se aproxima

    Por Tamara Qiblawi, da CNN

    Uma calmaria assustadora paira sobre o Oriente Médio à medida que a eleição presidencial dos EUA se aproxima. As falhas políticas na região parecem mais silenciosas do que o normal e as lutas políticas internas parecem ter diminuído. Contudo, essa paz relativa reflete um pouco mais do que a apreensão dos chefes regionais ao se voltarem para Washington para ver se uma mudança na liderança global está prestes a acontecer.

    De acordo com analistas e políticos, a eleição poderia mudar o cálculo político da maioria dos líderes do Oriente Médio. Do destino do acordo nuclear com o Irã ao chamado “acordo do século” do presidente Donald Trump para israelenses e palestinos e o aumento implacável do autoritarismo desenfreado, o resultado da disputa eleitoral pode ter um impacto drástico nas questões que moldam a região.

    Veja a seguir como o ex-vice-presidente Joe Biden e o presidente Donald Trump se posicionam sobre os principais assuntos políticos.

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    Autoritarismo crescente do Egito à Arábia Saudita

    Biden prometeu desfazer o que muitos consideram ser o cerne da política externa de Trump: fechar os olhos para a autocracia e os abusos dos direitos humanos em favor de uma política baseada em considerações práticas, a chamada realpolitik.

    Para muitos no Oriente Médio, o país sob o comando de Trump abandonou o apoio à democracia em uma região liderada por homens poderosos apoiados pelos EUA. No entanto, os efeitos da abordagem do presidente têm sido gritantes. O autoritarismo se descontrolou e a repressão dos ativistas chocou até os mais cínicos.

    Na Arábia Saudita, Trump leva o crédito da elevação do príncipe Mohammed bin Salman a príncipe herdeiro e governante diário do reino. Bin Salman, conhecido informalmente como MBS, liderou uma rápida sucessão de reformas, mas reprimiu com veemência a dissidência e prendeu dezenas de ativistas, inclusive algumas defensoras dos direitos das mulheres.

    Trump fez apenas críticas discretas a MBS, mesmo depois do assassinato em 2018 do crítico mais conhecido do príncipe, Jamal Khashoggi, no consulado saudita em Istambul. Enquanto isso, ativistas de direitos humanos proeminentes, incluindo o vencedor do prêmio PEN Loujain al-Hathloul, continuaram a definhar nas prisões sauditas sob falsas acusações.

    Em um questionário do Conselho de Relações Exteriores dos EUA, Biden criticou o que descreveu como “a perigosa carta branca” de Trump para o reino e prometeu “ordenar uma reavaliação do relacionamento com a Arábia Saudita”.

    “Defenderei o direito de ativistas, dissidentes políticos e jornalistas do mundo todo de falarem o que pensam abertamente, sem medo de perseguição e violência”, disse Biden em um comunicado que marcou o aniversário do assassinato de Khashoggi em outubro. “A morte de Jamal não será em vão, e devemos à sua memória lutar por um mundo mais justo e livre.”

    Biden também prometeu encerrar o apoio dos EUA à campanha liderada pelos sauditas para acabar com os rebeldes houthis apoiados pelo Irã no Iêmen. A guerra custou dezenas de milhares de vidas e gerou surtos de doenças e fome.

    No entanto, a promessa sobre a guerra do Iêmen vai contra o histórico de Biden. O governo do ex-presidente Barack Obama, do qual Biden foi vice-presidente, vendeu bilhões de dólares em armas para a Arábia Saudita, mesmo como bombardeio de Iêmen. Como agora, a Casa Branca sob o governo Obama não fez nenhuma tentativa significativa de moderar a monarquia absoluta da Arábia Saudita, embora acredita-se que MBS tenha agravado os abusos de direitos no reino.

    No Egito, Biden também criticou o apoio de Trump ao presidente egípcio Abdel Fattah el-Sisi, que o presidente dos EUA supostamente chegou a descrever como “meu ditador favorito”. No Egito, as críticas de Biden estão um pouco à altura. Embora o golpe egípcio que derrubou o único presidente democraticamente eleito do país, Mohamed Morsy, e acabou levando Sisi ao poder, tenha acontecido durante o mandato de Obama em 2013, o ex-presidente dos EUA aparentemente tentou pressionar o líder egípcio a melhorar seu histórico de direitos humanos, mas não obteve sucesso.

    A repressão de Sisi aos críticos tem sido surpreendente, com dezenas de milhares de dissidentes presos nos últimos anos. Recentemente, o suicídio da defensora de direitos LGBTQ Sarah Hegazi serviu como uma dura lembrança da brutalidade que muitos têm enfrentado sob o governo de Sisi. Hegazi lutou contra a depressão e o transtorno de estresse pós-traumático depois de supostamente ter sofrido abusos sexuais e físicos em uma prisão egípcia. Ela foi presa por hastear uma bandeira arco-íris em um show em 2017.

    Israel, palestinos e o ‘acordo do século’

    Talvez um dos pontos altos da presidência de Trump tenha sido quando ele deu início a acordos de normalização entre Israel e três países árabes.

    Os Emirados Árabes lideraram o grupo em agosto, e esse foi o primeiro acordo de normalização entre Israel e um estado árabe ou de maioria muçulmana em mais de duas décadas. A liderança palestina, que considera esses acordos uma traição, ficou de fora das negociações.

    Os acordos representavam um golpe em seus sonhos de criação de um estado ao passar por cima da Iniciativa de Paz Árabe de 2002 que condicionou a normalização a uma retirada israelense para as fronteiras anteriores a 1967. Além disso, eles serviram como insulto após Trump ter forçado políticas unilaterais por anos – como a designação de Jerusalém como capital de Israel e a legitimação de assentamentos israelenses considerados ilegais de acordo com o direito internacional – que minaram a posição deles nas negociações agora enfraquecidas com o Israelenses.

    Biden saudou os acordos de normalização e disse que pressionaria mais países da região a tomarem medidas para realizar acordos semelhantes. Entretanto, ele disse que se opõe ao unilateralismo que definiu a abordagem de Trump para Israel e os palestinos.

    “Biden se opõe a quaisquer medidas unilaterais de qualquer um dos lados que comprometam uma solução de dois estados”, diz o site de sua campanha. “Ele se opõe à anexação e à expansão dos assentamentos e continuará a se opor a ambos quando for presidente.”

    Biden também prometeu reverter a retirada de Trump do apoio econômico e humanitário dos palestinos e a reabrir a missão da Organização para a Libertação da Palestina em Washington, bem como o consulado dos EUA em Jerusalém responsável por assuntos palestinos.

    No entanto, Trump já ajudou o primeiro-ministro Benjamin Netanyahu a estabelecer novos fatos na região, reforçando fortemente a posição israelense por algum tempo. Se Biden tentasse reverter as decisões de Trump em alguns dos principais pontos de conflito das negociações Israel-Palestina – ou seja, Jerusalém e os assentamentos –, ele poderia se ver em rota de colisão com alguns dos apoiadores de Israel em Washington.

    E é importante observar que Biden se opôs aos métodos de Trump na questão Israel-Palestina, mas não aos resultados.

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    O acordo de Irã

    Biden comentou que restauraria o acordo nuclear da era Obama – conhecido formalmente como Plano de Ação Conjunto Abrangente – com o Irã, do qual Trump se retirou em maio de 2018. Desde então, o Irã tem sofrido algumas das sanções mais duras que já enfrentou. Um ano após a retirada de Trump, Teerã reiniciou partes do programa nuclear que o plano de ação destruiu.

    “Se o Irã voltasse a cumprir suas obrigações nucleares, eu entraria novamente no plano de ação para trabalhar com nossos aliados da Europa e de outras potências mundiais para estender as restrições nucleares do acordo”, disse Biden ao Conselho de Relações Exteriores.

    “Isso ajudaria a restabelecer a credibilidade dos EUA, sinalizando para o mundo que a nossa palavra e os nossos compromissos internacionais significam algo novamente.”

    A promessa de Biden de retornar ao acordo nuclear é amplamente considerada a razão pela qual o Irã se recusou a retomar as negociações com a Casa Branca de Trump, desafiando uma campanha devastadora que buscava obter mais concessões de Teerã. O ministro de Relações Exteriores iraniano, Javad Zarif, que teve um papel fundamental na obtenção do acordo de 2015, disse diversas vezes que o Irã não negociaria outro acordo.

    Se Trump for reeleito, no entanto, o Irã poderá achar difícil resistir às aberturas do presidente e enfrentar outros quatro anos de dificuldades econômicas. De muitas maneiras, a retirada de Trump do acordo nuclear pode ser vista como uma característica definidora do Oriente Médio nos últimos quatro anos, e seu retorno pode levar a região para um território desconhecido.

    Quando o poder do Estado Islâmico caiu no primeiro ano de presidência de Trump, a Casa Branca começou a voltar sua atenção para conter um Irã mais poderoso. Tanto os caças apoiados pelos EUA quanto as forças apoiadas pelo Irã, sem nenhuma coordenação visível entre os dois, lutaram para derrotar o Estado Islâmico.

    A morte do grupo extremista parecia coincidir com o nascimento da chamada campanha de “pressão máxima” de Trump sobre o Irã, preparando o cenário para uma região que parecia estar constantemente à beira de uma guerra cataclísmica. O Irã lançou seu maior ataque de mísseis balísticos contra as posições dos EUA. E Teerã afirma que ainda não vingou a morte de Soleimani.

    Enquanto isso, a população da região sofre com a crise econômica, o desemprego juvenil e a crescente desconfiança em sua liderança, e tudo isso foi exacerbado pela pandemia do coronavírus. A Pesquisa da Juventude Árabe (Arab Youth Survey) constatou que a maioria dos jovens árabes em estados devastados pela crise apoia protestos antigovernamentais e quase metade dos jovens árabes considerou deixar seus países.

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