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    Vozes da Diplomacia

    Nova Rota da Seda trará mais empresas chinesas para o Brasil, diz embaixador

    Zhu Qingqiao diz que China facilitará importações de produtos brasileiros de alto valor agregado; ao falar sobre rivalidade geopolítica com EUA, ele argumenta: "Nunca buscamos criar esferas de influência"

    Daniel Rittnerda CNN , Brasília

    A eventual entrada do Brasil na Iniciativa Cinturão e Rota – conhecida também como Nova Rota da Seda – incentivará a participação de mais empresas chinesas em novos projetos de investimento no país, afirma o embaixador da China em Brasília, Zhu Qingqiao.

    Em entrevista à CNN, Zhu disse que Pequim facilitará a entrada de produtos brasileiros de alto valor agregado no mercado chinês e citou 271 categorias de bens industrializados com grande potencial de exportação para a China, podendo chegar a US$ 110 bilhões.

    O intercâmbio comercial entre os dois países cresceu quase 50 vezes desde que o gigante asiático entrou na Organização Mundial do Comércio (OMC), em 2001, mas o Brasil ainda concentra suas vendas à China em três produtos: soja, minério de ferro e petróleo.

    Zhu inaugura a seção Vozes da Diplomacia, que terá entrevistas semanais com personalidades relevantes da comunidade diplomática no Brasil ou no exterior.

    “[A Iniciativa Cinturão e Rota] dará uma expectativa positiva, estável e de longo prazo para o empresariado de ambos os países”, afirmou Zhu, que assumiu a embaixada no Brasil em dezembro de 2022, após ter chefiado a representação chinesa no México.

    Mais de 140 países fazem parte da BRI, sigla em inglês da iniciativa, e a adesão brasileira será discutida na visita que o presidente Xi Jiniping fará ao colega Luiz Inácio Lula da Silva (PT), em novembro. “A China acolhe a entrada do Brasil nesse jogo”, observou.

    A Nova Rota da Seda já financiou mais de 5 mil projetos, mas também recebe críticas por suposta falta de transparência e por ter estimulado uma “armadilha da dívida” em muitos países que recebem crédito da China — e depois se veem encurralados para pagar seus empréstimos.

    Nesta entrevista, Zhu ressaltou que a China não busca criar “esferas de influência” e nunca participou de “disputas estratégicas”, em referência à crescente rivalidade geopolítica com os Estados Unidos. Leia abaixo:

    O presidente Xi Jinping virá ao Brasil em novembro, para a cúpula de líderes do G20, e também terá reuniões bilaterais com Lula. Quais serão as principais mensagens e propostas que Xi deverá trazer em sua visita?

    A diplomacia presidencial tem um papel fundamental para orientar o desenvolvimento das relações sino-brasileiras. Em abril de 2023, a visita bem-sucedida do presidente Lula à China deu um forte impulso ampliação e ao aprofundamento da cooperação em todas as áreas entre nossos países.

    Sob a liderança estratégica do presidente Xi Jinping e do presidente Lula, as relações bilaterais estão entrando em uma nova era. Os dois presidentes vão manter intensos contatos para traçar a evolução desse relacionamento a partir de uma perspectiva estratégica e de longo prazo.

    A China valoriza altamente a posição e a influência internacional do Brasil, e apoia a realização da cúpula de líderes do G20 no Rio de Janeiro.

    Como um grande país em desenvolvimento, o Brasil escolheu como tema da cúpula deste ano “Construir um mundo justo e um planeta sustentável”, com três frentes prioritárias: a inclusão social e o combate à fome e à pobreza; a promoção do desenvolvimento sustentável e das transições energéticas; e a reforma das instituições de governança global.

    Essa temática está em plena consonância com a visão do presidente Xi Jinping de construir uma comunidade com um futuro compartilhado para a humanidade.

    A China está disposta a estreitar ainda mais a coordenação com o Brasil e assumir a missão de construir uma comunidade com um futuro compartilhado para a humanidade.

    Juntos, seremos uma força central na manutenção da paz, uma força vital no desenvolvimento e na abertura e uma força construtiva na governança global.

    A China tem defendido a entrada do Brasil na Iniciativa Cinturão e Rota (BRI). Do ponto de vista prático, o Brasil já recebe investimentos na área de infraestrutura, como energia e portos. Empresas chinesas já podem participar dos leilões. Que diferença fará o Brasil estar ou não na BRI?

    A Iniciativa Cinturão e Rota, proposta pelo presidente Xi Jinping, é uma medida importante para a abertura da China em nível mais elevado e uma plataforma internacional de cooperação que fomenta uma globalização econômica inclusiva e benéfica para todos.

    A iniciativa já atraiu a participação de mais de três quartos dos países do mundo, resultou em mais de 5 mil projetos de cooperação e investimentos superiores a US$ 1 trilhão.

    Criou 420 mil empregos nos países participantes e tornou-se a maior plataforma de cooperação internacional em termos de abrangência e escala, o que impulsiona o crescimento inclusivo e sustentável da economia global.

    Ela está muito alinhada com as estratégias de desenvolvimento do governo Lula, como o Nova Indústria Brasil e as Rotas de Integração Sul-Americana. Recentemente, o presidente Lula declarou seu interesse em discutir a Iniciativa Cinturão e Rota com a China. A China acolhe a entrada do Brasil nesse jogo.

    Essa participação não apenas incentivará a participação de mais empresas chinesas em projetos de investimento no Brasil, de acordo com regras de mercado, como também dará uma expectativa positiva, estável e de longo prazo para o empresariado de ambos os países.

    Isso permitirá que as empresas chinesas e brasileiras aproveitem as oportunidades e enfrentem os desafios trazidos pela nova revolução tecnológica e pela transformação industrial para explorar o potencial de cooperação, expandir os espaços de colaboração e promover uma parceria estratégica e duradoura em setores prioritários da modernização dos dois países, trazendo benefícios concretos aos dois povos.

    Desde que a China entrou na Organização Mundial do Comércio (OMC), em 2001, o intercâmbio comercial com o Brasil cresceu 49 vezes. No entanto, mais de 75% das exportações brasileiras ao mercado chinês se concentram em apenas três produtos: soja, minério de ferro e petróleo.

    Na relação comercial com a China, estamos condenados a vender commodities e comprar bens industrializados? O que fazer para mudar isso?

    O comércio entre China e Brasil tem como características o grande volume, a alta complementaridade e a forte resiliência.

    Nos últimos 15 anos, a China tem sido o maior parceiro comercial e a maior fonte de superávit comercial do Brasil, enquanto o Brasil é o maior parceiro comercial da China na América Latina, com exportações para a China acima de US$ 100 bilhões por ano.

    A atual estrutura do comércio bilateral, determinada pelas dotações de recursos, pelos estágios de desenvolvimento e pelas demandas mútuas dos dois países, reflete as leis do comércio, as escolhas do mercado e as vantagens comparativas do Brasil.

    Na realidade, enquanto as exportações brasileiras para a China têm crescido de forma constante, elas também estão se diversificando.

    Nos últimos cinco anos, as exportações brasileiras de máquinas e equipamentos para a China quase dobraram, e a China se tornou o nono maior destino desses produtos. Em 2023, as exportações brasileiras de café para a China ultrapassaram 1 milhão de sacas pela primeira vez, um aumento de 278% em relação a 2022.

    As exportações de produtos de consumo diário, como castanhas e sucos, também cresceram muito mais rápido do que os produtos tradicionais do comércio bilateral. Ao mesmo tempo, o valor agregado do comércio de commodities também está aumentando.

    A colaboração da Vale com parceiros chineses para utilizar tecnologias 5G e de energia renovável vem promovendo a mineração inteligente e de baixo carbono. A Suzano abriu um centro de pesquisa e desenvolvimento de materiais renováveis em Shanghai.

    Em maio deste ano, a China recebeu o primeiro lote de soja brasileira livre de desmatamento e totalmente rastreável pelo Grupo COFCO. As tecnologias 5G e de inteligência artificial da Huawei estão ajudando os agricultores brasileiros a realizar operações inteligentes.

    A Terceira Sessão Plenária do 20º Comitê Central do Partido Comunista da China, realizada em julho deste ano, fez um planejamento sistemático para aprofundar ainda mais as reformas e promover a modernização ao estilo chinês.

    A decisão aprovada na sessão propõe mais de 300 importantes medidas de reforma. A China continuará a expandir a abertura institucional e a desenvolver um ambiente de negócios mais orientado para o mercado, alicerçado no Estado de Direito e alinhado com os padrões internacionais.

    Essas medidas visam conferir vitalidade e impulso contínuos à modernização chinesa. A entrada de mais de 1,4 bilhão de pessoas na modernização significa a criação de um mercado gigantesco, maior do que a soma dos países desenvolvidos existentes, e abre um espaço mais amplo para produtos de qualidade de todos os países.

    De acordo com o último relatório da ApexBrasil, 271 categorias de produtos industrializados brasileiros têm potencial grande de exportação para a China, com um valor total estimado em cerca de US$ 110 bilhões.

    Junto com o Brasil, vamos aprimorar os canais de comércio bilateral, expandir a cooperação em áreas como comércio eletrônico transfronteiriço, logística moderna e infraestrutura digital, e facilitar a entrada de mais produtos brasileiros de alto valor agregado no mercado chinês.

    O mundo está cada vez mais fragmentado entre Estados Unidos e China. O Brasil tem rejeitado a ideia de que será preciso, em algum momento, fazer uma escolha entre os dois.

    A visão da China é que os países podem relações políticas, econômicas e comerciais igualmente intensas com Pequim e com Washington? Ou precisarão escolher?

    A China sempre adota uma política externa independente e pacífica, defende a igualdade entre todos os países, grandes ou pequenos, promove uma multipolarização mundial ordenada e equitativa, uma globalização econômica inclusiva e benéfica para todos. E busca construir uma comunidade de futuro compartilhado para a humanidade.

    A China nunca interfere nos assuntos internos de outros países, nunca busca disputas geopolíticas e nunca força outros países a escolherem lados. Como ressaltou o Presidente Xi Jinping, jamais seguiremos o velho caminho da exploração colonial, nem tomaremos o rumo equivocado de uma nação poderosa em busca de hegemonia. Em vez disso, trilharemos o caminho justo do desenvolvimento pacífico.

    A China está empenhada em promover a coordenação e a interação positiva entre as grandes potências. Buscamos construir um padrão de relações internacionais caracterizado pela coexistência pacífica, pela estabilidade geral e pelo desenvolvimento equilibrado.

    Somos contra a mentalidade de soma zero, o confronto entre blocos e a “dissociação e ruptura das cadeias de suprimentos”.

    Esse é o ponto de partida fundamental da China ao analisar o mundo e as relações sino-americanas. O Brasil é um país soberano e independente.

    A China sempre colocou as relações sino-brasileiras como uma prioridade em sua diplomacia e apoia firmemente o Brasil no seu desenvolvimento econômico e social e no aumento de sua atuação em assuntos internacionais e regionais.

    A China nunca teve considerações geopolíticas no Brasil, nunca buscou criar esferas de influência e nunca participou de supostas disputas estratégicas.

    O desenvolvimento das relações políticas e econômicas entre China e Brasil é uma escolha autônoma e voluntária de ambos os lados, que gera benefícios mútuos e resultados positivos para ambos, e que não visa terceiros e nem deve ser influenciada por terceiros.

    A China acolhe positivamente o desenvolvimento das relações do Brasil com qualquer outro país e acredita que as parcerias estabelecidas pelo Brasil com outras nações podem coexistir, complementar-se e promover-se mutuamente.

    A China gostaria de ver uma nova ampliação dos Brics? E qual é a posição de Pequim sobre uma reforma do Conselho de Segurança da ONU? Está a favor da inclusão do Brasil como membro permanente?

    O mecanismo de cooperação dos Brics surgiu no contexto da ascensão coletiva dos mercados emergentes e dos países em desenvolvimento.

    Nos últimos 18 anos, tornou-se uma força crucial para promover o crescimento econômico mundial, impulsionar a reforma do sistema de governança global e manter a paz e a estabilidade internacionais, com influência e atratividade crescentes.

    No ano passado, os líderes dos cinco países, incluindo China e Brasil, acordaram em uma decisão política para realizar a histórica ampliação dos Brics, enviando uma mensagem clara de solidariedade e progresso entre os países em desenvolvimento e consolidando a confiança do Sul Global em sua união e autofortalecimento.

    O Brasil, como membro fundador dos Brics, tem sido promotor e beneficiário do aprofundamento da cooperação no grupo.

    A China continuará a trabalhar com o Brasil para apoiar firmemente o fortalecimento e a ampliação do mecanismo dos Brics, aumentar a representatividade e a voz dos mercados emergentes e dos países em desenvolvimento nos assuntos internacionais, de forma a promover um equilíbrio mais justo e razoável das forças mundiais.

    Diante do atual cenário de complexidade e desordem global, os países esperam que a ONU desempenhe efetivamente um papel de liderança na abordagem dos desafios globais e que o Conselho de Segurança assuma a responsabilidade de manter a paz e a segurança internacionais, conforme estipula a Carta da ONU.

    Considerando o desenvolvimento de longo prazo da ONU e os interesses comuns de todos os Estados Membros, a China apoia a reforma do Conselho de Segurança de maneira estável e na direção correta, a fim de aumentar a representatividade, a voz e a participação dos países em desenvolvimento nos assuntos globais.

    O Brasil, como potência da América Latina e membro importante de mecanismos multilaterais como os Brics e o G20, tem uma influência e uma atuação significativas nos assuntos regionais e internacionais. A China reconhece e apoia o desejo do Brasil de desempenhar um papel maior na ONU.

    Este ano marca o cinquentenário do estabelecimento de relações diplomáticas entre China e Brasil. Como o sr. vê as perspectivas de desenvolvimento das relações bilaterais?

    China e Brasil são os maiores países em desenvolvimento em seus respectivos hemisférios, Oriental e Ocidental.

    Ao longo de meio século de relações diplomáticas, nossos laços bilaterais resistiram às mudanças no cenário internacional, se tornaram cada vez mais maduros e estáveis, e ganharam uma crescente influência global, estratégica e abrangente.

    Essa parceria vem promovendo o bem-estar de nossos povos e contribuindo significativamente para a paz mundial e o desenvolvimento comum. Nossa relação estabeleceu um exemplo de respeito mútuo, igualdade e cooperação vantajosa entre os países.

    Atualmente, o mundo enfrenta mudanças sem precedentes em um século. Como atores importantes do Sul Global, China e Brasil compartilham amplos interesses comuns e responsabilidades de desenvolvimento.

    Aproveitando o cinquentenário das relações diplomáticas como uma oportunidade e sob a visão estratégica de nossos líderes, a China está disposta a trabalhar com toda a sociedade brasileira para resumir as experiências de sucesso nessas cinco décadas, fortalecer a sinergia de nossas estratégias de desenvolvimento, aprofundar de forma abrangente a cooperação e o intercâmbio, e adicionar conteúdo do nosso tempo à amizade sino-brasileira, a fim de manter nossas relações sempre na vanguarda dos tempos.

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