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    Neto de nazista procura descendentes de judeus prejudicados por seu avô

    Na infância, Thomas Edelmann ouvira boatos sobre o negócio da família e suspeitava que ele pertencera a judeus e decidiu ir atrás da história

    Lianne Kolirin, da CNN

    Thomas Edelmann nasceu na Alemanha mais de 30 anos depois que os Aliados derrotaram Hitler.

    No entanto, no ano passado, após uma ligação de marketing inesperada, o empresário de 49 anos contatou um professor aposentado em Israel para se desculpar pelas ações do avô que ele nunca conheceu.

    Na infância, Edelmann ouvira boatos sobre o negócio da família e suspeitava que ele pertencera a judeus que foram forçados a vender para seu avô paterno, Wilhelm.

    Pai de dois filhos, Thomas Edelmann começou a pesquisar a genealogia da família nos últimos anos. 

    Com isso, encontrou registros de impostos nazistas confirmando que o antigo proprietário judeu, Benjamin Heidelberger, fora forçado a vender a loja de ferragens na cidade de Bad Mergentheim, sul da Alemanha, em 1938, logo após a introdução do sistema antissemita conhecido como Leis de Nuremberg. 

    Wllhelm Edelmann: homem comprou a loja de Benjamin Heidelberger em 1938
    Willhelm Edelmann, o homem que comprou a loja de Benjamin Heidelberger
    Foto: Cortesia de Thomas Edelmann para a CNN

    Ao restringir o acesso dos judeus à economia alemã, as leis tornaram legal o confisco de suas propriedades.

    Edelmann contou esse fato para um vendedor do site MyHeritage, empresa que monta a árvore genealógica online, que havia ligado para ele para discutir sua assinatura. Fascinado, o vendedor contou a história à equipe de pesquisa da empresa.

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    Duas semanas depois, Edelmann recebeu uma ligação do MyHeritage. Eles descobriram dois registros importantes: o registro de naturalização de Heidelberger em 1942 no Mandato Britânico da Palestina e sua lápide ao lado de sua esposa, Emma, no norte de Israel. Além disso, eles descobriram que Heidelberger tinha uma neta viva.

    Hanna Ehrenreich, uma professora aposentada de 83 anos, sabia tudo sobre a loja que passou a se chamar Willi Edelmann. 

    Túmulo de Benjamin e Emma Heidelberger em Israel
    O túmulo de Benjamin e Emma Heidelberger em Israel
    Foto: MyHeritage.com

    Tanto é verdade que uma foto em preto e branco dela (ainda com o antigo nome de seu avô) ainda adorna uma parede de sua casa em Israel.

    Edelmann, que perdera contato com o pai depois que seus pais se divorciaram no início dos anos 1970, sabia pouco sobre a história de sua família paterna e não tem nenhuma ligação com a próspera rede de varejo que floresceu a partir da loja de ferragens.

    Embora a loja em si não exista mais, a família de Edelmann ainda é proprietária do prédio, bem como de vários outros imóveis na cidade. Ele, porém, não tem participação na empresa.

    Edelmann enviou uma carta para Ehrenreich em inglês através do site MyHeritage – sem saber que a mulher israelense crescera falando alemão.

    O alemão escreveu: “Acredito que, se minha família apoiou a injustiça vivida por seus avós, é nosso dever levar isso em consideração e assumir a responsabilidade pelo menos entrando em contato com vocês para ouvir e aprender. Como faço parte da família Edelmann, quero dar o primeiro passo e ouvir você”.

    Benjamin Heidelberger em seu uniforme do exército alemão da 1ª Guerra Mundial
    Benjamin Heidelberger em seu uniforme do exército alemão da Primeira Guerra Mundial
    Foto: Cortesia de Hanna Ehrenreich para a CNN

    “Entendo que a senhora pode não ver nenhum benefício pessoal em falar comigo. Mas, ao compreender e ser capaz de ensinar meus filhos e possivelmente outros membros da família sobre o impacto de decisões históricas específicas, isso pode ajudá-los a tomar decisões melhores em suas vidas”, continuou Edelmann.

    “Atualmente, o clima político em nosso país está envenenado. Há um novo antissemitismo chegando. Quero ter certeza de que pelo menos minha família nunca mais será responsável por injustiças sofridas por outros, e fico ao lado dos mais fracos”, escreveu ele.

    Depois de receber a carta de Edelmann, Ehrenreich concordou em falar com ele e, semanas depois, a dupla passou 90 minutos discutindo o passado de suas famílias ao telefone, em alemão.

    “Foi uma conversa muito boa”, disse a senhora Ehrenreich à CNN. “Thomas queria saber como estávamos. Eu disse que éramos felizes e tivemos uma vida boa”.

    Registros mostram que os Heidelberger foram naturalizados na Palestina
    Registros mostram que Benjamin e Emma Heidelberger foram naturalizados no Mandato Britânico da Palestina em 1942
    Foto: My Heritage.com

    A senhora israelense contou ao alemão que Benjamin Heidelberger e sua esposa, Emma, seus avós paternos, usaram o dinheiro da venda forçada de sua loja para fugir para a Palestina em 1938, poucas semanas antes dos terríveis eventos da Kristallnacht, a Noite dos Cristais, a onda de violentos ataques (pogroms) aos judeus que aconteceram em 9 e 10 de novembro.

    Pouco antes dos avós, os pais de Ehrenreich já haviam partido para Israel, onde ela nasceu m 1937. Infelizmente, seus avós maternos permaneceram na Alemanha e morreram sob o regime nazista.

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    “Ele ficou muito emocionado e disse que estava muito feliz em ouvir a história do meu lado. Estava quase chorando”, contou.

    Ehrenreich, que era próxima de seu avô, compartilhou sua versão dos acontecimentos a respeito da compra da loja por Edelmann, acalmando alguns de seus medos e suspeitas sobre o que aconteceu.

    A mulher explicou que o avô sempre falava de sua terra natal e mantinha um diário em sua língua materna.

    Nele, escreveu: “Meu sucessor na empresa, Wilhelm Edelmann, vinha todos os primeiros dias do mês pagar o aluguel e, embora fosse membro do Partido Nazista, era um homem decente e não um antissemita.

    Heidelbergers em Israel
    Os Heidelbergers em Israel
    Foto: Cortesia de Hanna Ehrenreich para a CNN

    No outono de 1937, vendemos a ele nossa casa por 10 mil reichsmark, embora meu preço inicial fosse de 15 mil. Em julho de 1938, vendemos nossa loja e depósito pelo preço de banana de 28,5 mil reichsmark, a mesma quantia pela qual eu havia comprado 30 anos antes”, continuou Heidelberger.

    “Em circunstâncias diferentes, eu poderia ter vendido por 40 mil. Mas naquela época muitas empresas judaicas em Bad Mergentheim foram vendidas abaixo do valor”, explicou.

    “Um dia, Edelmann veio até mim e disse que eu deveria deixar a Alemanha o mais rápido possível”, escreveu. “Havia planos para agir contra os judeus e ele se sentiu obrigado a me avisar, porque era um conhecido dele”.

    Ehrenreich, que visitou a loja em uma viagem em família a Bad Mergentheim na década de 1980, disse à CNN: “Eu sabia que Edelmann era mesmo a pessoa que comprou a loja. Entendi que era um bom homem, embora fosse membro do Partido Nazista”.

    Edelmann disse que ficou profundamente comovido com a ligação e que a dupla manteve contato; ele espera visitar Israel no futuro.

    Thomas Edelmann e seu filho Finn, de 15 anos
    Thomas Edelmann e seu filho Finn, agora com 15 anos
    Foto: Cortesia de Thomas Edelmann para a CNN

    “Foi um momento muito emocionante quando ouvi Hanna ao telefone e quando ela me contou sobre seu avô”, disse ele. “Embora sua família tenha sido tratada tão mal, ela foi muito amigável e não me responsabilizou por nada”.

    Mesmo satisfeito em ouvir a versão dos acontecimentos de Ehrenreich, Edelmann diz que ainda tem dúvidas sobre seu avô.

    “Eu sei que meu avô era muito hábil como empresário. Quando era estudante, na década de 1920, já era membro do Partido Nazista, antes de Hitler chegar ao poder. Portanto, não acredito que ele fosse um homem tão bom, não estou 100% convencido. Duvido que ele não tenha tirado vantagem da situação”.

    Edelmann sente que aceitar o passado é uma lição importante para seus filhos, em particular para seu filho de 15 anos, Finn, que começou a aprender sobre o passado nazista da Alemanha no ensino médio no ano passado.

    (Texto traduzido, clique aqui para ler o original em inglês)

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