Ministra da Noruega diz que Brasil tem potencial de ser uma liderança construtiva no conflito entre Israel e Palestina
Em visita a Brasília, Anniken Huitfeldt, ministra das Relações Exteriores norueguesa, defende que a prioridade seja evitar que o conflito se estenda para a Cisjordânia
Em meio à escalada do conflito entre Israel e o Hamas, a ministra das Relações Exteriores da Noruega, Anniken Huitfeldt, afirmou que o Brasil tem potencial para se destacar como uma liderança para a paz e conciliação.
“Temos isso em comum: a habilidade de encontrar soluções conjuntas, mesmo em espaços que estão muito divididos. O Conselho de Segurança está muito dividido agora, mas acredito que o Brasil pode desempenhar essa função construtiva, porque vocês falam com todas as partes. É justamente em situações extremamente difíceis como esta que precisamos do Brasil”, disse Huitfeldt à CNN, em visita ao Brasil para agendas com o governo e sociedade civil.
Atualmente, o Brasil preside o Conselho de Segurança das Nações Unidas. O embaixador Sérgio Danese, que chefia a representação do Brasil na ONU, convocou a primeira reunião do órgão logo após o início das hostilidades. A reunião foi feita a portas fechadas e não produziu um documento com determinações. Em briefing aos jornalistas, o Itamaraty esclareceu que Danese continua em consultas contínuas com os outros membros do Conselho para dar continuidade à negociação.
A ministra explicou os princípios usados pela Noruega para atuar como facilitadora de negociações sensíveis. Ela explicou, por exemplo, que seu país está em contato com o Hamas para condenar os ataques e trabalhar pela libertação de prisioneiros e reféns.
“Expressamos a eles a nossa condenação nos termos mais enfáticos, repudiando esses ataques e reforçando que os civis e reféns precisam ser libertados. Essa foi a nossa mensagem para o Hamas, de encerrar os ataques e a violência. Nós apoiamos o direito de Israel de se defender, mas os civis devem ser protegidos em ambos os lados. Manter a assistência humanitária é absolutamente crucial”, explicou a ministra, em entrevista exclusiva à CNN.
Além do cessar-fogo e liberação dos reféns, a Noruega defende que as prioridades sejam evitar que o conflito se estenda para a Cisjordânia e garantir que a assistência humanitária chegue àqueles que precisam. “Falei com vários ministros de Relações Exteriores na região nos últimos dias. Acredito que precisamos evitar a escalada do conflito e, em seguida, fortalecer a Autoridade Palestina. Se eles não forem capazes de entregar recursos às pessoas, temo que esse conflito possa se espalhar ainda mais”, explica.
Uma história de negociações de paz
A Noruega tem uma tradição de atuação pela paz e reconciliação. O país participou das mais diversas etapas de negociação entre israelenses e palestinos há décadas. Os Acordos de Oslo, por exemplo, são uma etapa concluída em 1993, assinada pelo então primeiro-ministro de Israel, Ithzak Rabin, e o principal negociador da Organização pela Liberação da Palestina, Mahmoud Abbas. No tratado, Israel reconhece a OLP como representante dos palestinos, enquanto a OLP renunciou à violência e reconheceu o direito de Israel à existência pacífica.
Apesar do acordo, o conflito recrudesceu nas décadas seguintes e o cenário se alterou dramaticamente. Ainda assim, a Noruega defende a estratégia de conversar com todos os lados. “Na Líbia, por exemplo, não haveria avanços se não tivéssemos contato com representantes da família Kadafi. Ao mesmo tempo que conversamos com eles, também éramos parte da coalizão. Sendo um país pequeno e imparcial, as partes entendem que não vamos pressioná-los e isso permite atuar como facilitadores. Nós assumimos o risco político de conversar com todos os lados, até mesmo aqueles que provavelmente seriam condenáveis.”
Huitfeldt também respondeu à reflexão sobre os desafios para um processo de paz. “Israel é diferente agora. A Palestina também é diferente. Não há eleições na Palestina há muito tempo e o campo político em Israel que defende a paz também tem diminuído. A política da polarização é algo que vimos não só nesses dois países, mas em muitos outros lugares nos últimos anos. Isso faz as coisas ficarem ainda mais sérias. É preciso vontade política para se envolver nas negociações de paz. É preciso coragem para assumir compromissos.”
Apesar dos desafios, a Noruega ainda tem a expectativa de que um processo de paz seja possível na região. A formação de novas coalizões dentro de Israel abre uma oportunidade para posturas mais construtivas. A normalização de relações com a Arábia Saudita também abre caminho para que o país tenha esperanças sobre as negociações.