Macron e Le Pen: o que você precisa saber sobre o 2º turno das eleições na França
Embora já tenham se enfrentado no segundo turno em 2017, nova disputa acontece diante de cenários e previsões muito diferentes
Macron e Le Pen irão disputar o segundo turno das eleições na França, o que também pode ser visto como um “segundo round”. A eleição presidencial francesa será uma revanche da disputa de 2017, quando Marine Le Pen, da extrema direita, enfrentou o recém-chegado político Emmanuel Macron, que acabou vencendo a disputa.
Mas enquanto os candidatos permanecem os mesmos, a corrida de 2022 está se tornando um assunto muito diferente. Confira tudo o que você precisa saber.
Como funciona a eleição?
Para eleger seu novo presidente, os eleitores franceses vão às urnas duas vezes.
Na primeira votação, no último domingo (12), candidatos concorreram entre si. Eles se qualificaram para a corrida garantindo o endosso de 500 prefeitos e/ou conselheiros locais de todo o país.
Macron e Le Pen receberam o maior número de votos, mas como nenhum deles ganhou mais de 50%, eles vão para um segundo turno, que também será em um domingo, no dia 24 de abril.
Esta não é a única votação nacional que a França enfrenta este ano – as eleições parlamentares deverão ocorrer em junho.
Quais são as datas mais importantes?
Macron e Le Pen realizarão um debate na noite da próxima quarta-feira (20), que será transmitido pelas emissoras francesas France 2 e TF1.
Já o segundo turno das eleições ocorrerá no domingo, 24 de abril. Os candidatos não podem fazer campanha no dia anterior à votação, ou no próprio dia da eleição, e a mídia estará sujeita a restrições rigorosas de reportagem desde o dia anterior à eleição até o fechamento das urnas.
O que as pesquisas mostram?
Uma disputa muito mais acirrada do que a eleição de 2017.
Macron e Le Pen aumentaram sua participação total de votos no primeiro turno deste ano em comparação com 2017, mas pesquisas antes da primeira votação mostraram que Le Pen teve um aumento tardio de apoio em março.
A pesquisa do Ifop-Fiducial, divulgada em 10 de abril, sugere que Macron venceria uma disputa de segundo turno contra Le Pen por apenas 51% a 49%. A vantagem de Macron aumentou nos dias seguintes após a divulgação dos resultados do primeiro turno, mas duas semanas é muito tempo na política – e muita coisa pode mudar entre agora e o dia da eleição.
Analistas políticos costumam dizer que os franceses votam com o coração no primeiro turno, depois votam com a cabeça no segundo turno – o que significa que eles escolhem seu candidato ideal primeiro e depois optam pelo “menos pior” dos dois no segundo turno.
Macron viu isso acontecer em 2017. Ele e Le Pen obtiveram 24% e 21,3% dos votos no primeiro turno e depois 66,1% e 33,9% no segundo turno, respectivamente.
Para ser reeleito, Macron provavelmente precisará convencer os apoiadores do candidato de extrema esquerda Jean-Luc Melenchon a apoiá-lo. Melenchon ficou em terceiro lugar com 22% dos votos. No domingo, Melenchon disse a seus apoiadores que “não devemos dar um único voto à Sra. Le Pen”, mas não apoiou explicitamente Macron.
A maioria dos candidatos derrotados pediu a seus apoiadores que apoiem Macron para impedir que a extrema direita ganhe a presidência.
Eric Zemmour, um ex-comentarista político de direita conhecido por sua retórica inflamatória, pediu a seus apoiadores que apoiem Le Pen.
O que os franceses estão esperando?
O inesperado.
No início de 2022, a eleição parecia ser um importante referendo sobre a crescente popularidade da extrema direita francesa. Já se passaram 20 anos desde que um presidente francês foi reeleito, então a votação estava se tornando uma das corridas políticas mais assistidas do país em décadas.
Até que a Rússia invadiu a Ucrânia.
Com os olhos da Europa voltados para a sangrenta guerra do presidente russo, Vladimir Putin, as prioridades mudaram rapidamente: estoques de munição, diplomacia de alto risco e até a ameaça de um ataque nuclear entraram no debate nacional.
Macron assumiu o papel de estadista da Europa, afastando-o da campanha, enquanto Le Pen foi forçada a recuar em seu apoio anterior a Putin.
O que mais mudou nos últimos cinco anos?
O espectro político na França sofreu algumas alterações. A eleição de Macron explodiu efetivamente o centro tradicional da política francesa. Nos anos anteriores, muitos de seus eleitores teriam ido para os partidos tradicionais de centro-esquerda e centro-direita, os socialistas e os republicanos.
Mas a prefeita de Paris, Anne Hidalgo, a candidata socialista, e Valérie Pécresse, a candidata republicana, não conseguiram convencer os eleitores a abandonar o candidato centrista já no cargo. Ambos tiveram votações abaixo de 5% no primeiro turno.
O que mais preciso saber sobre Macron e Le Pen?
Emmanuel Macron é um ex-banqueiro de investimentos e ex-aluno de algumas das escolas de elite da França. Ele era um novato político antes de se tornar presidente, e esta é apenas a segunda eleição política que ele já participou.
Seu plano ambicioso para reforçar a autonomia e o peso geopolítico da União Europeia lhe rendeu respeito no exterior e em casa, embora suas tentativas de conquistar Donald Trump ou impedir o acordo submarino AUKUS, e seus esforços diplomáticos malsucedidos para evitar a guerra na Ucrânia possam ser considerados falhas.
As políticas domésticas de Macron são mais divisivas e menos populares. Seu manejo do movimento dos coletes amarelos, um dos protestos mais prolongados da França em décadas, foi amplamente criticado, e seu histórico na pandemia de Covid-19 é inconclusivo.
A política de Macron durante a crise sanitária – exigindo que as pessoas mostrem prova de vacinação para seguir suas vidas normalmente – ajudou a aumentar as taxas de vacinação, mas incitou uma minoria vocal contra sua presidência.
Antes do primeiro turno desta eleição, Macron se recusou a debater seus oponentes, e ele mal fez campanha. Embora sua pole position na corrida nunca tenha sido realmente ameaçada, especialistas acreditam que sua estratégia tem sido evitar a confusão política o máximo possível para manter o foco em sua imagem como o mais presidencial de todos os candidatos.
Marine Le Pen é a figura mais reconhecível da extrema direita francesa. Ela é filha de Jean-Marie Le Pen, que fundou a Frente Nacional, antecessora do atual partido político de Le Pen.
A jovem Le Pen tentou renomear o partido, pois há muito tempo a legenda é vista como racista e antissemita.
Esta é sua terceira tentativa de ocupar a presidência. Este ano e em 2017, ela superou seu pai no primeiro turno da votação.
Em 2017, Le Pen fez campanha como a versão francesa de Trump: uma incendiária de direita que prometeu proteger a classe trabalhadora esquecida da França dos imigrantes, da globalização e da tecnologia que estava tornando seus empregos obsoletos.
Desde então, ela abandonou algumas de suas propostas políticas mais controversas, como deixar a União Europeia.
Mas, em geral, sua postura econômica nacionalista, opiniões sobre imigração, ceticismo em relação à Europa e posição sobre o Islã na França – ela quer tornar ilegal o uso de lenços de cabeça em público – não mudaram. “Parar a imigração descontrolada” e “erradicar as ideologias islâmicas” são as duas prioridades de seu manifesto.
Le Pen, no entanto, tentou suavizar seu tom, especialmente em torno do Islã e da UE após o Brexit.
Em vez disso, ela fez campanha dura em questões econômicas, prometendo medidas que, segundo ela, colocarão de 150 a 200 euros (cerca de RS$ 762 a R$ 1.016) nos cofres de cada família, incluindo uma promessa de remover o imposto sobre vendas de cem bens domésticos.
A estratégia parece ter funcionado.
O desempenho de Le Pen no primeiro turno das eleições presidenciais de 2022 foi seu melhor resultado nas três vezes em que concorreu.
Quais são os maiores problemas para os eleitores franceses?
O custo de vida está entre as principais questões para o eleitorado francês este ano. Diante das consequências econômicas da pandemia, dos altos preços da energia e da guerra na Ucrânia, os eleitores estão sentindo o aperto, apesar do generoso apoio do governo.
Embora as pressões financeiras possam ser insuficientes para suavizar o extremismo de alguns candidatos na mente dos eleitores, elas podem levar alguns a buscar respostas pouco ortodoxas para seus problemas.
A luta na Ucrânia está muito longe dos bistrôs e cafés da França, mas o conflito certamente está na mente dos eleitores. Pouco menos de 90% dos franceses estavam preocupados com a guerra na última semana de março, segundo o Ifop. Dado o histórico irregular de seus adversários em enfrentar Putin, isso provavelmente jogou a favor de Macron até agora.
Notavelmente ausente do debate da primeira rodada foi a crise ambiental. Embora a importância das proteções climáticas esteja ganhando força globalmente, é menos preocupante na França, que obteve 75% de suas necessidades de eletricidade em 2020 da energia nuclear, de acordo com o Ministério do Meio Ambiente francês. A maioria dos candidatos no primeiro turno apoiou o tipo de desenvolvimento nuclear que Macron já anunciou, então há pouca divergência sobre essa questão.
No entanto, Macron e Le Pen brigaram sobre energia eólica e solar. Le Pen argumenta que os dois são caros e ineficientes – ela também diz que as turbinas eólicas marcaram a paisagem do campo francês tradicional – então ela quer acabar com os subsídios para ambos. Macron quer investir ainda mais em ambas as tecnologias.
As campanhas de Macron e Le Pen prometem duas visões muito diferentes para o futuro da França.
Macron promete continuar avançando com uma França globalizada e focada no livre mercado à frente de uma poderosa UE. Le Pen quer derrubar completamente o status quo com políticas econômicas protecionistas e uma reformulação do relacionamento de Paris com seus aliados e adversários.
Mas, no final, a eleição pode se resumir ao candidato que a França menos gosta: o presidente que é amplamente visto como elitista e fora de contato, ou a desafiante mais conhecida por sua retórica inflamada sobre o Islã e apoio a autoritários.