Inglaterra flexibiliza regras para doação de sangue de homens gays e bissexuais
Em termos práticos, a motivação é diminuir o déficit de aproximadamente 68 mil doadores masculinos nos bancos de sangue
Homens gays e bissexuais em relacionamentos monogâmicos poderão doar sangue na Inglaterra a partir de junho do ano que vem. A mudança na norma foi divulgada nesta segunda-feira (14) pelo Serviço Nacional de Saúde inglês. Segundo a instituição, a medida faz parte de uma campanha para “conter a perpetuação da desigualdade”. Em termos práticos, a motivação é outra: diminuir o déficit de aproximadamente 68 mil doadores masculinos nos bancos de sangue computados neste ano.
Além dos requisitos necessários mundiais (estar descansado e alimentado, ter peso mínimo de 50 kg e ter até 69 anos), os doadores homossexuais e bissexuais precisam seguir mais três pré-requisitos: estar num relacionamento monogâmico por mais de um ano, não usar remédios anti-HIV (como Prep, PEP ou NHSBT) e abstinência de sexo por três meses. No caso de mulheres gays e bissexuais nada muda: elas se submetem às mesmas regras de pessoas heterossexuais.
Por mais que ainda haja muitas barreiras pela total igualdade no país, este é considerado um avanço dos movimentos LGBTQI+. Até recentemente era necessário ficar em abstinência por, pelo menos, um ano. Retrocedendo um pouco mais, em 2011, bastava um homem ter tido uma única vez qualquer tipo de relação sexual com outro homem que a sua doação era invalidada.
Em outros países do Reino Unido, como a Irlanda do Norte, a mulher também era afetada pela regra: as mulheres que tiveram relação sexual com algum homem que algum dia teve uma relação sexual com outro homem precisaria entrar numa quarentena de um ano — independente se usaram ou não preservativos.
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E aqui no Brasil?
Em maio deste ano o Supremo Tribunal Federal (STF) considerou inconstitucional as restrições impostas a gays para doação de sangue de homossexuais. A Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa) teve de revogar o trecho de resolução que impedia que homens que tiveram relação sexual com outro homem pudessem doar sangue dentro do prazo de 12 meses após a relação sexual.
A ação foi ajuizada em 2016 pelo Partido Socialista Brasileiro (PSB) e começou a ser julgada em 2017. A Procuradoria-Geral da República (PGR) e da Ordem dos Advogados do Brasil, além de várias ONGs, apoiaram publicamente a revogação do prazo. No entanto, o julgamento teve de ser interrompido por um pedido de vista do ministro Gilmar Mendes e foi concluído apenas em 2020.
Por que é tabu a doação de sangue por homossexuais?
Esta é uma das heranças que a epidemia da Aids e HIV, nos anos 1980 e 1990, deixaram na sociedade. Neste período não havia testes para detectar a doença, então bancos de sangue criaram o chamado “grupo de risco para o HIV”, composto por gays, usuários de drogas injetáveis e hemofílicos.
A determinação não nasceu da discriminação, mas de um fato científico inconclusivo. Com as mortes de muitos homossexuais pela doença — incluindo alguns famosos como Cazuza e Renato Russo — começaram a associar o HIV com a orientação sexual. Levou alguns anos para a ciência provar que o problema não estava na orientação sexual, mas sim no sexo desprotegido. Isso significa que independente da orientação sexual é preciso dizer que a camisinha é fundamental para evitar a propagação do vírus do HIV.
Vale lembrar que atualmente os hemocentros estão mais modernos e as amostras de sangue são testadas para diversas doenças, incluindo o HIV e outras doenças sexualmente transmissíveis. Caso o doador tenha tido algum comportamento de risco antes da doação, a coleta é realizada, mas o sangue é descartado.