Hungria concede poder irrestrito a Orban
A lei, que pretende acelerar medidas contra o coronavírus, permite que primeiro-ministro prenda jornalistas por "fake news" sobre a pandemia
O parlamento da Hungria votou a favor da permissão para que o primeiro-ministro Viktor Orban governe com poder absoluto por tempo indeterminado. Sob o pretexto de reduzir a burocracia em meio a pandemia do novo coronavírus, a medida dá ao líder populista poderes especiais para aprovar unilateralmente uma série de medidas radicais.
A lei, que foi criticada por ativistas internacionais de direitos humanos, não tem prazo de validade e permite que Orban dispense a aprovação de outras instituições democráticas do país.
O texto foi aprovado nesta segunda-feira (30), com 138 votos a favor e 53 contra. Eram necessários dois terços de maioria. As permissões concedidas pela nova medida vão bem além das tomadas por outros membros da União Europeia em resposta ao surto da COVID-19.
A suspensão dos poderes do parlamento, a punição para jornalistas caso o governo acredite que suas notícias não são verdadeiras, e penalidades mais duras para aqueles que violarem as regras da quarentena são possibilidades concedidas para o primeiro-ministro com a nova lei. Eleições e referendos não podem acontecer enquanto ela estiver vigente.
Na última semana, em entrevista a rádio nacional Kossuth, Orban defendeu a extensão de seus poderes como uma forma de diminuir a perda humana na Hungria: “Nós não podemos reagir com rapidez se houverem debates e longos procedimentos legislativos e jurídicos. E em tempos de crise e epidemia, a capacidade de responder rapidamente pode salvar vidas.”
“O governo não está pedindo nada extraordinário”, completou o primeiro-ministro. “Ele está apenas pedindo a possibilidade de aprovar rapidamente certas medidas. Nós não queremos aprovar nada que o governo não tem o direito de aprovar – nós simplesmente queremos ser ágeis.”
Apesar dos argumentos do primeiro-ministro, a novidade alarmou diversos grupos estrangeiros. A Anistia Internacional alertou que a lei da ao governo de Orban “carta branca para restringir os direitos humanos.”
“Esta não é a maneira de lidar com a verdadeira crise causada pela pandemia de COVID-19”, declarou David Vig, o diretor da sucursal húngara da Anistia Internacional. “Nós precisamos de fortes barreiras para garantir que qualquer medida para restringir os direitos humanos adotada sob o estado de emergência respeita apenas o necessário e proporcional para proteger a saúde pública”, completou a autoridade em comunicado.
Uma das possibilidades mais polêmicas legalizadas pelo texto é a punição de até cinco anos de prisão para jornalistas ou cidadãos que disseminem “fake news” relacionadas à pandemia.
A passagem afirma que “uma pessoa que, durante o período da ordem especial e diante de um grande público, declare ou dissemine qualquer fato não verdadeiro, ou deturpado, que seja capaz de obstruir ou impedir a eficiência da proteção da população, é culpado de um delito grave e deve ser punido com um a cinco anos de prisão.”
Essa não é a primeira vez que Orban entra em rota de colisão com a União Europeia diante de possíveis atitudes autoritárias. A dura política imigratória da Hungria e a restrição do Governo Federal a outros poderes, incluindo instituições civis, criaram atritos entre o líder e outras autoridades do bloco, que possui regras claras de conduta comuns entre seus membros.
A nova lei deve criar um novo confronto entre os parceiros, com diversos políticos europeus – incluindo o ex-primeiro-ministro italiano Matteo Renzi – pedindo por uma resposta firme do bloco.
“Eu tenho sonhado com os ‘Estados Unidos da Europa’ por anos. Exatamente por essa razão, eu tenho o direito, e o dever, de dizer que depois do que Orban fez hoje a União Europeia DEVE agir e fazê-lo mudar de ideia. Ou simplesmente expulsar a Hungria da união”, escreveu Renzi em seu perfil no Twitter.
Sogno da anni gli Stati Uniti d'Europa. Ma proprio per questo ho il diritto, e il dovere, di dire che dopo quello che ha fatto Orban oggi l'Unione Europea DEVE battere un colpo e fargli cambiare idea. O, più semplicemente, cacciare l'Ungheria dall'Unione.
— Matteo Renzi (@matteorenzi) March 30, 2020