Situação em Gaza é “uma das maiores crises humanitárias da história recente”, diz Lula na ONU
Presidente brasileiro citou diferentes crises no mundo, mas não citou Venezuela
O presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) foi o primeiro chefe de Estado a discursar na 79ª sessão da Assembleia Geral da ONU nesta terça-feira (24). O evento é realizado na sede das Nações Unidas, em Nova York.
Por tradição, o Brasil é o primeiro país a tomar a palavra na cerimônia. Saiba mais através deste link.
Lula abordou os conflitos no Oriente Médio e na Ucrânia, criticando o crescente gasto com ativos militares mundialmente. O presidente pontuou que esses recursos poderiam ser utilizados para combate à fome e à mudança climática e que o “uso da força sem amparo no direito internacional está se tornando regra”.
Sobre a guerra no Oriente Médio, o petista ressaltou que, “em Gaza e na Cisjordânia, assistimos a uma das maiores crises humanitárias da história recente e que agora se expande perigosamente para o Líbano”.
Nos últimos dias, Israel tem realizado ataques contra o Líbano, que deixaram centenas de mortos e aumentaram a tensão por um conflito regional mais amplo.
Além disso, o país continua com a ofensiva na Faixa de Gaza, que deixou mais de 40 mil pessoas mortas, segundo autoridades palestinas.
“O que começou com ação terrorista de fanáticos contra civis israelenses inocentes se tornou uma punição coletiva do povo palestino”, afirmou Lula, adicionando que “o direito de defesa se tornou em direito de vingança”.
Já sobre a crise na Europa, o presidente brasileiro destacou que é crucial criar condições para que Ucrânia e Rússia retomem o diálogo direto. Ele pontuou que essa é a “mensagem” da proposta de Brasil e China para o conflito, que foi rejeitada por Volodymyr Zelensky.
“Na Ucrânia, é com pesar que vemos a guerra se estender sem perspectiva de paz. O Brasil condenou de maneira firme a invasão do território ucraniano. Já está claro que nenhuma das partes conseguira atingir todos os seus objetivos pela via militar”, comentou.
Lula citou ainda o que chamou de “conflitos esquecidos” no Sudão e no Iêmen.
“Em tempos de crescente polarização, expressões como ‘desglobalização’ se tornaram corriqueiras. Mas é impossível ‘desplanetizar’ nossa vida em comum”, observou.
Lula aborda Cuba e Haiti, mas não cita Venezuela
Durante o discurso na Assembleia Geral, o presidente também criticou sanções contra Cuba, ressaltando que “é injustificado manter Cuba em uma lista unilateral de Estados que supostamente promovem o terrorismo e impor medidas coercitivas unilaterais, que penalizam indevidamente as populações mais vulneráveis”.
Ele também comentou sobre o Haiti, que passa por uma forte crise de segurança, pontuando que é “inadiável” restaurar a ordem pública e promover o desenvolvimento no país.
Ainda assim, Lula não citou a Venezuela, que vive uma crise após as eleições presidenciais de julho, que são contestadas pela oposição e diversas nações e organizações internacionais.
Nicolás Maduro foi proclamado vencedor do pleito, mas a oposição acusa o governo venezuelano de fraude. Até o momento, não foram divulgados resultados detalhados da votação.
O candidato que disputou a Presidência com Maduro, Edmundo González, deixou o país e buscou asilo na Espanha.
“Estado sustentável não se intimida”
O presidente Lula também disse durante o discurso que indivíduos, corporações ou plataformas não estão acima da lei. No comentário, Lula não citou diretamente o X, que está suspenso no Brasil após descumprir decisões judiciais.
“O futuro de nossa região passa, sobretudo, por construir um Estado sustentável, eficiente, inclusivo e que enfrenta todas as formas de discriminação. Que não se intimida ante indivíduos, corporações ou plataformas digitais que se julgam acima da lei”, disse.
“A liberdade é a primeira vítima de um mundo sem regras. Elementos essenciais da soberania incluem o direito de legislar, julgar disputas e fazer cumprir as regras dentro de seu território, incluindo o ambiente digital”, adicionou.
Antes disso, Lula pontuou que a defesa da democracia no Brasil demanda ações contra investidas “extremistas, messiânicas e totalitárias”.
“No mundo globalizado, não faz sentido recorrer a falsos patriotas e isolacionistas”, observou.
Reforma da ONU
Lula voltou a defender uma reforma na ONU e no Conselho de Segurança, chamando a atenção de que o comando do secretariado-geral da organização nunca foi ocupado por uma mulher.
Assim, observou que a ONU está cada vez mais “esvaziada e paralisada”, citando os seguintes objetivos:
- transformação do Conselho Econômico e Social no principal foro para o tratamento do desenvolvimento sustentável e do combate à mudança climática, com capacidade real de inspirar as instituições financeiras.
- revitalização do papel da Assembleia Geral, inclusive em temas de paz e segurança internacionais.
- fortalecimento da Comissão de Consolidação da Paz.
- reforma do Conselho de Segurança, com foco em sua composição, métodos de trabalho e direito de veto, de modo a torná-lo mais eficaz e representativo das realidades contemporâneas.
O petista disse ainda que não haver assentos permanentes para países da América Latina e da África no Conselho de Segurança é “um eco inaceitável de práticas de dominação do passado colonial”.
“Não podemos esperar por outra tragédia mundial, como a Segunda Grande Guerra, para só então construir sobre os seus escombros uma nova governança global”, finalizou.
Crise climática e fome
O presidente brasileiro também falou sobre a crise climática e a fome, ressaltando que o negacionismo “sucumbe” ante as evidências do aquecimento global.
“O planeta já não espera para cobrar da próxima geração e está farto de acordos climáticos não cumpridos. Está cansado de metas de redução de emissão de carbono negligenciadas e do auxílio financeiro aos países pobres que não chega”, advertiu.
Ele citou os incêndios florestais que o Brasil enfrenta, as enchentes no Rio Grande do Sul e a estiagem na Amazônia.
Neste trecho do discurso, ele também destacou o combate ao garimpo ilegal e ao crime organizado.
“É hora de enfrentar o debate sobre o ritmo lento da descarbonização do planeta e trabalhar por uma economia menos dependente de combustíveis fósseis”, alertou.
Sobre a fome, Lula disse que o mundo produz quantidade suficiente de alimentos para erradicá-la e que o principal motivo deste problema são as escolhas políticas.
Em outro momento, o chefe de Estado brasileiro voltou a defender a taxação dos super-ricos e padrões mínimos de tributação global.
Inteligência Artificial
Lula comentou também sobre Inteligência Artificial, alertando para sua concentração em um número pequeno de empresas e pessoas.
Assim, ressaltou que essa tecnologia deve ser emancipadora e que respeite os direitos humanos, proteja dados pessoais e promova a integridade da transformação.
Por fim, pediu que a IA seja uma ferramenta para a paz, não para a guerra.
O que é a Assembleia Geral da ONU?
A Assembleia Geral da ONU é o principal órgão de formulação de políticas da organização.
A assembleia ocupa “uma posição central como o principal órgão deliberativo, de formulação de políticas e representativo das Nações Unidas”, segundo a própria instituição.
Além disso, desempenha um papel importante para o desenvolvimento da lei internacional.