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    Democratas dos EUA temem impacto da economia nas eleições de meio de mandato

    Na véspera das eleições de meio de mandato nos Estados Unidos, a preocupação econômica ofusca questões como aborto e riscos à democracia

    Stephen Collinsonda CNN

    Os democratas encerraram sua campanha eleitoral de meio de mandato nesta segunda-feira (7) enfrentando o pesadelo que temiam: com os republicanos fazendo um referendo sobre as dificuldades do governo de Joe Biden e sua incapacidade de controlar a inflação.

    A esperança que os democratas usariam o fato da Suprema Corte americana ter anulado a decisão judicial que permitia o amplo acesso ao aborto no país, ou a enxurrada de vitórias legislativas para impedir a clássica derrota do partido que está no poder nas eleições de meio de mandato, não passa agora de uma lembrança. Biden enfrenta um ambiente político sombrio por conta do custo de vida mais alto em 40 anos – e sua esperança de uma rápida recuperação no ano que vem foi ofuscadas pelo crescente temor de uma recessão.

    Na véspera das eleições, os democratas correm o risco de perder o controle da Câmara, e os republicanos estão cada vez mais esperançosos em obter a maioria do Senado, algo que deixaria Biden sob ataque ao iniciar sua campanha pela reeleição, e com o ex-presidente Donald Trump aparentemente pronto para anunciar, em poucos dias, sua própria campanha para retornar à Casa Branca.

    Ainda é cedo para falar definitivamente. Quarenta milhões de americanos já votaram. Mas a incerteza das pesquisas atuais mostra que ninguém pode garantir que haverá uma onda vermelha, cor que representa o partido Republicano. Os democratas ainda podem manter o controle do Senado, mesmo que percam a maioria na Câmara.

    Mas a forma como cada lado está falando na véspera das eleições e a faixa de território azul, cor que representa o partido Democrata – de Nova York ao estado de Washington – que os democratas estão defendendo pintam uma imagem clara do ímpeto do partido Republicano.

    Uma nação politicamente dividida ao meio, unida apenas por um sentimento de insatisfação com sua trajetória, e que está se habituando a usar as eleições para punir o partido com mais poder.

    Isso significa que, desta vez, os democratas estão mais expostos.

    Se o partido do presidente sofrer uma derrota, haverá muitos democratas culpando a estratégia de Biden para conter a inflação – uma força nociva que causou um rombo em milhões de orçamentos familiares.

    Assim como na corrida para o governo do estado da Virgínia no ano passado, onde o presidente ganhou por 10 pontos em 2020, os democratas estão encerrando a campanha com um alerta sobre a democracia e a influência de Trump, enquanto os republicanos acreditam estar tocando na questão que mais importa para os eleitores.

    “É assim que os democratas estão: em negação sobre a inflação, em negação sobre a criminalidade, em negação sobre a educação”, disse no domingo (6) a presidente do Comitê Nacional Republicano, Ronna McDaniel, no programa “State of the Union”, da CNN.

    Hilary Rosen, uma consultora democrata de longa data, disse no mesmo programa que seu partido havia julgado mal o estado de espírito do eleitorado.
    “Sou uma democrata fiel, mas não estou feliz. Acho que não ouvimos os eleitores nestas eleições. E acho que vamos ter uma noite ruim”, disse Rosen à Dana Bash, da CNN.

    “Essa conversa não terá muito impacto no resultado na terça-feira (8), mas espero que tenha no futuro, pois quando os eleitores afirmam repetidamente que se preocupam principalmente com a economia, é preciso ouvir. Parem de falar que a democracia está em jogo.”

    Porém, Rosen não é a única figura à esquerda insatisfeita com a estratégia de meio de mandato. Bernie Sanders, senador independente de Vermont e ex-candidato à presidência, insistiu que a Casa Branca deveria se esforçar mais para enfatizar as questões econômicas nas últimas semanas, embora reconheça a crise da democracia e a importância do direito ao aborto. Em retrospecto, parece que os democratas demoraram para perceber que o período favorável do meio do ano (que contou com uma queda nos preços da gasolina e uma onda de aprovação de leis para o presidente) não duraria o suficiente para compensar um ambiente político desastroso causado pela economia.

    O duro alerta de Biden sobre a democracia

    Com efeito, a ênfase de Biden na ameaça representada por Trump às instituições políticas dos EUA basicamente pede aos eleitores que priorizem o fundamento histórico do sistema político americano e não seus próprios receios econômicos mais imediatos.

    É uma mensagem que encontra forte ressonância em Washington, onde as cicatrizes da invasão ao Capitólio dos EUA são muito sensíveis. Além disso, é inegavelmente importante, pois a sobrevivência da democracia mais importante do mundo está em jogo. Afinal, Trump incitou uma insurreição que tentou impedir a tradição de transferência pacífica de poder entre presidentes.

    No entanto, fora da bolha de políticos e jornalistas, a democracia parece um conceito muito mais distante e esotérico do que a batalha diária para alimentar uma família e poder se deslocar para o trabalho. Da Pensilvânia ao Arizona, o retorno à normalidade que Biden prometeu após o pesadelo da Covid-19 permanece evasivo para muitos, pois os efeitos econômicos após essa emergência sanitária inédita ainda persistem.

    A situação política quase impossível para os democratas foi exposta em uma pesquisa da CNN/SSRS divulgada na semana passada. Cerca de 51% dos prováveis eleitores disseram que a economia era a questão-chave na definição de seu voto. Apenas 15% citaram o aborto – fato que explica como o campo de batalha eleitoral se inclinou a favor do partido Republicano. Entre os eleitores para os quais a economia é a principal preocupação, 71% planejam votar nos republicanos em seu distrito da Câmara dos Representantes. E, dos eleitores ouvidos, 75% acham que a economia já está em recessão, o que significa que os esforços de Biden para enfatizar um forte desempenho em muitas áreas – incluindo uma taxa de desemprego historicamente baixa – entrarão por um ouvido e sairão pelo outro.

    Como Biden falou sobre a economia

    É muito simples dizer que Biden ignorou o impacto da inflação, ou que não entende a dor que ela está infligindo ao país.

    A premissa de sua presidência e de toda a sua carreira política tem se baseado em restaurar o equilíbrio da economia e a segurança para os trabalhadores e a classe média. Seus sucessos legislativos poderiam reduzir os custos de saúde para os idosos e criar uma economia verde diversificada que protegeria os americanos de futuras altas nos preços de energia em meio a uma turbulência global, mas os benefícios de tais medidas levarão anos para serem vistos. Milhões de eleitores estão sofrendo agora e não ouviram do presidente um plano viável para reduzir os preços no curto prazo.

    Nada garante que os planos dos republicanos de estender os cortes de impostos da era Trump teria muito impacto sobre a crise inflacionária. Um governo dividido provavelmente significaria um impasse entre duas visões econômicas conflitantes. Mas as eleições se transformaram em um veículo para os eleitores demonstrarem sua frustração, sem nenhuma esperança de que as coisas melhorem em breve.

    Biden optou por destacar pontos positivos da economia – alegando a reativação da indústria, a grande criação de empregos e um esforço robusto para concorrer com a China. Ele agora alerta que os republicanos cortariam a previdência social e o Medicare, programas dos quais muitos americanos dependem na aposentadoria.

    E, na prática, não há muito que um presidente possa fazer por conta própria para rapidamente reduzir a inflação. O Federal Reserve, banco central dos EUA, está à frente disso, e sua estratégia de aumentar as taxas de juros pode desencadear uma recessão capaz de assombrar ainda mais a presidência de Biden.

    A inflação e os altos preços de combustível também são uma questão mundial, agravada por fatores além do controle de Biden, incluindo a guerra na Ucrânia e os problemas de abastecimento causados pela pandemia. Ao mesmo tempo, contudo, economistas discutem a coerência dos projetos de lei de altos gastos promovidos por Biden, que injetaram bilhões de dólares em uma economia superaquecida. Além disso, a insistência da Casa Branca em chamar o crescente custo de vida de “transitório” foi uma leitura incorreta da situação e outro fator que afetou a credibilidade de Biden – além da perda da confiança de alguns eleitores após a saída dos EUA do Afeganistão, no ano passado.

    O Partido Republicano também conseguiu o que queria, já que Trump adiou o esperado anúncio de sua campanha para depois da corrida eleitoral, privando Biden da oportunidade de moldar essas eleições como um confronto direto com seu antecessor e ‘incitador-chefe’ da invasão ao Capitólio, que ele derrotou em 2020 e que permanece largamente impopular. Tal confronto teria permitido ao presidente aliviar o impacto de seus baixos índices de aprovação e conquistar eleitores que ainda desprezam o ex-presidente, que já passou por dois processos de impeachment.

    Ironicamente, a dificuldade de Biden em transmitir uma mensagem econômica aceitável poderia gerar a própria crise da democracia que ele vem anunciando.

    Qualquer maioria do partido Republicano seria dominada por radicais pró-Trump. Os futuros presidentes de comitês já sinalizaram que farão o possível para desviar a atenção da culpabilidade de Trump na insurreição no dia 6 de janeiro de 2021 e ir atrás do Departamento de Justiça, enquanto este prossegue com diversas investigações criminais sobre a conduta do ex-presidente. Ademais, o pleito de terça-feira (8) pode eleger dezenas de negacionistas eleitorais em cargos estaduais, que podem acabar controlando a corrida presidencial de 2024 em alguns dos principais campos de batalha. O domínio do partido Republicano nas legislaturas estaduais poderia reduzir ainda mais os direitos de voto.

    A inflação sempre foi uma força que gera extremismo político e instiga alguns eleitores a serem atraídos por demagogos e radicais, cujas crenças políticas se baseiam no ressentimento e na estigmatização de pessoas de fora.

    Se os democratas perderem de lavada na terça à noite, Trump será beneficiado.

    Este conteúdo foi criado originalmente em inglês.

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