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    Congresso dos EUA terá um número recorde de mulheres

    Com os números finais da eleição ainda em aberto, sabe-se que pelo menos 141 mulheres se elegeram para o Congresso no próximo ano, quebrando o recorde de 2018

    Alexandria Ocasio-Cortez, de 31 anos: a deputada criou um exército de apoiadores leais em todo o país e foi reeleita em 2020
    Alexandria Ocasio-Cortez, de 31 anos: a deputada criou um exército de apoiadores leais em todo o país e foi reeleita em 2020 Foto: Reprodução - 15.jul.2019 / Reuters

    Simone Pathe, Renée Rigdon and Janie Boschma, da CNN

    Um dia depois de o Primeiro Distrito da Carolina do Sul, com forte tradição republicana, virar democrata (azul) em 2018, a filha de Nancy Mace, então com 9 anos, fez uma pergunta.

    “Ei, mamãe, quando vamos reconquistar essa cadeira?”, ela quis saber. Mace, republicana, tinha acabado de ganhar a reeleição para a assembleia estadual naquela eleição – mas a pergunta da filha era sobre a cadeira na Câmara Federal que o partido acabara de perder.

    Na semana passada, Mace, adora candidata a deputada federal, derrotou o candidato democrata Joe Cunningham e é uma a mais no grupo recorde de mulheres que servirão no 117º Congresso dos EUA – e também do grupo recorde de mulheres republicanas que servirão na casa.

    Com os números finais da eleição ainda em aberto, sabe-se até agora que pelo menos 141 mulheres se elegeram para o Congresso no próximo ano, quebrando o recorde de 127 estabelecido em 2018, segundo dados do Centro para Mulheres e Política Americanas da Universidade Rutgers. 

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    Isso inclui pelo menos 116 mulheres na Câmara (quebrando o recorde de 102 também estabelecido em 2019) e 25 no Senado, embora esse número possa diminuir com ascensão da senadora Kamala Harris da Califórnia à vice-presidência.

    O total na Câmara inclui uma mulher do 2º Distrito de Iowa, onde duas mulheres estão competindo por uma vaga, mas, como a CNN ainda não deu o resultado final da disputa, não se sabe qual partido representará o distrito.

    Quatro das nove mulheres republicanas no Senado estavam sob risco de perderem os assentos nas eleições deste ano, mas apenas a senadora do Arizona Martha McSally foi derrotada. O destino da senadora Kelly Loeffler será determinado em um segundo turno em janeiro.

    A única mulher eleita para um primeiro mandato no Senado é uma republicana: a ex-deputada Cynthia Lummis, do Wyoming.

    O Congresso terá pelo menos seis novas mulheres não brancas (quatro democratas e duas republicanas), incluindo as democratas Cori Bush, que será a primeira congressista negra do Missouri, e Nikema Williams, eleita para a cadeira do falecido deputado John Lewis, na Geórgia. Com base nos números já fechados pela CNN, haverá pelo menos mais duas mulheres negras do que havia no 116º Congresso – pelo menos 50 delas foram vitoriosas. 

    Mas a maioria das 24 mulheres que chegarão ao Congresso em janeiro são brancas, incluindo 13 republicanas e cinco democratas. Pelo menos 91 mulheres brancas servirão no 117º Congresso, contra 79 neste ano.

    O sucesso das republicanas na Câmara

    A tendência ascendente das mulheres em geral na Câmara é uma história bipartidária. As mulheres democratas foram as principais responsáveis pela virada da Câmara em 2018, estabelecendo um novo recorde ao eleger 35 novas deputadas. Este ano, porém, foram as mulheres republicanas que tiveram ganhos significativos. Depois de eleger apenas uma nova deputada republicana para a Câmara em meio de mandato, em 2018, os republicanos este ano elegeram pelo menos 15 novas mulheres.

    Isso significa que o número de mulheres republicanas na Câmara pelo menos dobrará. Atualmente, há apenas 13 mulheres na conferência do Partido Republicano na Câmara, e duas delas não concorreram à reeleição. Os democratas estão adicionando nove novas mulheres, aumentando seu número para 89 por enquanto.

    “As mulheres republicanas ainda são um grupo de pouca representação”, observou Kelly Dittmar, diretora de pesquisa do Centro para Mulheres e Políticas Americanas. “Em 2020, porém, elas compensaram as perdas”, acrescentou ela, observando que dois anos atrás havia apenas 23 mulheres republicanas.

    Enquanto as mulheres democratas há muito são incentivadas pelo grupo pró-aborto Emily’s List, os republicanos carecem de infraestrutura comparável para investir em candidatas do sexo feminino. Também houve uma oposição ideológica durante as primárias, especialmente no tema das políticas de identidade.

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    Essa atitude, pelo menos, começou a mudar depois de 2018, quando a deputada de Nova York Elise Stefanik – que havia recrutado mais de 100 mulheres para o braço de campanha do Partido Republicano na Câmara e só viu uma delas vencer – soou o alarme publicamente.

    Ela relançou sua liderança no PAC (Comitê de Ação Política) com o único propósito de entrar nas primárias para ajudar as mulheres, o que o presidente do Comitê Nacional Republicano do Congresso chamou de “um erro” na  ocasião.

    Mas, embora o comitê de campanha ainda não participe das primárias, a liderança reconheceu que tinha que fazer mais para eleger candidatos com diversidade, apoiando outra mulher, a deputada Susan Brooks, como chefe de recrutamento para 2020.

    Mas, de longe, o maior motivo para esse sucesso é que mais mulheres republicanas do que nunca se levantaram para concorrer – em parte porque viram o que as mulheres democratas fizeram em 2018 – e um número maior delas venceu as primárias, que tradicionalmente têm sido o maior obstáculo.

    “Mulheres em todo o país viram outras mulheres antes delas terem sucesso e perceberam que também podiam fazer isso”, explicou a deputada eleita do Partido Republicano de Iowa Ashley Hinson, que na semana passada derrotou a deputada democrata Abby Finkenauer, uma das mulheres que revolucionou um distrito em 2018.

    “Foi a tempestade perfeita. Tínhamos cadeiras competitivas que podiam ser conquistadas e mulheres incríveis nesses distritos com experiência legislativa anterior e que sabiam como montar uma campanha”, detalhou Julie Conway, diretora executiva do PAC VIEW (ou Value in Electing Women, Valor em Eleger Mulheres), que tem ajudado a conquistar vagas para mulheres republicanas no Congresso desde 1997.

    Assim como as democratas fizeram em 2018, as republicanas este ano estavam bem posicionadas para aproveitar as vantagens de um ambiente favorável. “A única maneira de isso acontecer seria se fosse um ano melhor do que o esperado para os republicanos, e eu acho que foi”, contou Dittmar sobre os ganhos que as mulheres do Partido Republicano foram capazes de fazer.

    “Ser a primeira mulher republicana eleita para o Congresso no estado da Carolina do Sul é algo que traz um enorme senso de humildade”, disse Mace. “Isso me lembra que as democratas não detêm o monopólio de quebrar as barreiras para as mulheres”.

    Novas vozes no Congresso

    Mesmo com as mulheres batendo recordes no Congresso, elas provavelmente representarão pouco mais de um quarto do poder legislativo. Os obstáculos permanecem, tanto para mulheres concorrendo quanto vencendo.

    Candidatas costumam receber perguntas que seus colegas homens não recebem, como por exemplo quem vai cuidar de seus filhos. Para Hinson, fazer campanha de porta em porta em seu distrito de Iowa foi um momento para refletir sobre a decisão de se candidatar em primeiro lugar. “Uma senhora achou que eu deveria estar em casa com meus filhos. E eu basicamente disse: ‘Bem, estou dando um bom exemplo para eles’”.

    As mulheres eleitas concordam que as perspectivas que trazem ao Congresso são desejadas. E necessárias.

    “Eles me escolheram desta vez, eles sabem que eu sou uma mãe, eu dirijo uma minivan, sabe, tenho uma vida normal aqui em Iowa”, contou Hinson, uma deputada estadual e ex-jornalista que acredita que suas habilidades de comunicação vão ajudá-la no Congresso.

    A deputada eleita Carolyn Bourdeaux, a única democrata que até agora conquistou um distrito disputado pelo Partido Republicano este ano, ganhou nos subúrbios do nordeste de Atlanta. A região agora é o epicentro do campo de batalha político, com a maioria do Senado dependente de duas cadeiras no Senado da Geórgia, a serem decididas no segundo turno em janeiro.

    Professora e ex-diretora de orçamento do senado estadual da Geórgia, Bourdeaux concorreu pela primeira vez há dois anos, obtendo 433 votos a menos em uma recontagem contra o titular do Partido Republicano, que decidiu não concorrer novamente em 2020. “Muitas pessoas aqui nem sabiam que havia democratas em sua vizinhança”, disse, lembrando o trabalho de base para a eleição.

    “Muitas mulheres foram muito afetadas por Donald Trump, e suas preocupações sobre os rumos do país e a perda de direitos realmente básicos, como os direitos reprodutivos, de repente estavam nas urnas de uma forma que não existia antes. Então, ser mulher, eu acho, foi útil para falar sobre essas questões”, disse Bourdeaux.

    Mace, a republicana da Carolina do Sul, encontra-se no extremo oposto do espectro político, mas ela também deseja trazer sua perspectiva para a Câmara.

    Depois de abandonar o ensino médio, ela trabalhou como garçonete na rede Waffle House. Em 1996, a falecida juíza da Suprema Corte Ruth Bader Ginsburg escreveu uma decisão que exigia que o Instituto Militar da Virgínia, uma escola financiada pelo estado, mais conhecida como Cidadela, aceitasse mulheres. “Essa decisão mudou literalmente minha vida”, disse Mace, que se tornou a primeira mulher a se formar na Cidadela.

    “O primeiro ano na Cidadela foi muito parecido com a disputa ao Congresso”, disse ela, observando os desafios e a importância de ambas as conquistas – e a forma como o gênero impactou sua experiência.

    “Quer dizer, a gente pode ser durona, mas não pode ser uma mulher difícil, certo? Há um limite aí, como candidata, que você só pode ser dura antes de cruzar essa linha e as pessoas começarem a julgá-la de uma maneira diferente”.

    Como legisladora estadual, Mace ganhou manchetes por falar publicamente sobre sua própria experiência de estupro ao defender uma emenda a uma medida antiaborto que incluiria exceções para estupro e incesto.

    “A habilidade de se levantar contra membros de seu próprio partido, mesmo contra a liderança, especialmente agora mais do que nunca, é mais importante para os eleitores”, opinou.

    Olhando para a frente

    Muitas das mulheres republicanas que venceram este ano estavam em distritos competitivos. Os republicanos conquistaram oito cadeiras mantidas pelos democratas, de acordo com as projeções da CNN até agora, e as mulheres conquistaram todas as vitórias, exceto uma. Isso significa que elas deverão enfrentar reeleições difíceis no futuro, possivelmente contra mulheres democratas.

    Isso preocupa Conway, do PAC VIEW, que teme que as mulheres democratas e republicanas continuem se eliminando nas cadeiras mais competitivas a cada dois anos. “A ideia de ter ‘assentos femininos’ não nos deixa mais perto da paridade”, disse ela.

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    Um recorde de 643 mulheres concorreu ao Congresso em 2020, sendo 583 para a Câmara e 60 para o Senado. Isso é o dobro do número de mulheres que concorreram em 2016, embora ainda não tenha se traduzido para o dobro de lugares.

    O fato ocorre em parte porque, à medida que mais mulheres se candidatam, elas também concorrem mais umas contra as outras, tanto nas primárias quanto nas eleições gerais.

    Em 2016, as mulheres concorreram umas contra as outras em 17 disputas eleitorais na Câmara e no Senado, de acordo com dados do Centro para Mulheres e Políticas Americanas. Em 2020, isso cresceu para 51 corridas com mulheres desafiando umas às outras.

    Tradicionalmente, a maneira mais segura de as mulheres republicanas manterem e aumentarem suas patentes é eleger mais mulheres para lugares seguros. Pelo menos cinco deputadas venceram este ano nas cadeiras classificadas como sólido terreno republicano, de acordo com o Inside Elections de Nathan L. Gonzales, um colaborador da CNN.

    A resposta? Encorajar ainda mais mulheres a concorrer.

    “Já recebi mensagens de outras mulheres interessadas em concorrer aqui em Iowa desde a eleição da semana passada”, contou Hinson, que elogiou a orientação que recebeu de outras mulheres em cargos eleitos, bem como de grupos externos como o Winning for Women e o VIEW. Por causa da pandemia, os grupos faziam chamadas regulares pelo Zoom para que seus candidatos pudessem se conhecer.

    (Hinson continuará a conhecer seus novos colegas virtualmente, já que testou positivo para a Covid-19 e não participou da sessão de orientação para novos deputados nesta semana em Washington, DC.)

    Mas ajudar uns aos outros nem sempre é natural, disseram alguns. “As mulheres são muito piores com outras mulheres do que com seus colegas homens”, reconheceu Mace, refletindo sobre sua experiência na Cidadela, nos negócios e na política. “As mulheres não gostam de ver outras tendo sucesso.”

    “Sinto que ficou melhor com o passar dos anos, mas vejo isso com frequência, e é verdade em ambos os lados. É por isso que estou sempre incentivando as mulheres a concorrer”.

    (Texto traduzido, clique aqui para ler o original em inglês)