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    COP27

    Compensação para países em desenvolvimento afetados pelo clima é tema na COP27

    Entenda o conceito de "perdas e danos", que defende a criação de um fundo para que países ricos com maior emissão de gases ajudem financeiramente os países pobres mais afetados pela mudança climática

    Enchente em Nowshera, no Paquistão
    Enchente em Nowshera, no Paquistão 30/8/2022 REUTERS/Fayaz Aziz

    Rachel Ramirezda CNN

    Aftab Khan se sentiu impotente quando as águas torrenciais de uma enchente submergiram um terço do Paquistão, seu país natal.

    A cidade na qual Khan nasceu estava completamente debaixo d’água. Seu amigo resgatou uma mulher que andava descalça, carregando seu filho doente, pela água parada por 24 quilômetros. E a própria mãe de Khan, que agora mora com ele em Islamabad, não conseguiu viajar para casa por conta de estradas alagadas para verificar se sua filha estava a salvo.

    “Essas são histórias comoventes, são histórias reais”, disse Khan, consultor internacional de mudanças climáticas, à CNN. “Fiquei com o coração partido.”

    O Paquistão se tornou o exemplo mais claro este ano de por que alguns países estão lutando por um chamado fundo de “perdas e danos”. O conceito se refere a ideia de que os países que mais contribuíram para a mudança climática com suas emissões de gases de efeito estufa deveriam pagar aos países mais pobres para poderem se recuperar dos desastres resultantes do aquecimento global.

    No início deste ano, o Paquistão cozinhou sob uma onda de calor mortal, fenômeno que a mudança climática tornou 30 vezes mais provável de acontecer, segundo a Organização Meteorológica Mundial. Agora, o país está se recuperando das consequências das piores inundações de que se há memória.

    O país do sul da Ásia é responsável por menos de 1% das emissões de gases de efeito estufa do planeta, mas está pagando um preço alto. E há muitos outros países como este ao redor do mundo.

    O conceito de “perdas e danos” estará no centro das atenções durante a COP27 em Sharm el-Sheikh, no Egito, este ano, já que os países com baixa emissão de gases sofrendo com enchentes ou vendo suas ilhas afundarem no oceano estão exigindo que os países desenvolvidos e com altas emissões paguem por esses danos.

    No entanto, isso é uma questão controversa há anos, já que países ricos como os Estados Unidos temem que concordar com um fundo de perdas e danos possa abrir brecha para a responsabilização legal e possíveis ações judiciais futuras.

    Ativistas climáticos de países em desenvolvimento e um ex-funcionário do alto escalão do clima nos EUA disseram à CNN que o tempo está se esgotando, apontando os desastres em cascata no Paquistão como a evidência mais clara do porquê um fundo dedicado a perdas e danos é necessário.

    Os países em desenvolvimento “não estão preparados para se proteger, se adaptar e serem resilientes” aos desastres climáticos, disse a ex-assessora climática da Casa Branca Gina McCarthy à CNN. “É responsabilidade do mundo desenvolvido auxiliar neste esforço. Compromissos foram feitos, mas não estão sendo cumpridos.”

    O que é o conceito de “perdas e danos”?

    Como conceito, “perdas e danos” se refere à ideia de que os países ricos, que emitiram os gases que aquecem o planeta, deveriam pagar os países mais pobres que agora sofrem com desastres climáticos que eles não criaram.

    Perdas e danos não é uma questão nova. Os países em desenvolvimento e as pequenas ilhas vêm fazendo pressão por esse tipo de fundo desde 1991, quando a ilha de Vanuatu, no Pacífico, propôs pela primeira vez um plano para que os países com alta emissão canalizem dinheiro para aqueles mais afetados pelo aumento do nível do mar.

    Demorou mais de uma década para que a proposta ganhasse força, mesmo que Vanuatu e outras pequenas nações insulares do Pacífico estejam desaparecendo lentamente.

    Em Fiji, a ilha natal do ativista climático Lavetanalagi Seru, a realocação de comunidades por conta do aumento do nível do mar custou uma média de US$ 1 milhão. Sair de terras ancestrais não é uma decisão fácil, mas as mudanças climáticas estão causando impactos irreversíveis nas ilhas, disse Seru, coordenador regional de políticas da Rede de Ação Climática das Ilhas do Pacífico.

    “As mudanças climáticas estão ameaçando os próprios tecidos sociais de nossas comunidades do Pacífico”, disse Seru. “É por isso que esses fundos são necessários. Esta é uma questão de justiça para muitos pequenos estados e países insulares em desenvolvimento como os do Pacífico”.

    Por que “perdas e danos” é um conceito controverso?

    Uma das principais razões pelas quais esse tipo de fundo é controverso é porque os países ricos se preocupam que o pagamento possa ser visto como uma forma de admitir responsabilidade, o que pode desencadear batalhas legais. As nações desenvolvidas, como os Estados Unidos, rejeitaram a ideia no passado e ainda tratam a questão com cuidado.

    Khan disse que entende por que as nações ricas e desenvolvidas estão “enrolando”. Mas ele acrescentou que é “muito importante que esses países tenham empatia e assumam a responsabilidade”.

    Também houve confusão sobre a definição do conceito – se “perdas e danos” se trata de responsabilidade, compensação ou mesmo reparação.

    “Reparação não é um termo que tenha sido usado neste contexto”, disse o enviado climático dos EUA, John Kerry, em uma ligação recente com repórteres. Ele acrescentou: “Sempre dissemos que é imperativo que o mundo desenvolvido ajude o mundo em desenvolvimento a lidar com os impactos do clima”.

    Kerry se comprometeu a conversar sobre um fundo este ano, antes do prazo de 2024 para decidir como funcionaria esse fundo. E autoridades dos EUA ainda têm dúvidas – se o dinheiro viria de uma fonte financeira existente, como o Green Climate Fund, ou de uma fonte totalmente nova.

    Kerry também provocou controvérsia sobre o assunto em um recente evento do New York Times, quando em resposta a uma pergunta sobre perdas e danos, ele pareceu sugerir que nenhum país tem dinheiro suficiente para ajudar lugares como o Paquistão a se recuperarem de desastres climáticos devastadores.

    “Me diga o governo no mundo que tem trilhões de dólares, porque é isso que custa”, disse Kerry no evento.

    Mas outros dizem que o dinheiro está lá. É mais uma questão de prioridades.

    “Veja o orçamento anual de defesa dos países desenvolvidos. Podemos mobilizar o dinheiro”, disse Alden Meyer, associado sênior da E3G, à CNN. “Não é uma questão de dinheiro. É uma questão de vontade política”.

    Vítimas de enchentes recebem ajuda humanitária do grupo islâmico Jamaat-e-Islami no Paquistão, na cidade de Sucur, na província de Sinde, na margem ocidental do rio Indo, em 4 de setembro de 2022. / Fareed Khan/AP

    O que os especialistas acham que pode ser feito?

    Na COP27, o maior debate será sobre a criação de um mecanismo financeiro dedicado para perdas e danos – além do financiamento climático já existente destinado a ajudar os países a se adaptarem às mudanças climáticas e à transição para energia limpa.

    Depois que as nações devastadas pelo clima pediram um novo mecanismo de financiamento para perdas e danos na COP26 em Glasgow no ano passado, é provável que o assunto seja um objetivo oficial da COP27 este ano. Mas mesmo que os países mais ricos, como os Estados Unidos e as nações da União Europeia, tenham se comprometido a falar sobre isso, não há muita esperança de que os países saiam da Cúpula de acordo sobre a criação de um fundo.

    “Se esperamos ter um fundo até o final das duas semanas? Eu espero, adoraria – mas veremos como as partes agirão sobre isso”, disse recentemente a repórteres o embaixador do Egito, Mohamed Nasr, o principal negociador climático do país.

    Mas Nasr também reprimiu as expectativas, dizendo que, se os países ainda estão discutindo se devem colocar perdas e danos na agenda, é improvável que tenham avanço na criação de um mecanismo de financiamento.

    Ele disse que é mais provável que a conversa sobre perdas e danos continue ao longo das duas semanas da COP27, talvez encerrando a Cúpula com uma estrutura para a criação de um mecanismo de financiamento – ou clareza sobre se os fundos podem vir de fontes novas ou existentes.

    Algumas autoridades de países vulneráveis ​​ao clima alertaram que, se os países não chegarem a um acordo agora, o problema será muito pior mais tarde.

    “Os países que não estão na linha de frente acham que é uma espécie de distração e que as pessoas devem se concentrar em mitigação”, disse Avinash Persaud, enviado especial da primeira-ministra de Barbados, Mia Mottley, à CNN. “Se tivéssemos praticado a mitigação cedo o suficiente, não teríamos que nos adaptar e se tivéssemos nos adaptado cedo o suficiente, não teríamos perdas e danos. Mas não fizemos essas coisas.”

    Este conteúdo foi criado originalmente em inglês.

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