Prime Time

seg - sex

Apresentação

Ao vivo

A seguir

    Relatório aponta conversas em que Rússia e China incentivam teorias contra EUA

    Relatório de consultoria mostra que adversários dos Estados Unidos incentivaram teorias do grupo extremista QAnon

    Homem com chifres no Capitólio é preso (10 jan. 2021)
    Homem com chifres no Capitólio é preso (10 jan. 2021) Foto: CNN / Reprodução

    Zachary Cohen, da CNN

    Países adversários dos Estados Unidos como a Rússia e a China fizeram uso das teorias conspiratórias do grupo de extrema-direita QAnon para semear mais discórdia entre os americanos nos meses que antecederam a invasão do Capitólio, em 6 de janeiro de 2021, de acordo com relatório divulgado nessa segunda-feira (19) pela consultoria independente Soufan Center. 

    A promoção das conspirações continuou mesmo depois da invasão ao prédio onde funcionam a Casa dos Representantes (equivalente à Câmara dos Deputados, no Brasil) e o Senado dos Estados Unidos.

    O relatório mostra que países não só estão se utilizando das mesmas narrativas falsas para espalhar desinformação, como também alimentando teorias da conspiração que poderiam incitar mais violência por parte dos extremistas americanos. 

    Segundo o Soufan Center, outros países “estão utilizando a teoria da conspiração QAnon para semear discórdia social e até mesmo comprometer processos políticos legítimos”.

    O Soufan Center se descreve como um grupo sem fins lucrativos, cujas pesquisas estão focadas na segurança global. 

     As autoridades americanas estão cientes de que agentes apoiados por países como a Rússia têm amplificado as mensagens QAnon, e as agências federais dos EUA estão investigando a influência estrangeira como parte de um esforço amplo para combater a ameaça representada por extremistas americanos como visto em 6 de janeiro, disseram à CNN múltiplas fontes. 

    O diretor do FBI Christopher Wray reafirmou na semana passada que a instituição não está investigando o grupo QAnon em si, mas sim buscando descobrir como agentes estrangeiros estão amplificando teorias da conspiração, uma das poucas áreas em que as autoridades americanas têm podido explorar em um limitado esforço de investigação. 

    À CNN, fontes disseram que a Rússia tem disseminado narrativas QAnon como parte de uma ampla campanha de desinformação com foco nos Estados Unidos, mas o relatório divulgado nesta segunda-feira revela evidências de que a China, o Irã e a Arábia Saudita também estiveram engajadas em atividades parecidas neste ano. 

    “Nossa análise e coleta de dados demonstraram que o QAnon tem sido instrumentalizado pelos adversários dos Estados Unidos”, disse Zach Schwitzky, fundador de uma empresa de pesquisa que fez parceria com o Soufan Center na produção do relatório.”Países como Rússia, China, Irã e Arábia Saudita entraram na disputa também ampliando o alcance das mensagens QAnon, provavelmente uma maneira de semear mais discórdia e divisão entre os americanos”. 

    China é o principal promotor do QAnon

    Embora se acredite que o movimento QAnon tenha se originado nos Estados Unidos, o relatório observa que outros países foram muito ativos em impulsionar teorias da conspiração no fim de 2020 e também durante os dois primeiros meses deste ano. “Tanto em 2020 quanto nos dois primeiros meses de 2021, quase um quinto de todas as postagens QAnon no Facebook foram feitas a partir de usuários de fora”, diz o relatório. 

    Apesar de a pesquisa apontar os russos como responsáveis pela maior parte deste movimento do ano passado, o relatório também diz que a China emergiu como “o agente estrangeiro principal  na promoção das narrativas online do QAnon” em 2021. 

    “Rússia, Arábia Saudita e Irã também contribuíram para amplificar as teorias conspiratórias QAnon na internet a um público mais amplo”, acrescenta o relatório. “Tal atividade confunde a fronteira entre desinformação doméstica e estrangeira, o que representa um desafio relevante para o governo dos Estados Unidos e sua ação internacional”. 

    O problema é ainda agravado pelo fato de que o QAnon “tem potencial para incitar mais atos de violência em um futuro previsível”, de acordo com o texto, uma avaliação que ecoa preocupações levantadas por autoridades de várias agências federais americanas, incluindo o FBI, o Departamento de Segurança Doméstica e integrantes do programa de inteligência. 

    Esses temores estão diretamente ligados a como a teoria da conspiração QAnon “cria um processo de radicalização e violência parecido com aquele que estimula outros movimentos extremistas violentos, incluindo o Estado Islâmico”, diz o relatório. Há uma “abertura cognitiva entre a população dos Estados Unidos que pode ser manipulada por grupos extremistas e violentos e os recrutadores que apoiam o movimento QAnon”, explica o texto, observando que agentes estrangeiros também estão procurando formas de capitalizar essa vulnerabilidade. 

    “Essas descobertas sugerem que a teoria da conspiração QAnon tem potencial de servir como multiplicador para o extremismo violento doméstico, incluindo atos violentos motivados por questões raciais e étnicas que já estão tentando recrutá-los para suas fileiras”, segue o texto. 

    Um desafio complexo

    Frequentemente descrito como uma seita virtual, o QAnon é uma ampla teoria da conspiração de extrema-direita que promove a absurda e mentirosa alegação de que o ex-presidente republicano Donald Trump travou uma batalha contra um grupo de pedófilos satanistas composta por proeminentes políticos do Partido Democrata e celebridades progressistas.

    Os membros da violenta turma pró-Trump que invadiram o Capitólio tinham ligações com o QAnon, e a teoria da conspiração viajou dos fóruns da internet para a política profissional em anos recentes. 

    Um porta voz do Departamento de Segurança Doméstica dos Estados Unidos disse à CNN que a instituição está trabalhando com outras agências federais e entidades privadas para “combater a disseminação de teorias da conspiração e outras narrativas falsas presentes das redes sociais e outras plataformas online que podem levar pessoas à radicalização violenta e a alimentar o extremismo violento doméstico”. 

    Durante sua audiência de confirmação em janeiro, a diretora de Inteligência Nacional do presidente Joe Biden, Avril Haines, também se comprometeu em investigar quaisquer conexões estrangeiras do QAnon, embora tenha reconhecido que o Departamento de Segurança Doméstica e o FBI estão na liderança dessas questões. 

    Mas o depoimento de Wray na semana passada diante dos comitês de Inteligência da Câmara e do Senado mostrou como a capacidade de investigação do FBI em relação ao QAnon está limitada, apesar do reconhecimento de que o QAnon representa uma ameaça à segurança nacional. 

    “Como muitas outras teorias da conspiração, os efeitos da Covid-19, a ansiedade social, o isolamento social, as dificuldades financeiras, tudo exacerba a vulnerabilidade das pessoas diante dessas teorias, e nós estamos preocupados com o potencial que essas coisas têm de levar à violência, e onde há possibilidade de crime federal, vamos atuar fortemente”, disse Wray aos parlamentares da Câmara durante a audiência na semana passada. 

    O diretor do FBI também observou que o FBI prendeu “pelo menos cinco pessoas que se identificaram como adeptas do QAnon e que estavam relacionadas aos ataques de 6 de janeiro”, reconhecendo que há uma ligação clara entre a teoria da conspiração e a insurreição. 

    O relatório divulgado nesta segunda-feira também observa que a partir de 8 de fevereiro “pelo menos 27 indivíduos que participaram da invasão ao Capitólio em 6 de janeiro eram filiadas à conspiração QAnon”. 

    Porém, apesar de os documentos mostrarem claramente que o QAnon estimulou crenças dos réus que participaram da insurreição, investigar as origens das teorias conspiratórias e seu mérito criminal durante a investigação tem se mostrado um trabalho árduo, e ainda não há nenhuma indicação de que os encarregados da aplicação da lei estejam trabalhando para determinar a identidade da pessoa por trás da mensagem original ou de outras postagens anônimas em redes sociais que surgiram nos últimos anos. 

    Agentes federais têm dito frequentemente que as redes sociais devem assumir um papel mais relevante no combate ao espraiamento de teorias da conspiração como QAnon, uma visão que também aparece no relatório do Soufan Center.

    “Como aconteceu com a propaganda da AL-Qaeda e do Estado Islâmico, algoritmos utilizados por redes sociais para gerar contínuo engajamento são, em parte, responsáveis pela radicalização dos indivíduos que apoiam o QAnon”, diz o texto. “As descobertas deste relatório deixam claro que é imperativo proteger a liberdade de expressão, mas as redes sociais também precisam examinar detidamente suas abordagens de plataforma, o desenho dos algoritmos e a prevalência da desinformação em suas plataformas”. 

    (Esta é uma reportagem traduzida. Clique aqui para ler a original, em inglês).