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    Análise: Um inverno sombrio testará o apoio da Europa à Ucrânia como nunca

    Após seis meses da invasão russa ao país vizinho, a Europa se preocupa com o inverno em meio à crise energética, aumento do custo de vida e de alimentos

    Presidente da Ucrânia se reuniu com líderes da Itália, França, Alemanha e Romênia
    Presidente da Ucrânia se reuniu com líderes da Itália, França, Alemanha e Romênia Alexey Furman/Getty Images

    Luke McGeeda CNN

    Seis meses desde que a Rússia invadiu a Ucrânia, a resposta do Ocidente à crise permaneceu forte e amplamente unida – para surpresa de muitos.

    Apesar de anos de relações fragmentadas durante a era do ex-presidente dos Estados Unidos, Donald Trump, e da pandemia de Covid-19, a aliança transatlântica conseguiu se unir e chegar a acordos sobre apoio financeiro e doação de armas a Kiev, acordos para parar de usar energia russa, bem como sanções destinadas a atingir o presidente Vladimir Putin e seus apoiadores.

    No entanto, conforme a crise chega ao seu aniversário de meio ano, as autoridades de toda a Europa estão preocupadas que esse consenso possa desmoronar à medida que o continente entra em um inverno sombrio puxado pelo aumento dos preços dos alimentos, energia limitada para aquecer as casas e a possibilidade real de uma recessão.

    Autoridades e diplomatas ocidentais falaram com a CNN sob condição de anonimato para descrever abertamente as conservações sensíveis entre os governos.

    Em uma possível amostra das medidas mais draconianas que estão por vir, a capital alemã, Berlim, apagou as luzes que iluminam os monumentos para economizar eletricidade, enquanto as lojas francesas foram instruídas a manter as portas fechadas enquanto o ar-condicionado estiver ligado, ou poderão ser multadas.

    O presidente ucraniano, Volodymyr Zelensky, que capturou a imaginação do Ocidente e colocou pressão nos países para apoiar seu esforço de guerra, pode encontrar dificuldade em chamar a atenção de seus colegas líderes europeus à medida que o conflito se prolonga.

    “O desafio para a Ucrânia é o mesmo do primeiro dia: manter o Ocidente ao seu lado enquanto os custos do apoio a Kiev chegam lá – não apenas a chantagem de Putin quanto ao gás e grãos, mas também o custo do apoio econômico e humanitário”, diz Keir Giles, consultor sênior do think tank Chatham House.

    “Talvez seja por isso que Zelensky disse que queria que a guerra terminasse antes do Natal, porque o grande problema será fazer com que o Ocidente cumpra suas promessas a longo prazo”.

    A crise do combustível no inverno é algo em que as autoridades e diplomatas europeus estão pensando diariamente, já que a Rússia é responsável por cerca de 55% do total de importações de gás da Europa em 2021.

    Os países europeus também têm sede de petróleo russo, com quase metade das exportações russas de petróleo indo para o continente. A União Europeia (UE) importou 2,2 milhões de barris de petróleo bruto por dia em 2021.

    “Dentro da União Europeia, será muito difícil, mas devemos tentar cumprir nossa promessa de cortar a Rússia quando se trata de lucros de gás e outras fontes”, disse um diplomata europeu sênior, referindo-se a um acordo firmado entre o Estados-membros da UE que reduz o uso de gás russo em 15%.

    Presidente da Ucrânia, Volodymyr Zelensky, se reúne com representantes da União Europeia para entregar questionário de adesão ao bloco / Foto: Reprodução

    No entanto, o acordo foi criticado por ser voluntário, e as autoridades temem que, quando a pressão chegar, alguns países da União Europeia simplesmente não farão sua parte.

    “Existe a bolha da Europa Ocidental que é protegida pela distância e pode não ser convencida de que se tornar dependente da energia russa era uma vulnerabilidade catastrófica autoinfligida, e até agora espera um retorno à ‘normalidade’ com a Rússia”, diz Giles.

    As autoridades também temem que a estratégia ocidental de armar os ucranianos esteja se tornando uma solução de curto prazo para um problema de longo prazo: uma guerra sem um final claro.

    As armas francesas estão atualmente no campo de batalha na Ucrânia, enquanto a Alemanha quebrou décadas de políticas pacifistas para aumentar seus próprios gastos com defesa e enviar armas, embora tenha sido criticada por demorar mais do que o necessário para a entrega dessas armas.

    “No início, a resposta ocidental foi mais dura do que a Rússia esperava. Taticamente, o Kremlin errou muito. Foi politicamente muito fácil apoiar a Ucrânia e defender a doação de armas e dinheiro”, disse um funcionário da Otan à CNN.

    “Com o tempo, os tipos de armas que estamos enviando ficaram mais complicados, assim como o treinamento necessário para usá-las com eficiência. A boa notícia é que essas armas estão ajudando os ucranianos a resistir. A má notícia é que quanto mais a guerra durar, menor será o fornecimento dessas armas, tornando mais difíceis de resistir”, acrescenta o funcionário.

    Além dos custos econômicos e militares que afetam a generosidade do Ocidente, há também uma séria preocupação de que o mundo comece a sentir uma fadiga da guerra à medida que o conflito estagna.

    “Em fevereiro, era fácil entrar na onda anti-Putin. Agora, a guerra está no estágio estratégico chato. Há menos ganhos e perdas diários e menos oportunidades de fotos”, diz um diplomata da Otan.

    É claro que isso não será tão direto assim os países simplesmente retirarem seu apoio. Mas pode envolver uma mudança dos países nos parâmetros de exatamente qual resultado eles apoiam.

    Soldados ucranianos hasteiam bandeira nacional / Serhii Hudak/ Ukrinform/Future Publishing via Getty Images

    Alguns países da Europa Ocidental, principalmente Alemanha e França, disseram publicamente que o diálogo terá que existir entre o Ocidente e Moscou. O presidente francês, Emmanuel Macron, disse repetidamente que acredita que em algum momento as negociações precisarão ocorrer entre a Rússia e a Ucrânia, enquanto o chanceler da Alemanha, Olaf Scholz, foi criticado por mensagens contraditórias sobre o gás russo e, mais recentemente, sobre se a Europa deveria ou não proibir a obtenção de vistos de viagem para os russos.

    “Todos nós ainda temos a mesma visão do jogo final? É só voltar às fronteiras de antes da invasão da Rússia? Ou é voltar para antes de 2014, antes de a Rússia anexar a Crimeia? E vamos lidar com Putin depois da guerra ou ele terá que se retirar”, diz um diplomata europeu. “Estas são as perguntas de longo prazo que precisamos fazer, mas não são feitas. É melhor não fazer essas perguntas agora”.

    Os próximos meses serão os mais difíceis para as nações europeias desde o início da guerra. Os cidadãos sentirão a crise do custo de vida em todo o continente. Alguns terão que fazer escolhas entre aquecer suas casas ou comer.

    Essa crise ocorre porque muitos países europeus já receberam milhares de refugiados ucranianos. Contra esse cenário, é difícil para os líderes políticos justificarem o gasto de dinheiro e energia apoiando um país distante, especialmente quando alguns de seus cidadãos podem sentir que eles já foram generosos o suficiente.

    Várias autoridades ocidentais disseram à CNN sobre sua preocupação de que, em algum momento, os líderes políticos possam decidir que a melhor coisa é negociar um acordo de paz e minar o resultado final preferido pela Ucrânia, que está forçando as forças russas de volta às fronteiras anteriores.

    “Há uma preocupação crescente em alguns setores de que, se a Ucrânia parecer estar perdendo terreno para a Rússia, isso pode acelerar os pedidos de um acordo negociado. Zelensky deve continuar a fazer sua mágica de relações públicas e promover a mensagem de que a Ucrânia ainda está progredindo, lutando arduamente e que precisa de armas”, disse Theresa Fallon, diretora do Centro de Estudos para Rússia-Europa-Ásia, à CNN.

    “Assim que as pessoas sentirem que [Kiev] está do lado perdedor, podem começar a se perguntar por que continuamos a fornecer armas caras para a Ucrânia em um momento de estresse econômico. Por que estamos jogando dinheiro bom atrás de dinheiro”, diz ela.

    Isso será crítico, ela ressalta, já que muitos aliados importantes também passam por períodos políticos turbulentos em casa. A Itália realizará uma eleição, o Reino Unido terá um novo primeiro-ministro e os Estados Unidos realizarão eleições de meio de mandato que podem determinar o restante do primeiro mandato do presidente Joe Biden.

    “À medida que as questões políticas domésticas começam a dominar, os cidadãos podem perguntar por que estamos ajudando a Ucrânia em vez de construir infraestrutura”, acrescenta Fallon.

    Por mais que o Ocidente possa razoavelmente se elogiar por sua resposta inicial à crise, as coisas estão prestes a ficar muito mais difíceis. A maioria das autoridades reconhece que ninguém tem ideia de como esse conflito termina. E enquanto a maioria gostaria de ver a Ucrânia alcançar seus objetivos de enfrentar Putin e forçá-lo a sair de seu país, sua verdadeira determinação ainda não foi totalmente testada.

    E a verdade miserável é que, se chegar a hora, uma paz negociada envolvendo Putin pode não ser tão preocupante para países que não compartilham uma fronteira com a Rússia e, sem rodeios, não veem Moscou como a única causa de uma tal crise existencial.

    Fotos – imagens da guerra

    Este conteúdo foi criado originalmente em inglês.

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