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    5 pontos para entender o movimento de aviões da China perto de Taiwan

    Desde o início de outubro, cerca de 150 caças, bombardeiros e aeronaves do exército chinês entraram no espaço aéreo do país

    Aeronave antissubmarino Yun 8 da Força Aérea da China sobrevoa zona de defesa aérea de Taiwan
    Aeronave antissubmarino Yun 8 da Força Aérea da China sobrevoa zona de defesa aérea de Taiwan Divugação/Ministério da Defesa de Taiwan

    Brad Lendonda CNN

    O recorde de incursões de aviões de guerra da China na zona de defesa de Taiwan nos últimos quatro dias mexe com as forças militares de Pequim ao mesmo tempo em que envia fortes mensagens para o país e além da ilha autônoma. É o que pensam analistas ocidentais.

    Uma soma de quase 150 caças, bombardeiros com capacidade nuclear, aeronaves antissubmarino e aeronaves de alerta aéreo antecipado e controle da Força Aérea do Exército de Libertação do Povo (FAEPL) da China entraram na Zona de Identificação de Defesa Aérea (ADIZ na sigla em inglês) de Taiwan a partir de sexta-feira (1), de acordo com o Ministério da Defesa de Taiwan.

    Embora os voos chineses não tenham chegado perto do que Taiwan considera seu espaço aéreo soberano – 12 milhas náuticas de sua costa – eles entraram em uma área, a ADIZ, para a qual o governo de Taiwan diz iria responder em caso de incursão.

    A resposta pode acontecer por meio de avisos de rádio, rastreamento de mísseis antiaéreos ou interceptação de jato de combate.

    Na segunda-feira (4) – quando a FAEPL enviou o maior número de aviões de guerra (56) à ADIZ de Taiwan desde que a ilha começou a relatar publicamente tais atividades no ano passado – o Ministério da Defesa de Taiwan disse que alertas de rádio foram emitidos e sistemas de mísseis de defesa aérea foram acionados para monitorar a atividade.

    Em nenhum momento durante a onda de voos chineses foi sugerido que o combate real era iminente, mas os analistas ocidentais dizem que a China é capaz de fazer várias ações sem disparar um tiro proposital.

    “Trata-se de programa bem elaborado do governo chinês, que deve ser executado ao longo de meses e anos, com vários objetivos interrelacionados”, afirmou Jacob Stokes, pesquisador do programa de segurança Indo-Pacífico do Center for a New American Security.

    Caça chinês J-16, do Exército de Libertação do Povo, voa sobre zona de identificação de defesa aérea de Taiwan
    Caça chinês J-16, do Exército de Libertação do Povo, voa sobre zona de defesa aérea de Taiwan / Ministério da Defesa de Taiwan

    “O primeiro [objetivo] é um sinal político-militar para tentar intimidar o governo de Taiwan e reivindicar a posse da ilha pela China”, continuou.

    “O segundo é fazer com que os pilotos do Exército de Libertação do Povo (ELP) e o pessoal de apoio militar associado tenham experiência na condução desses tipos de operações em diferentes condições (como à noite), o que aumentará sua capacidade de combate se necessário”, afirmou.

    “O terceiro é forçar os militares de Taiwan a colocar no ar suas aeronaves em resposta, o que ajuda a desgastar a pequena força aérea e os pilotos de Taiwan”, contou Stokes.

    Outros analistas dizem que o ELP também está mostrando aos amigos de Taiwan – especificamente os Estados Unidos, Japão e o Reino Unido – que não vai recuar por causa do apoio deles ao país.

    Eles também afirmam que a ampla cobertura dos voos na mídia doméstica chinesa visa reforçar o apoio à campanha chinesa para colocar Taiwan sob seu controle.

    São cinco os pontos principais relacionados ao aumento recorde de voos.

    1. O que Taiwan está fazendo que irrita a China?

    A ilha de Taiwan e a China continental são governadas separadamente desde o fim de uma guerra civil, há mais de sete décadas, na qual os nacionalistas taiwaneses derrotados fugiram para Taipei.

    O governo da China, em Pequim, continua a ver Taiwan como uma parte inseparável de seu território, embora o Partido Comunista Chinês nunca tenha governado a ilha de governo democrático.

    Além disso, o presidente chinês, Xi Jinping, recusou-se a descartar o uso de força militar para capturar Taiwan, se necessário.

    Avião do exército chinês
    Um bombardeiro H-6 chinês é interceptado por aviões taiwaneses no Estreito de Taiwan em setembro. / Foto: Ministério da Defesa Nacional da China

    De acordo com Lionel Fatton, especialista em assuntos Indo-Pacífico da Universidade Webster, na Suíça, “a China precisa de alavancas para impedir que Taiwan adote cursos de ação indesejáveis, especialmente iniciativas voltadas para a independência”. Fatton observa que o aumento de voos chineses para a ADIZ de Taiwan veio depois que Taipei apresentou oficialmente um pedido de adesão ao pacto de livre comércio do Acordo Compreensivo e Progressivo para a Parceria Transpacífica (CPTPP na sigla em inglês).

    É o tipo de ação que o governo chinês não aceita.

    “Só existe uma China no mundo e Taiwan é uma parte inalienável do território da China. Com relação à CPTPP, nos opomos firmemente à adesão de Taiwan a qualquer acordo ou organização de natureza oficial”, disse o porta-voz do Ministério das Relações Exteriores da China, Lijian Zhao, em um tuíte em 23 de setembro.

    Fatton disse que o aumento nos voos do ELP é como se o governo chinês dissesse a Taipei que tem os meios e o poder de fogo para apoiar essa postura linha-dura. Para o especialista, é um ato clássico de dissuasão: mostre força antes que um oponente tome uma atitude que resultará em um custo inaceitável.

    Carl Schuster, ex-diretor de operações do Centro de Inteligência Conjunta do Comando do Pacífico dos EUA, disse que Pequim está sinalizando para Taipei que pode atacar a hora que quiser. “Essa é uma mensagem forte, que acompanha e reforça a retórica ameaçadora da China”, comentou.

    E a China será implacável, disse Fatton.

    “Podemos esperar que a China continue sua campanha de pressão para garantir que sua postura dissuasora permaneça forte”, disse.

    Na terça-feira (5), o presidente de Taiwan, Tsai Ing-wen, indicou que a ilha não está prestes a ceder sob pressão.

    “Em meio às intrusões quase diárias do Exército de Libertação do Povo, nossa posição sobre as relações através do estreito permanece constante: Taiwan não se curvará à pressão, mas também não se tornará aventureira, mesmo quando acumular apoio da comunidade internacional”, escreveu Tsai em um editorial para a revista norte-americana “Foreign Affairs”.

    2. Como isso ajuda a China a ganhar experiência militar?

    Se o governo da China decidir por uma campanha militar completa contra Taiwan, o ELP precisará de informações detalhadas sobre que tipo de resposta receberá das forças de Taiwan.

    Enviar dezenas de aviões de guerra à ADIZ de Taiwan ajuda a montar o cenário para o ELP.

    “O ELP está testando e desenvolvendo uma avaliação da capacidade de Taiwan em detectar e disposição para responder às ameaças aéreas. Também está registrando os tempos de resposta, táticas e procedimentos de interceptação aérea de Taiwan”, opinou Schuster.

    O número crescente de aeronaves do ELP envolvidas nas incursões sobre a ADIZ em Taiwan também desenvolve a capacidade do ELP de trabalhar com o grande número de meios militares que provavelmente seriam usados em combate.

    “As operações aéreas coordenadas envolvendo muitas aeronaves a grandes distâncias são mais complicadas do que as operações de pequenas unidades perto da base doméstica”, disse Schuster. “A visão do controlador aéreo do espaço de batalha é menos precisa a 100 milhas náuticas do que a 10 milhas náuticas. Adicionar aeronaves aumenta essa complexidade”.

    Schuster disse, até onde ele sabe, os últimos voos do ELP representam a maior concentração de aeronaves militares chinesas já operando tão longe de suas bases.

    Portanto, é possível que os voos em grande escala continuem. No fundo, o ELP precisa da prática.

    “A Força Aérea e a Marinha dos EUA consideram isso (exercícios em grande escala) uma rotina, mas ainda treinam para isso pelo menos uma vez por ano. O ELP não tem essa experiência”, contou Schuster.

    Guardas de Taiwan seguram bandeira da ilha em praça de Taipei
    Guardas de Taiwan seguram bandeira em praça de Taipei; discussão sobre soberania da ilha causa atritos com a China / NurPhoto via Getty Images

    3. E quanto aos recursos militares de Taiwan?

    Taipei não possui tantos aviões militares quanto a China. Além disso, sua frota também é mais antiga.

    Para os analistas, se o governo de Taiwan tentar igualar a ELP voo a voo, terá sérios problemas.

    “A maior parte dos caças Taiwan tem quase 30 anos. Cada decolagem estressa a fuselagem. Conforme os aviões envelhecem, eles desenvolvem rachaduras de fadiga na fuselagem”, explica Schuster, o ex-diretor de operações do Centro de Inteligência.

    “A China provavelmente espera que suas incursões possam levar Taiwan a escolher entre impor limites de manobras a seus caças ou retirá-los do serviço para reforma”.

    Mas Taiwan pode não estar mordendo a isca, disse Peter Layton, um membro do Griffith Asia Institute na Austrália.

    O analista australiano observa que os militares de Taiwan não usam fotos recentes de aviões chineses em seus comunicados à imprensa sobre as incursões do ELP: eles usam imagens de arquivos de aviões chineses.

    “Entretanto, Taiwan está publicando dados de rastreamento detalhados que incluem os tipos de aeronaves da FAEPL. Isso significa que (os militares de Taiwan) podem identificar o tipo de aeronave por meios não visuais, ou seja, meios eletrônicos de longo alcance”.

    4. Quais são as mensagens para os amigos de Taiwan?

    Ocorrências anteriores de maiores incursões de voos do ELP à ADIZ de Taiwan aconteceram depois que nações que apoiam Taipei fizeram algo que irritou Pequim. Por exemplo: uma incursão de 25 aviões do ELP em abril aconteceu um dia depois que o secretário de Estado dos EUA advertir Pequim de que Washington estava comprometido com a defesa de Taiwan. Já a incursão em junho de 28 aviões de guerra do ELP veio depois que os líderes do Grupo dos Sete (G7) emitiram uma declaração conjunta repreendendo a China por uma série de questões e sublinharam a importância da paz e da estabilidade em todo o Estreito de Taiwan.

    Os voos da semana passada ocorreram quando EUA, Japão, Reino Unido, Nova Zelândia e Holanda realizaram exercícios navais multilaterais perto de Okinawa, a apenas 730 quilômetros de Taiwan, de acordo com um comunicado da Força de Autodefesa Marítima do Japão. Os exercícios envolveram dois porta-aviões dos EUA e um britânico.

    Os voos chineses em grande escala, envolvendo dezenas de aviões, provavelmente tiveram sua gênese meses atrás, disse Layton.

    “A Força Aérea do ELP tem a reputação de preferir atividades bem planejadas e fortemente coreografadas”, relatou.

    Meses de planejamento “permitiriam que o plano fosse bem desenvolvido e praticado várias vezes antes desta série de grandes eventos. Esses tempos também garantiriam que o número necessário de aeronaves estivesse em condições de uso e disponíveis”, disse Layton.

    Na hierarquia político-militar chinesa, há pouca tolerância aos erros.

    “O Partido Comunista é avesso a riscos e os membros do partido localizados em cada nível de comando da FAEPL gostariam de garantir que tudo corresse bem sem problemas”, disse Layton.

    Como tal, o aumento dos voos do ELP foi provavelmente imaginado pela primeira vez “como uma demonstração de força para acompanhar o aniversário” da fundação da China em 1º de outubro, disse Timothy Heath, pesquisador sênior de defesa internacional do think tank RAND Corp. em Washington.

    Mapa fornecido por Taiwan mostra trajetória de aviões militares chineses em uma das incursões de sábado (2)
    Mapa fornecido por Taiwan mostra trajetória de aviões militares chineses em uma das incursões de sábado (2) / Reprodução/Ministério da Defesa de Taiwan/Twitter

    “No entanto, para tal evento cerimonial, um dia de atividade de ‘desfile aéreo’ teria sido suficiente”, disse Heath, acrescentando que os exercícios navais, o fato de a Grã-Bretanha ter enviado recentemente um contratorpedeiro para o Estreito de Taiwan, e uma nova liderança no Japão considerando sua política futura a respeito de Taiwan, são fatores que provavelmente desempenharam um papel na expansão dos voos da China.

    “O uso de ondas repetidas de formações aéreas de combate é uma ferramenta flexível para enviar um sinal político e um alerta para Taiwan e os países ocidentais”, afirmou Heath.

    5. Como os voos estão sendo cobertos pela mídia chinesa?

    Heath disse que a mídia estatal chinesa recentemente destacou o aniversário do Dia Nacional de 1º de outubro e “advertências e ameaças enfáticas contra Taiwan e aos Estados Unidos e ao Ocidente” em artigos escritos em mandarim e em inglês.

    Uma olhada no site do tabloide nacionalista estatal “Global Times” na terça-feira (5) ilustra a importância da questão para Pequim.

    Uma matéria de topo da página disse que o ELP fez voos com “impressionantes 56 aviões de guerra” contra a ADIZ de Taiwan na segunda-feira (4), acrescentando que a mudança ocorreu “um dia depois de os EUA expressarem ‘preocupação’ sobre a atividade militar do continente chinês perto da ilha, alegando foi uma provocação”.

    “A declaração dos EUA enviou um sinal muito errado e irresponsável, e a China tomará todas as medidas necessárias para esmagar qualquer tentativa de ‘independência de Taiwan’”, relatou o “Global Times” citando o Ministério das Relações Exteriores da China.

    Um editorial do “Global Times”, também de topo da página, disse que os voos foram “uma advertência severa” ao Partido Progressista Democrático (DPP) de Taiwan contra suas políticas “separatistas”.

    (Texto traduzido. Clique aqui para ler o original em inglês).