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      Elizabeth Guedes - Presidente da Associação Nacional de Universidades Particulares (Anup)

      Elizabeth Guedes é presidente da Associação Nacional de Universidades Particulares (Anup)

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    A infodemia como prejuízo ao Ensino a Distância no Brasil

    A pandemia nos trouxe uma lição valorosa sobre a importância de seguir a ciência e evidências confiáveis antes de tomarmos decisões que impactem vidas. A vacinação demonstrou claramente que é somente através de informações embasadas que podemos combater eficazmente o vírus. A Organização Pan-Americana da Saúde (Opas) usou o termo Infodemia em seu documento “Kit de Ferramentas para a Transformação Digital”, definindo-o como “excesso de informações, algumas precisas outras não, que tornam difícil encontrar fontes idôneas e orientações confiáveis quando se precisa”.

    Infelizmente, esta mesma dinâmica de informações tem sido evidente na abordagem sobre o Ensino a Distância (EaD), em que uma diversidade de vozes emite declarações baseadas em rumores, sem o devido respaldo de pesquisas sistemáticas. Entre as abordagens recorrentes está a alegação de que as instituições particulares estariam aquém das públicas. Porém, resultados do Exame Nacional de Desempenho dos Estudantes (Enade) refutam tal premissa, uma vez que 20% das instituições privadas obtiveram conceitos 4 e 5, enquanto 12% dos cursos oferecidos pelas públicas obtiveram a mesma performance.

    Estamos em plena infodemia sobre a modalidade de educação a distância no Brasil. As perspectivas e declarações que chegam à sociedade e, principalmente, aos tomadores de decisão, partem de um imaginário que não encontram bases na realidade, sendo até comparadas a “lendas urbanas”, de tão folclóricas. Entre elas, que um curso EaD não requer presencialidade dos alunos de graduação. A verdade é que todos os cursos a distância, para formar profissionais qualificados, contam com boa parte de suas grades curriculares de forma física, nos polos educacionais. Assim, com uso recorrente de informações sem lastro, os prejuízos sociais são inevitáveis.

    Mais uma vez nos valendo das propriedades científicas, que nos fornecem dados, padrões e leituras acuradas sobre cenários, as políticas públicas para educação também devem ser elaboradas em evidências, fundadas em diagnósticos claros e amparadas por fatos mensuráveis, que devem ser objeto de pesquisa elaborada e executada por especialistas.

    Todas essas ações devem estar orientadas para o futuro do país e para as metas esperadas. Mas não é o que estamos observando em relação às medidas direcionadas ao setor de educação a distância no país, considerando o avanço acelerado das tecnologias e as soluções metodológicas de ensino-aprendizagem que deveriam nortear e atualizar a regulação da EaD no Brasil.

    Em vez de estarmos um passo adiante, na busca por aprimoramentos em favor da educação inclusiva e democrática no país, ainda estamos no debate exaustivo para provar, a quem já deve saber, que não há nenhum curso de graduação autorizado pelo MEC que seja 100% digital.

    O curso de Enfermagem é sempre citado como exemplo, levando a população acreditar que haveria enfermeiros aprendendo aplicar injeções virtualmente. Além de ser um erro repassar esse tipo de informação, desestimula o ingresso de novos estudantes vocacionados para área.

    A verdade sobre alunos de enfermagem por EaD é que ele passa exatamente o mesmo tempo em campo de prática, utilizando laboratórios, fazendo estágio e extensão, da mesma forma dos estudantes que optam pela modalidade 100% presencial. E isto pode representar mais de 50% da carga horária total do curso.

    Da forma que as informações têm sido disseminadas sobre EaD, além de difamar instituições que estruturaram cursos a distância há mais de 20 anos, também significaria dizer que a curadoria e elaboração de conteúdos por professores mestres, doutores ou especialistas no mercado de trabalho, transmitidas em ambientes digitais preparados, não seriam capazes de substituir aulas ministradas por um professor em sala de aula. Mas por quê?

    Neste caso, como justificativa ligeiramente plausível, seriam as vagas interpretações dos dados do Censo 2022, sobre ensino superior, produzido pelo Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas Educacionais Anísio Teixeira (INEP), em relação à diferença entre a qualidade da aprendizagem ofertada pelas modalidades – EaD e presencial.

    Porém, mais uma vez, as informações precisam ser observadas com muito cuidado para que não se misture o “joio e o trigo”, reproduzindo dados equivocados, potencializando prejuízos para o futuro da educação brasileira. Há inúmeras instituições de ensino particulares, cujos cursos EaD recredenciados pelo MEC, apresentam conceitos com notas 4 e 5, as mais elevadas, provando sua capacidade de ensino, conforme constatado em visitas realizadas por professores capacitados pelo MEC para tal avaliação.

    De outra mão, consideremos as condições de ofertas das IES, a partir de seus polos de apoio pedagógico, uma vez que todos os cursos são ministrados por meio da infraestrutura desses. Esses ambientes agregam os profissionais de suporte educacional, bem como os professores, professores tutores, laboratórios, bibliotecas, salas de aula para o ensino remoto, em tempo real (síncrono) ou assíncrono (aulas gravadas). Apesar de toda a infraestrutura disponibilizada, corpo docente qualificado, e diversas melhorias ao longo de duas décadas, o MEC não visita os polos para verificar esses avanços, há seis anos, limitando-se a apenas o campus principal, o que é inaceitável e insuficiente para avaliar o setor.

    Como último recurso objetivo que justifique o juízo geral que se quer construir sobre a EaD poderiam ser as médias do ENADE 2022. No entanto, mais uma vez os resultados subvertem a lógica do senso comum. As notas obtidas nas regiões Nordeste e Centro Oeste, referentes às médias do EaD foram superiores às do presencial. Na região Sudeste, onde o curso presencial costuma obter as melhores notas, o EaD alcançou médias equivalentes aos cursos presenciais da região Sul.

    Outro enfoque a ser analisado entre os dados da educação a disância e presencial, é a diferença substancial entre os alunos, o que pode explicar uma parte das diferenças deste resultado. Mas é preciso ainda analisar por outro ângulo este cenário, relevando as diferentes realidades.

    Hoje, a maioria dos estudantes de nível superior vem de famílias cujos pais não cursaram o ensino superior, mas as semelhanças entre as modalidades de ensino param por aí. Os números indicam que 60% dos alunos com idade até 24 anos estão em cursos presenciais em sua primeira graduação, representando 52% do universo de estudantes universitários no sistema presencial. Já nos cursos EaD, 80% dos alunos são mais velhos, estando na graduação pela primeira vez com idade entre 25 e 40 anos – são 59,3% de alunos na modalidade a distância.

    As diferentes realidades desses estudantes também precisam ser consideradas. Quase 80% dos alunos de cursos presenciais ainda não são chefes de família. 65% possuem renda familiar de até 4,5 salários mínimos e 42,2% trabalham 40 horas semanais ou mais. Já o cenário de alunos dos cursos EaD é bem diferente: 40% são casados, 76% possuem o mesmo teto de renda familiar e 67% trabalham 40 horas ou mais.

    Na realidade brasileira, o acesso ao ensino superior exclusivamente por EaD ocorre em 2831 municípios, ou seja, 50% das cidades brasileiras. Em comparação às capitais e grandes metrópoles, este número é quatro vezes maior, o que significa que eles não substituem o ensino presencial como apregoado antes da análise dos dados do Censo.

    Já nas pesquisas internas, realizadas com os egressos de cursos EaD, as respostas são claras: “os objetivos principais dos nossos alunos são elevar sua qualidade de vida, obter aumento de seu salário, transformar sua realidade, ter dignidade e mais amor-próprio com o acesso a novas oportunidades de viver melhor”.

    Por isso, o novo marco regulatório precisa enfatizar a qualidade acadêmica e não pode tratar todos os cursos EaD e instituições de ensino como iguais. Precisa separar o “joio do trigo” e considerar os avanços que a tecnologia e inovação trazem ao abrir oportunidades para todos que quiserem estudar, onde quer que estejam, em qualquer lugar de nosso país continental.

    O MEC precisa se basear em evidências e não pode fazer regulação olhando pelo espelho retrovisor. Caso contrário, incorrerá em Infodemia ao invés de consolidar uma política pública democrática e inclusiva. O EaD inclui.

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