Superliga Europeia levou três anos para ser construída e 48 horas para ruir
A crítica foi instantânea, feroz e generalizada, com torcedores chamando a iniciativa de "traição definitiva"
Ganância, dinheiro e poder.
Estas foram as três palavras que definiram uma semana que abalou os a estrutura do futebol europeu.
No dia 18 de abril, 12 dos maiores, mais bem-sucedidos e financeiramente poderosos clubes da Europa –posteriormente apelidados de “Doze Sujos”– anunciaram sua intenção de romper com o atual formato de competição da UEFA e criar sua própria Superliga.
Mas não demorou muito para torcedores criticarem o movimento, julgando-o como “movido pela ganância, o desejo de acumular mais dinheiro e exercer mais poder do que já tinham”.
A Superliga queria garantir 15 vagas fixas para clubes na competição que contava 20 equipes por temporada, independentemente do desempenho em campo. Só que alguns dos super clubes fundadores não são assim tão fantásticos.
O Tottenham Hotspur, por exemplo, ganhou apenas uma Copa da Liga nos últimos 30 anos. O Arsenal não se classifica para a Liga dos Campeões desde 2016 e o AC Milan desde 2013. O Inter de Milão não passa da fase de grupos desde 2011. Para citar alguns.
Essa “tomada de poder” tem como intuito garantir o status de membros fundadores da Superliga e também sua receita, já que alguns deles atualmente não estão lucrando com suas apresentações em campo.
A promoção e o rebaixamento permitem que os torcedores de times mais abaixo na pirâmide do futebol sonhem que, um dia, poderão competir contra os melhores. Ou seja, a estrutura da Superliga vai contra tudo que torna o futebol europeu tão atraente.
Fúria dos torcedores
A crítica foi instantânea, feroz e generalizada, com torcedores chamando a iniciativa de “traição definitiva”.
Apesar de slogans com mensagens de apoio e senso de união –como o slogan do Liverpool, “Isso significa mais”–, o movimento deixou claro que apoiadores são vistos apenas como “consumidores” e que os clubes da Superliga veem sua base de torcedores tradicional–aqueles que vão aos jogos e fazem parte das comunidades em suas cidades-– apenas como “torcedores patrocinadores”.
“Duas palavras que somam dinheiro, sob a visão cultural dos proprietários”, escreveu o Athletic. “Em vez de atender a torcedores ‘patrocinadores’, os clubes da Superliga –que se consideram ‘provedores de conteúdo’– queriam se voltar para os ‘fãs do futuro’, aqueles que estão mais interessados em ver nomes de estrelas do que futebol seu time.
Os torcedores levaram sua indignação para políticos e chefes de órgãos governamentais –-e alguns cínicos até podem argumentar que isso foi para impulsionar interesses políticos ou financeiros, ao invés de uma crença verdadeira no bem maior do futebol.
O primeiro-ministro britânico, Boris Johnson, e seu secretário de Cultura, Oliver Dowden, falaram em aprovar uma legislação para impedir a Superliga, enquanto o presidente da FIFA, Gianni Infantino, alertou que os clubes separatistas terão de “viver com as consequências”.
O projeto que levou três anos para construir implodiu no tempo de 48 horas.
O drama desta semana foi digno de uma novela. O presidente da UEFA, Aleksander Ceferin, disse que já havia sido tranquilizado pelo presidente da Juventus, Andrea Agnelli, de que o clube italiano não se inscreveria no novo formato. No entanto, quando rumores sobre o grande anúncio começaram a circular, Ceferin disse que Agnelli começou a ignorar seus telefonemas.
“Achei que também éramos amigos, mas me enganei. Para mim, é sempre melhor ser ingênuo do que mentir o tempo todo”, disse Ceferin, referindo-se anteriormente aos envolvidos como “cobras”. Para tornar as coisas ainda mais dramáticas, Ceferin é padrinho da filha de Agnelli.
“O presidente deles aprovou algo e depois fugiu. Provavelmente ainda está escondido em algum lugar, não sei onde está.”
Potência da torcida
Passar algum tempo em sala de reuniões distanciou ricos empresários da crença de que o futebol existe para os torcedores e por causa de torcedores.
O que vimos nessas 48 horas, com o anúncio da Superliga, foi um lembrete aos poderosos do futebol de que os torcedores nunca devem ser ignorados dessa forma novamente.
Na terça-feira, os torcedores do Chelsea se reuniram num protesto em frente ao estádio do clube, Stamford Bridge, fazendo uma barreira humana impedindo o ônibus do time de chegar ao local pouco antes da partida da Premier League contra o Brighton.
Xingamentos se transformaram em gritos de alegria após a divulgação da notícia de que o Chelsea havia anunciado que se juntaria ao Manchester City e se retiraria da iniciativa.
Em pouco tempo, as seis equipes da Premier League divulgaram declarações dizendo que não fariam mais parte do novo projeto.
Mas não foi apenas em Stamford Bridge que houve manifestação. Torcedores do Tottenham, Liverpool, Manchester United, Manchester City e Arsenal foram aos seus respectivos estádios para mostrar seus sentimentos.
Logo depois, Atlético Madrid, Inter de Milão, AC Milan e Juventus anunciaram que também se retirariam, deixando apenas Barcelona e Real Madrid comprometidos com o projeto. E comprometidos eles permanecem.
Na quarta-feira à noite, o presidente do Real Madrid, Florentino Perez –que deveria ser o presidente da Superliga– foi à rádio espanhola El Larguero e disse que a proposta não foi cancelada, está apenas “embargada”.
No dia seguinte, o Barcelona fez o mesmo comunicado e ainda disse que seria um “erro histórico desistir”. Qualquer que seja a visão que esses dois clubes tivessem para a futura Superliga, certamente não tinham em mente apenas ter 15 clássicos por temporada.
Embora o resultado final tenha sido uma vitória para os fãs de futebol, as notícias da semana passada, compreensivelmente, deixaram um gosto amargo na boca para muitos.
*Texto traduzido, clique aqui para ler o original