Ruth Rocha faz 90 anos: ‘Ler é enxergar o mundo com outros olhos’
Com 52 anos de carreira e 213 livros publicados, escritora falou à CNN sobre trabalho, inspiração e pandemia
Hoje, dia 2 de março, a escritora Ruth Rocha completa 90 anos. A autora, que continua sendo um marco na literatura brasileira para o público infantojuvenil, comentou em uma entrevista à CNN os marcos de sua vida, dicas para escrita, suas inspirações e o que mudou em sua rotina com a pandemia.
“Eu vou comemorar essa data especial de uma forma diferente por causa da pandemia. Eu vou mandar para uma porção de pessoas queridas um almoço e assim vamos almoçar juntos e se ver por Skype. Eu já me vacinei com a primeira dose. Agora estou esperando a segunda dose com esperança”, disse.
Com uma trajetória de 52 anos de carreira marcada por 213 livros lançados com contos, crônicas e traduções para o português de obras clássicas, Ruth busca até hoje atingir o mesmo objetivo: garantir o acesso à alfabetização e à educação.
“O que motivou na verdade a escrever para crianças foi um pedido da revista Recreio. Eu era educadora profissional, e pediram para escrever uma história e desde então nunca mais parei. A primeira história que eu escrevi foi “Romeu e Julieta” para a revista e o primeiro livro que editei foi “Palavras, muitas palavras. Eu escrevi mais de 200 livros, tenho um carinho especial por cada um, mas gosto muito do “Marcelo, marmelo, martelo” porque foi o que fez mais sucesso e o que as crianças mais gostam.”
Para a escritora, Monteiro Lobato foi o autor que mais a inspirou e ela dá uma dica para quem quer seguir essa carreira: “Eu acho que o escritor é a união de tudo o que ele leu. A gente não se inspira em um livro, mas sim no estilo, nos truques, nas coisas que os autores fazem. Monteiro Lobato foi uma influência enorme na minha vida. Ele tem uma preocupação social muito importante, um feminismo latente, porque ele coloca as mulheres como as personagens mais inteligentes”, contou.
Ela também deu dicas para quem quer fazer da escrita um ofício. “Quando me perguntam que dica eu dou para quem quer construir uma carreira como escritor eu falo: “Leia, leia, leia, leia e leia mais. Só quem lê escreve. Ler é uma das coisas mais magicas que existe. Com a leitura conhecemos outros mundos, outras pessoas, e não é só para criança, a literatura é uma influência para o mundo. Ler é enxergar o mundo com os outros olhos. É muito enriquecedor para o adulto e para a criança.”
São 90 anos de vida e 52 anos de carreira até o momento. E toda essa trajetória a escritora conseguiu resumir em dois pontos: família e leitura.
“Foram tantas coisas que me marcaram nestes 90 anos, mas o que eu gosto e o que me marcam são as pessoas. Eu gosto é de gente. Além disso a leitura também me marcou. Eu li muito e gosto muito de ler ainda. Eu fui muito feliz na infância. Foi muito alegre, muito divertida, fui muito amada. E eu acho que isso é uma coisa que a gente leva para o resto da vida. Depois me casei, fui muito feliz no casamento, tive uma filha maravilhosa, tive dois netos ótimos e tenho quatro irmãos que eu adoro. Eu sou muito marcada pela vida em família eu gosto muito da minha família e sei que a minha família gosta muito de mim.”
Quando questionada sobre o que mudou em sua rotina durante a pandemia, Ruth comenta que tudo e que sente falta da família e dos passeios, porém o trabalho continuou e até escreveu um livro novo.
“Com a pandemia mudou tudo, porque eu não saio mais. Faz um ano que eu não saio de casa. Saí apenas para ir ao médico. Estou muito trancada longe dos meus queridos. Tenho muitas saudades da reunião em família e de sair para um concerto ou show. Mas no começo eu estava até assanhada, arrumando arquivos e editando obras como o Marcelo e o Almanaque — esse foi um trabalho que eu fiz junto com a minha filha Mariana e que eu gosto muito porque resume várias obras que eu já fiz. Eu pego os personagens e faço eles reviverem com novas histórias e piadas. Além disso, escrevi um livro novo chamado de “O Grande Livro dos Macacos”, que ainda não tem previsão de lançamento”, contou.
Ruth também falou da relação com a irmã. “Durante a pandemia eu e a minha irmã também lemos livros juntas. Ela me liga e lê um pedaço de um livro. Assim já lemos vários livros, como Guerra e Paz, e estamos acabando de ler o livro do Obama. Estamos gostando muito. Como somos formadas em Sociologia, gostamos bastante de temas como economia e política.”
Sobre como a tecnologia impactou o seu trabalho, Ruth comenta que impacto pouco, porque continua ainda escrevendo à moda antiga.
“Ainda continuo escrevendo à mão e depois passo para uma pessoa digitalizar. Não sou muito ligada a essas coisas modernas, sou ligada na TV, adora o rádio, mas eu acho que os meios digitais são instrumentos que possuem um poder imenso. Eu vejo não só um futuro brilhante, mas um perigo enorme, é preciso saber usar.”
Para terminar a conversa, Ruth Rocha deixou uma mensagem para a família brasileira:
“Gente, cuidado. Vamos manter a prática de lavar as mãos, usar a máscara e evitar aglomerações. Cuidado com essa doença, ela é terrível, é um perigo muito grande para todos nós, nosso governo precisa dar mais importância para esse problema. Protejam-se todos porque estamos passando por uma tragédia histórica!”