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    Maitê Lourenço: “O mundo perde muito sendo racista ao escolher sempre os mesmos perfis”

    Fundadora da BlackRocks Startup conta sua trajetória no quadro Vozes Pretas do programa Popverso CNN de sábado (12); "eu quero mostrar que a gente desenvolve soluções inovadoras e tecnológicas", diz ela

    Letícia Vidicada CNN , em São Paulo

    “O ecossistema de startups no Brasil ainda é muito excludente, visto ainda que tecnologia e inovação são associadas única e exclusivamente a um grupo. Em geral, a pessoas brancas que fizeram algum curso fora do país. Mas esse perfil é uma parte importante, mas ele é uma parte do desenvolvimento de inovação.”

    A falta de pessoas negras nos eventos de tecnologia foi o que motivou a psicóloga Maitê Lourenço, destaque do quadro Vozes Pretas no programa Popverso, a pensar em como dar oportunidades para que pessoas negras acessassem esses espaços de negócios também. Daí nasceu a BlackRocks Startup.

    A BlackRocks é uma aceleradora que desenvolve técnicas para que as startups saiam do estágio inicial, modelem seus negócios e possam receber investimentos. Acelerar esses negócios, fazer parcerias com empresas, vender seus produtos de forma adequada é o que faz a Black.

    “Não tem um perfil de empresa, mas precisa, obviamente, ter um fundador negro nessa jornada, pelo menos. A população negra não tem uma rede que pode investir numa ideia e já possa oferecer um dinheiro para investimento.”

    “A gente ainda constrói os nossos negócios com o nosso dinheiro, no dia a dia, fazendo muitas vezes dupla jornada, tripla jornada. Então, requer ainda um desafio muito maior que não é visto, não é valorizado por aqueles que estão no ecossistema”, reforça Maitê que também sentiu o racismo atravessando sua pele ao sempre ser vista como uma das poucas ou únicas pessoas em espaços inovadores e tecnológicos.

    “A gente sabe que o desafio de ser uma mulher negra é três vezes maior do que o desafio de qualquer outra pessoa. Minha mãe, que tem uma sabedoria fundamental na minha vida, dizia que eu tinha que ser três vezes melhor e precisava fazer muito melhor do que os meus coleguinhas da escola. E não porque era pra ser a melhor, mas sim para ser reconhecida como alguém que tinha capacidade de estar ali”, revela Maitê Lourenço que teve uma infância onde havia falta de representatividade preta na TV e ao seu redor.

    “Quando eu estava nos primeiros anos do ensino fundamental, minha mãe tirava todos os lápis pretos e marrons do meu estojo de lápis de cor, giz de cera ou canetinha. Ela fazia isso porque eu só usava essas cores. Isso foi muito simbólico porque a minha mãe tentava me ampliar a possibilidade de eu pintar de outras cores, mas eu queria muito pintar de preto.”

    Caçula de duas irmãs, Maitê conta que seu ponto de partida foi ter sido uma criança negra desafiando todos os processos que a sociedade coloca para ela. Porém, ser filha do Seu Valter e da Dona Ivete trouxe para ela os desafios e as oportunidades.

    “Desde muito cedo, eles entenderam que a nossa obrigação era estudar. Então, eles se esforçaram muito para que a gente pudesse estudar, desenvolver as nossas capacidades físicas ou intelectuais”, conta a fundadora da BlackRocks, que tentou ser jogadora de futebol.

    “Meu maior sonho de infância, por incrível que pareça, era ser jogadora de futebol. Eu consegui fazer peneira na Portuguesa e a Formiga, que é minha ídola, tocou pra mim e eu super errei o gol. Ali que eu percebi que eu tinha que procurar outra coisa que não o futebol.”

    E nessa jornada depois do futebol, Maitê se formou em psicologia, abriu uma empresa de e-commerce de currículos e, daí então, se aproximou do mundo da tecnologia.

    “Eu não deixei de fazer psicologia ao escolher tecnologia. Eu agreguei a psicologia dentro da tecnologia. Somos pessoas que estão ali no dia a dia. Olhar para as startups no final do dia é você olhar para o empreendedor que está fazendo a gestão daquele negócio. Trazer a psicologia para dentro das instituições e dentro do empreendedorismo também é uma forma de fazer psicologia.”

    Uma jornada potente que já lhe rendeu até a capa de uma revista de negócios. E ela não para por aí, já que ainda faz muitos planos importantes para o futuro da sua carreira e dos negros.

    “O futuro da minha carreira é ter alicerces que promovam com mais facilidade o acesso de pessoas negras. Que a gente não tenha que ficar contando histórias pra chegar efetivamente ao que precisa ser de fato mostrado. Hoje, qualquer produto, qualquer serviço ou, até mesmo o trabalho da BlackRocks, eu tenho que mostrar de novo três vezes, quatro vezes o potencial que tem para receber um quarto daquilo que pagariam pra um homem branco ou pra uma instituição branca”, diz Maitê, que vem proporcionando cada vez mais esses acessos.

    Em setembro, a BlackRocks realiza um festival de tecnologia, inovação, empreendedorismo no Centro Cultural São Paulo com o tema ‘Afrofuturismo – a sua caminhada é tão importante quanto à chegada’. Caminhada que ela sabe muito bem que vem de longe.

    “Eu amo viajar. Nossos ancestrais vieram escravizados pro Brasil, então não somos pertencentes a essa terra. Viajar é pertencer aonde os meus pés pisam e eu entendo que é uma forma dos meus ancestrais serem valorizados, que eu posso ocupar qualquer terra de uma forma livre.”

    “Com a força da minha voz eu quero motivar cada vez mais, que pessoas negras ocupem o lugar que elas quiserem ocupar. Com a força da minha voz, eu quero provocar lideranças que têm a caneta para assinar projetos e que, muitas vezes, preferem continuar no senso comum porque têm uma rede relacional e poucos querem sair dessa rede. Eu quero provocar e provocar para inovar.”

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