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    Berço da Mostra de SP, Vão do MASP terá exibição de filmes nacionais dirigidos por mulheres

    Diretoras conversaram com a CNN sobre o processo de criação dos longas e a importância de ter as produções projetadas no simbólico espaço

    Sessão em 29 de outubro de 2013, na 37ª Mostra, quando exibimos "São Paulo, Sociedade Anônima" (1965), clássico do cinema paulistano dirigido por Luís Sérgio Person
    Sessão em 29 de outubro de 2013, na 37ª Mostra, quando exibimos "São Paulo, Sociedade Anônima" (1965), clássico do cinema paulistano dirigido por Luís Sérgio Person Marcos Pacheco/Agência Foto/Divulgação

    Isabella Fariada CNN

    São Paulo

    Foi no Vão-livre do MASP (Museu de Arte de São Paulo) que a Mostra Internacional de Cinema de São Paulo nasceu, em 1977 e, desde então, o lugar é palco de diversas exibições gratuitas de filmes do mundo todo. Esse ano, é a vez do Brasil. E, dessa vez, os filmes foram dirigidos por duas mulheres.

    Um documentário e uma ficção. Uma história que se passa em uma grande metrópole e outra que acontece no interior do estado de São Paulo. Uma homenagem a um dos maiores artistas nacionais da atualidade e uma crônica sobre o absurdismo do Brasil de 2022. Um emociona, o outro causa angústia.

    Essas foram algumas características citadas pelas autoras Lina Chamie e Carolina Markowicz que, só de estarem na 46ª Mostra Internacional de Cinema de São Paulo, já se sentem lisonjeadas.

    “A gente aprende a fazer filmes, vendo filmes”, diz Lina, “e os festivais de cinema são esses oásis, além de serem exercícios de formação, tanto para a plateia, quando para o cineasta.”

    Para Lina, além de ser uma vitrine para as produções nacionais, festivais funcionam como lembretes de que o cinema nacional existe.

    “Com todo esse projeto que vemos de desconstrução da cultura, a sobrevivência dessas mostras revela o quão importante é o Cinema como identidade e como mercado”.

    Um mercado, inclusive, que segue abalado. Nesse período pós-pandemia que se inicia, as salas de cinema estão mais vazias e, para Carolina Markowicz, festivais podem mudar um pouco a mentalidade do espectador.

    “Nosso cinema é maravilhoso, segue forte, apesar das dificuldades, e as pessoas têm que absorver isso e sair de casa para ver o que produzimos”, disse Carolina.

    Veterana nos curtas-metragens, mas estreante nos longas, Carolina se sente honrada de ter seu filme, “Carvão”, exposto para mais de 500 pessoas, no Vão-Livre do Museu de Arte de São Paulo, um cartão-postal da cidade.

    “É uma sessão super democrática, para centenas de pessoas, gratuita, estou muito ansiosa”, afirmou.

    “Carvão” é um suspense brasileiro que conta a história de uma família do interior do estado de São Paulo. Eles tem uma carvoaria e um patriarca doente, que não anda e nem fala. Um dia, recebem uma proposta macabra: devem se livrar do patriarca e, por uma grande quantia de dinheiro, abrigar um estrangeiro misterioso em sua casa o que, claro, abala fortemente a estrutura da família.

    Tendo escrito várias versões do roteiro, Carolina acabou acatando uma versão final que, segundo ela, escancara o absurdo presente no Brasil atual.

    “Acho que o momento que a gente vive é muito louco”, diz ela, que continua.”De repente, começa um debate presidencial e aparece um padre de festa junina… Me pergunto, da onde surgiu isso?”.

    Para ela, tudo é “feito em nome de Deus” atualmente e isso é passado diretamente para o filme. Ainda com a tela escura, no início do longa, uma música religiosa do Padre Marcelo Rossi começa para, cerca de 20 minutos depois, vermos uma cena de um idoso sendo jogado em uma fornalha acesa.

    Apesar de imagens fortes, “Carvão” é de uma grande sutileza e sensibilidade. Nenhum sentimento dos personagens é muito explícito, quase tudo fica nas entrelinhas, instigando o espectador.

    “Já me perguntaram o que eu pensava sobre o final do filme, e a ideia é justamente essa, das pessoas questionarem”, explicou Carolina.

    “Eu gosto de o filme terminar na cabeça de quem assiste”, complementa.

    “Carvão”, portanto, cutuca o comportamento social brasileiro, criticando o conservadorismo e “Kobra Auto Retrato” segue na mesma linha, mostrando que alguns aspectos do status quo já mudaram.

    “Eu acredito que ao conhecer a história dele, a gente entende e aprecia melhor a obra do Kobra”, afirmou Lina.

    Diretora e artista não se conheciam antes do filme, foram apresentados por um amigo em comum. Lina Chamie propôs fazer um filme sobre a vida do artista e ele topou na hora.

    “Ele vem da periferia do Campo Limpo [periferia de São Paulo], enfrenta diversas dificuldades, trava batalhas e ganha”, expica. “É uma história que ressoa com muitas outras”.

    De forma muito lúdica, somos apresentados à história de Eduardo Kobra, um muralista que, após sofrer rejeição da família por conta de sua arte e passar por um período de depressão profunda, fez seus murais em dezenas de países.

    “Passamos dois dias dentro do estúdio e nossa conversa foi a espinha dorsal para o meu filme”, diz Lina. “Filmei os murais dele em um segundo momento, então absorvi tudo que ele me contou e passei para o longa”.

    Durante três anos, Lina guardou um caderno com todas as anotações sobre o filme. No último dia da pós-produção, as folhas do caderno acabaram.

    “Quando mostrei o filme para o Kobra, levei meu caderno na última página, ele escreveu: ‘Amamos o filme’, ali senti que minha missão estava cumprida”, contou Lina.

    Porém, segundo ela, com essa exibição no Vão-Livre do MASP, o filme ganhou uma dimensão ainda maior. Para ela, o objetivo do longa é ocupar a cidade de todas as formas.

    “O Kobra curte muito o MASP, ele queria, inclusive, pintar as vigas do Museu e, de certa forma, agora estaremos pintando um pouco o espaço”, afirmou a diretora.

    O muralista fez a arte desse ano da Mostra Internacional de São Paulo: uma menina alcançando a famosa lua retratada no filme “Viagem à Lua” (1902), de Georges Méliès. Para Lina, o significado dessa ilustração é o significado do próprio cinema.

    “É a ideia de não arredar pé do sonho, do que a gente quer perseguir e a Mostra faz justamente isso, nos traz filmes, nos deixando sonhar e resistir”.

    Serviço:

    “Kobra Auto Retrato”, de Lina Chamie, sexta-feira (21), às 19h30.

    “Carvão”, de Carolina Markowicz, sábado (22), às 19h30.

    O espaço tem capacidade para 500 pessoas e os ingressos gratuitos estarão disponíveis para retirada a partir das 18h30 de cada dia de exibição.