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    Spotify está brigando com a Apple por causa do Apple One; entenda o motivo

    Segundo o Spotify, do modo como foi configurado o pacote de serviços da Apple prejudicará os concorrentes e poderá limitar as opções dos consumidores

    Logo do Spotify em Nova York
    Logo do Spotify em Nova York Foto: Lucas Jackson/Reuters

    Clare Duffy,

    do CNN Business, em Nova York

    O novo pacote de assinatura da Apple, Apple One, dará aos consumidores a chance de experimentar vários novos serviços da Apple e, possivelmente, economizar alguns dólares.

    Mas nem todo mundo está comemorando a nova oferta – em especial o concorrente da Apple Music, o Spotify. Pouco depois de apresentar o Apple One na terça-feira (15), Spotify criticou o pacote, chamando-o de “anticompetitivo”. O Spotify pediu aos órgãos reguladores dos EUA que investigassem o Apple One.

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    A fabricante do iPhone já enfrenta uma investigação antitruste: a Epic Games, dona do Fortnite, está atualmente processando a Apple e o Google nos Estados Unidos após a remoção do Fortnite de suas lojas de aplicativos, alegando que ambas são monopólios. Google e Apple disseram que o Fortnite foi removido por violar suas políticas de loja de aplicativos, e a Apple processou a Epic de volta.

    Em junho, órgãos reguladores europeus anunciaram investigações antitruste formais na política de compras no aplicativo na App Store da Apple e seu sistema Apple Pay, após reclamações do Spotify e da Rakuten. Em resposta às investigações na Europa, a Apple disse que era “decepcionante” ver a comissão apresentar “queixas infundadas de um punhado de empresas que simplesmente querem uma carona gratuita e não querem jogar pelas mesmas regras que todo mundo”.

    Sobre o novo pacote Apple One, um porta-voz do Spotify declarou no dia 15: “Mais uma vez, a Apple está usando sua posição dominante de práticas injustas para prejudicar os concorrentes e privar os consumidores, favorecendo seus próprios serviços”.

    Segundo o Spotify, do modo como foi configurado o pacote de serviços da Apple prejudicará os concorrentes e poderá limitar as opções dos consumidores.

    A Apple diz que os clientes ainda podem “descobrir e desfrutar de alternativas para cada um dos serviços da Apple”.

    “Estamos apresentando o Apple One porque ele é de grande valor para os clientes e uma maneira simples de acessar toda a gama de serviços de assinatura da Apple”, afirmou um porta-voz da empresa em um comunicado à CNN Business.

    “Vamos recomendar o plano Apple One, que economiza mais dinheiro com base nas assinaturas que as pessoas já têm. Ele é ideal para famílias e para quem adora qualquer um dos nossos serviços e quer mais por menos. Além disso, alguns serviços incluídos no Apple One estão disponíveis para desfrutar em dispositivos que não sejam da Apple e você pode cancelar tudo a qualquer momento”.

    Especialistas jurídicos dizem que o argumento do Spotify provavelmente funcionaria assim: ao agrupar o Apple Music com outros serviços da Apple (incluindo várias combinações de iCloud, Apple TV+, Apple Arcade, Apple Fitness+ e Apple News+), a Apple pode tornar mais barato e fácil para os clientes escolherem o Apple Music em vez de outros serviços de assinatura de música, como o Spotify.

    Planos individuais para somente Apple Music e Spotify começam em US$ 9,99 por mês (ambos oferecem planos de estudante de US$ 4,99), e o pacote básico do Apple One começa em US$ 14,95 por mês, incluindo dois outros serviços de assinatura e 50 gigabytes de armazenamento. Assim, com o pacote, os consumidores receberão mais três serviços por apenas US$ 5 extras por mês.

    Alguns especialistas jurídicos acreditam que a alegação do Spotify pode ser legítima o suficiente para chamar a atenção dos reguladores antitruste. Mas a lei antitruste dos EUA é complicada e seria uma luta difícil para os reguladores vencerem.

    “Na Europa e nos Estados Unidos, há uma teoria de responsabilidade segundo a qual um monopolista pode ser processado por vincular ou agrupar serviços diferentes”, explicou Chistopher Sagers, professor de direito da Universidade Estadual de Cleveland. “Porém, isso é difícil. Especialmente sob a lei dos EUA, é complicado provar que amarrar ou agrupar é ilegal.”

    Há algo de errado com o pacote?

    Olhando apenas para o pacote de serviços, uma reclamação antitruste bem-sucedida teria que provar, primeiro, que a Apple tem uma participação de mercado significativa (provavelmente superior a 30%) em qualquer um dos serviços que estão sendo agrupados, de acordo com o professor Maurice Stucke, da Faculdade de Direito da Universidade do Tennessee.

    Como os serviços da Apple ainda estão disponíveis individualmente fora do pacote, Stucke disse que os reguladores provavelmente teriam que demonstrar que a Apple havia tornado o preço do pacote tão atraente que os consumidores quase certamente iriam querer comprar o pacote, mesmo que não se importassem necessariamente com todos os serviços incluídos nele.

    De acordo com esse argumento, nesse caso os consumidores seriam desencorajados a comprar serviços de empresas terceiras.

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    Por essa análise, um caso contra a Apple provavelmente não teria sucesso. Embora a Apple não tenha divulgado o número de assinantes para todos os seus serviços, os especialistas acreditam é improvável que eles detenham individualmente uma participação significativa do mercado. Quanto à segunda parte, os consumidores ainda podem comprar os serviços da Apple individualmente, e alguns dólares em economia provavelmente não são suficientes para fazê-los comprar o pacote se não quiserem todas as assinaturas, segundo Sagers, o professor de direito em Cleveland.

    Como a Apple não exige que os consumidores comprem os serviços do pacote, Sagers disse que os tribunais tendem a ver o Apple One como um exemplo de competição de preços, o que não é ilegal.

    “Não é como se ela exigisse que as pessoas comprem mais coisas, e sim que está tornando seus produtos mais baratos para que as pessoas os escolham”, afirmou.

    A enorme vantagem do iOS da Apple

    O iOS 14, da Apple
    O iOS 14, da Apple
    Foto: Apple

    A enorme plataforma iOS da Apple, usada em quase 1 bilhão de dispositivos móveis em todo o mundo, oferece uma vantagem natural sobre outros fabricantes de aplicativos: a Apple pré-instala seus próprios serviços nos dispositivos. Ao oferecer também um pacote que pode economizar o dinheiro dos consumidores nesses serviços pré-instalados, os especialistas jurídicos dizem que a Apple pode tornar a escolha de seus serviços mais fácil e atraente do que a instalação de um aplicativo rival.

    “No contexto do Spotify, uma vez que a Apple controla o iOS, ao oferecer um pacote desses serviços, será muito fácil pegar o Apple Music e, de repente, o mercado para esses serviços de streaming será distorcido”, analisou Ketan Jhaveri, presidente da consultoria de dados jurídicos Bodhala e ex-advogado antitruste do Departamento de Justiça.

    Esse argumento remonta ao caso antitruste do governo dos Estados Unidos contra a Microsoft no final dos anos 1990, no qual a Microsoft foi acusada de dificultar o acesso dos consumidores aos navegadores de outras empresas porque o Internet Explorer vinha pré-instalado em dispositivos Windows.

    Nesse caso, um juiz afirmou que a Microsoft detinha o poder de monopólio no mercado de sistemas operacionais para PC e que suas ações prejudicavam os consumidores. Em seguida, a Microsoft fez um acordo para restringir algumas de suas práticas que o governo considerou prejudiciais aos concorrentes.

    Ainda assim, a Apple pode ter uma defesa forte. A empresa pode argumentar que sua plataforma iOS é menor que o sistema operacional Android do Google, e as pessoas ainda podem baixar facilmente o Spotify na App Store.

    A dona do iPhone poderia ter outra defesa em potencial: o pacote é bom para seus clientes.

    “Queremos tornar mais fácil para todos descobrir e desfrutar” dos serviços da Apple, disse Lori Malm, diretora de serviços da empresa, no evento de terça-feira. “É tudo para toda a família, por um preço incrível”, afirmou.

    Nos Estados Unidos, o argumento de que algo economiza dinheiro para os consumidores costuma ser bem-sucedido em casos antitruste, lembrou o consultor Jhaveri. “É um argumento vencedor. Se for melhor para os consumidores, tudo é possível nos Estados Unidos”.

    Mais preocupações com as big techs

    À medida que cresce a preocupação com o poder dos gigantes do Vale do Silício, as investigações antitruste das grandes empresas de tecnologia se concentra na capacidade de usar suas plataformas massivas para dar preferência a seus próprios produtos e serviços acima dos de outras empresas.

    Em uma audiência no Congresso em julho, por exemplo, o CEO da Amazon, Jeff Bezos, foi questionado sobre o uso de dados de vendedores terceirizados em sua plataforma para informar suas próprias decisões de produtos de marca própria. Trata-se de uma preocupação importante sobre a abordagem da empresa em relação à concorrência. Bezos admitiu que a empresa pode ter se engajado nessa prática.

    E a investigação do Google feita pelo Departamento de Justiça incluiu inquéritos para saber se o Google Search usado em pesquisas nos dispositivos Android (o maior sistema operacional móvel do mundo) prejudica outros mecanismos de busca. O Google disse estar cooperando com os investigadores e focado “em fornecer serviços que ajudem os consumidores, apoiem milhares de empresas e possibilitem maior escolha e competição”.

    “Há toda essa preocupação que vem junto com questão da preferência pessoal”, disse Stucke, da Universidade do Tennessee, que também foi coautor de “Competition Overdose” (“Overdose de competição”, sem tradução no Brasil). “Deseja-se que eles inovem, mas, assim que começarem a competir com outros em suas plataformas, há esse incentivo para que se favoreçam e prejudiquem seus rivais”.

    Nos últimos anos, essas alegações tiveram mais sucesso na União Europeia do que nos Estados Unidos, o que pode explicar por que o Spotify até agora fez seus protestos na Europa.

    “A UE se tornou o regime dominante antitruste”, disse Jhaveri. “Eles têm uma visão diferenciada, que é: se expulsarmos todos os concorrentes, no final das contas algo será ruim para os consumidores”.

    Mas dada a atenção recente do Departamento de Justiça às preocupações antitruste em torno da big techs, Jhaveri disse que o Spotify poderia estar pensando: “Ei, podemos conseguir uma audiência com o governo Trump agora”.

    (Texto traduzido, clique aqui para ler o original em inglês).

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