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    Queda nas vendas do varejo reforça fim do ciclo de juros, dizem analistas

    Recuo das vendas do setor em julho indica impacto de altas de juros, e pode contribuir para confirmação de fim do ciclo

    Taxa Selic foi elevada pela última vez em agosto, para 13,75% ao ano
    Taxa Selic foi elevada pela última vez em agosto, para 13,75% ao ano Getty Images

    João Pedro Malardo CNN Brasil Business

    em São Paulo

    A queda de 0,8% nas vendas do varejo em julho refletem, além da inflação em alta, os efeitos do ciclo de alta de juros no Brasil — sobretudo no que diz respeito ao encarecimento do crédito –, e podem influenciar nos próximos passos do Comitê de Política Monetária (Copom), afirmam analistas ao CNN Brasil Business.

    O recuo foi o terceiro mensal consecutivo, com nove das dez atividades pesquisadas registrando queda no período. O desempenho negativo ocorreu tanto no varejo restrito quanto no ampliado, que inclui atividades de veículos, motos, partes e peças e de material de construção.

    O dado foi divulgado uma semana antes da próxima reunião de política monetária do Banco Central. A visão atual da maior parte do mercado é que o comitê confirmará o fim do ciclo de alta de juros, mantendo a taxa Selic em 13,75%, e os números do varejo podem confirmar esse quadro.

     

    André Perfeito, economista-chefe da Necton, considera que os dados de julho “decepcionaram”, em especial porque o mercado esperava um crescimento para as vendas no varejo, não queda.

    Ele destaca que a única categoria pesquisada que não teve queda foi a de combustíveis e lubrificantes, cujo desempenho positivo ele atribui às medidas do governo de redução de impostos.

    “Os dados sugerem que a atividade está ainda frágil, e se não fosse o esforço fiscal em derrubar a gasolina, o resultado poderia ter sido ainda pior”, avalia.

    O desempenho ruim comércio também pode ser relacionado à dificuldade de acesso ao crédito motivado pelo alto endividamento das famílias,  diz o economista Guilherme Sousa, da Ativa, em nota, “podendo refletir também parte da antecipação do consumo vivido ao longo dos últimos anos, e a perda de poder compra pelo avanço inflacionário”.

    Fim do ciclo

    O economista afirma que os dados reforçam um cenário de fim do ciclo de alta na taxa Selic, mesmo com uma reprecificação de juros nos Estados Unidos, com o mercado passando a esperar taxas maiores.

    Considerando uma atividade doméstica com melhor,a mas sobre uma base de comparação baixa, Perfeito afirma que “não faz sentido, em tese, desacelerar ainda mais a atividade econômica com vistas a controlar os preços”.

    Já Rodolfo Margato, economista da XP, não espera um “impacto direto” do dado na decisão do Copom, “porque temos observado sinais mistos oriundos da atividade doméstica no período recente”.

    Apesar da surpresa negativa do varejo dar base para um fim do ciclo de juros, ele pondera que o crescimento do setor de serviços em julho, acima do esperado, indica um “sólido ritmo de crescimento do setor e sem sinal de alívio, sendo um vetor positivo para a atividade local”.

    “Temos cada vez mais sinais consistentes de consumo de serviços ainda sólido, como beneficio da reabertura, mas ao mesmo tempo uma piora do consumo de bens, algo que o Copom já chegou a debater recentemente. Isso tem implicação sobre a inflação, a inflação de serviços que ainda preocupa, em patamar elevado, enquanto a de bens começa a ceder”, explica.

    Nesse sentido, ele afirma que o Copom pode indicar um reforço dessa avaliação na comunicação pós-reunião, com sinais heterogêneos da atividade, mas que o dado não deve impactar a decisão em si.

    O economista-chefe da RPS, Victor Candido, pontua que o recuo nas vendas do varejo mostra que “a gente está passando por uma desaceleração de consumo”, reflexo de um encarecimento do crédito, ligado à alta de juros.

    Ao mesmo tempo em que há uma desaceleração no consumo de bens, há uma aceleração no consumo de serviços, o que aponta um terceiro trimestre ainda de crescimento do Produto Interno Bruto (PIB), mas menor, e uma estabilidade no quarto trimestre, sinalizando que os juros altos já contribuem para a desaceleração da economia.

    Ele acredita que o dado “tem influência” no Copom, sendo uma informação importante que “mostra que está começando a ter uma mudança relevante na cesta de consumo de bens pra serviços. E acho que esse dado mostra que tem algum efeito do ciclo de crédito em bens. E isso é muito importante para o Banco Central”.

    Já acreditando em uma manutenção da Selic em 13,75% na reunião de setembro, o economista-chefe da Órama, Alexandre Espírito Santo, diz que o resultado “mostra que a recuperação da economia pós-pandemia, apesar de estar ocorrendo, ainda é um desafio”.

    “De qualquer forma, não considero que esse número em si seja determinante para influenciar na decisão do Copom do dia 21. Creio que o BC já consegue ver algum controle sobre a inflação, mas precisa estar vigilante”, afirma.

    A projeção do economista é que a Selic precisará ficar em um patamar elevado por “bastante tempo” para haver uma convergência da inflação com as metas. Ele espera que o Copom “só irá reduzir a Selic na antepenúltima ou penúltima reunião de 2023, e encerre o ano que vem entre 10,75% e 11,75%”.

    Também ressaltando que os itens do varejo mais sensíveis ao crédito tiveram uma redução maior nas vendas nos últimos meses, Claudia Moreno, economista do C6 Bank, acredita que a tendência é de desaceleração no setor, mesmo que ela seja aliviada em partes pelo aumento no valor do Auxílio Brasil e da massa salarial, ligada à queda do desemprego.

    A economista não acredita que o dado de julho seja suficiente para mudar a postura do Copom, mas espera que o comitê não elevará os juros, sinalizando o fim do ciclo.

    “Mas a gente não descarta que ele possa vir a subir os juros em 0,25 p.p., já que deixou essa porta aberta na última ata e em eventos com os principais diretos do Banco Central”, destaca.