Onda de calor impacta soja e milho e pode explicar estimativa pior para safras de 2024, diz Embrapa
Altas temperaturas e restrição hídrica geram dúvidas sobre semeadura da soja e impactam indiretamente milho de segunda safra; IBGE prevê queda em 2024
Pesquisador da Empresa Brasileira de Pesquisa Agropecuária (Embrapa), Gilberto Cunha afirmou em entrevista à CNN que a atual onda de calor — que vem associada a menor volume de chuvas, em resultado do El Niño — impacta negativamente duas das principais culturas agrícolas do país, soja e milho.
Cunha explica que o El Niño gera dúvidas em produtores sobre quando semear a soja, e esse atraso afeta indiretamente o milho de segunda safra, plantado após a colheita da soja, no final do verão.
“Quanto mais se atrasa a soja, mais se predispõe a cultura do milho aos riscos de problemas de seca. A agricultura brasileira sofre estes impactos negativos”, disse.
Temperaturas altas e tempo seco fazem parte da realidade da maior parte do Brasil, exceto no Sul, que vive situação oposta.
A região vem sendo atingida por volumes de chuva acima da média, que também trazem impactos negativos para algumas culturas, como o trigo, explica Felippe Serigati, pesquisador da FGV Agro.
Com baixa luminosidade e alta irrigação, a qualidade da safra pode ficar pior e o produto ser direcionado ao consumo animal, em vez de humano.
Por outro lado, Cunha, da Embrapa, indica que a situação tende a beneficiar a soja e milho cultivados nas regiões abaixo do estado do Paraná.
IBGE estima queda na produção
O Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE) publicou na última semana seu primeiro prognóstico para a safra de 2024 e estimou 308,5 milhões de toneladas em grãos, cereais e leguminosas.
Caso se confirme, a produção deverá ser 2,8% inferior a deste ano.
Segundo Sérgio Vale, economista-chefe da MB Associados e consultor Associação Brasileira do Agronegócio (Abag), há relação entre a queda e os impactos do El Niño.
“Certamente as questões climáticas, o El Niño, podem atrapalhar a safra. Estaremos longe do crescimento muito forte que tivemos neste ano”.
O pesquisador da Embrapa reitera os possíveis impactos negativos para a produção agrícola do próximo ano, mas indica que ainda é cedo para mensurar o tamanho, já que ainda é período de semeadura das principais culturas.
Serigati, da FGV Agro, também vê redução na produção do campo em comparação ao ciclo anterior, mas ressalta que “não se bate recorde todo ano”.
Super El Niño
Cunha afirma que o El Niño estava no radar e já era amplamente anunciado desde abril, porém, destaca a dificuldade em prever o tamanho do impacto das mudanças geradas pelo fenômeno.
“O mais difícil é lidar com essas previsões. Não se constrói resiliência climática no pré-safra. Isso é um processo de longo prazo e, dependendo do nível da anomalia climática, não há prática de manejo de cultura, tecnologia que resista”, diz.
Para Vale, este “Super El Niño” também se relaciona com as mudanças climáticas e ocorre pelo aumento da temperatura geral.