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    O pior já passou? Economistas avaliam o que esperar para o PIB até o fim do ano

    Especialistas ouvidos pelo CNN Brasil Business são categóricos: o PIB terminará o ano no vermelho; a dúvida é quão profunda será a recessão

    Pessoas caminham por rua de comércio popular em São Paulo - 15/07/2020
    Pessoas caminham por rua de comércio popular em São Paulo - 15/07/2020 Foto: Amanda Perobelli/Reuters

    Natália Flach, Manuela Tecchio, Matheus Prado e Paula Bezerra, do CNN Brasil Business, em São Paulo

    A queda de 9,7% do Produto Interno Bruto (PIB) brasileiro, no segundo trimestre, foi o fundo do poço. No entanto, isso não significa que a retomada econômica será rápida, como costuma falar o ministro da Economia, Paulo Guedes. É provável que o recuo no terceiro trimestre seja menor, mas, ainda assim, trata-se de uma retração. Especialistas ouvidos pelo CNN Brasil Business são categóricos: o PIB terminará o ano no vermelho; a dúvida é quão profunda será a recessão. 

    “Estamos apenas saindo do fundo do poço. Claro, não acredito que vamos ver outro tombo como esse no próximo trimestre, talvez seja uma queda de 2,5% ou, com sorte, ficaremos no zero a zero. Mas nada que vai compensar as perdas”, afirma Fernando Leite, professor de economia do Insper. Para o especialista, o percentual vai depender de uma dose política.

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    Além da permanência de Guedes no cargo, depende de quem vai ganhar a queda de braço: os militares que querem aumentar os investimentos em infraestrutura ou a ala econômica que quer controlar os gastos. 

    A princípio, parece que o grupo que prefere um cheque governamental mais gordo saiu na frente. É que o presidente Jair Bolsonaro anunciou, nesta terça-feira (1), a extensão do auxílio emergencial até dezembro, com valor de R$ 300. Isso deve puxar o consumo das famílias e injetar o equivalente a R$ 100 bilhões na economia.

    “O governo irá jogar de helicóptero, por assim dizer, mais 1,4% do PIB, e isto explica em grande parte minha revisão do PIB, que passou de queda de 7,5% para retração de 6% no ano”, afirma André Perfeito, economista-chefe da Necton Investimento.

    Marcelo Neri, economista e diretor do FGV Social, lembra que o consumo caiu muito, mas o tombo seria muito maior, não fosse o auxílio emergencial. “Esse dado é surpreendente, porque mostra que este governo se destacou com uma política keynesiana, com transferência de renda”, diz. “Teremos algum nível de retomada em 2021, mas diria que em formato de raiz quadrada.”

    Já Alexandre Espírito Santo, economista da Órama Investimentos, estima que o PIB deve encerrar 2020 com uma contração de 5,5%. “O consumo das famílias foi muito penalizado, algo que já era esperado. Por sua vez, o agronegócio mostrou alguma resiliência, algo positivo durante a pandemia.”

    Com a reabertura de parte do comércio em algumas cidades brasileiras, a expectativa é que haja uma retomada gradual da demanda das famílias, assim como da produção industrial. “Também devemos ver uma queda menos acentuada nos gastos do governo”, afirma Alessandra Ribeiro, sócia da Tendências Consultoria.

    É que, entre abril e junho, o recuo dos gastos foi de 8,8%, ante uma estimava de retração de 1,4%. “Já do lado da oferta, os principais vetores da retomada serão indústria e serviços, que foram os que mais apanharam no segundo trimestre.”

    Desafios para os próximos meses

    Um dos principais desafios será a criação de empregos, afinal muitos autônomos perderam renda com a pandemia – só não foi pior pelo benefício do auxílio emergencial, que será prorrogado com um valor inferior.

    “Dessa forma, se a atividade econômica continuar fragilizada e não conseguir avançar em empregos, teremos menos geração de renda”, afirma Sílvia Matos, coordenadora do Boletim Macro do FGV Ibre e pesquisadora sênior da área da Economia Aplicada do FGV Ibre. Para Matos, a retração em 2020 deve ser de 5,4%. “Já em relação à recuperação, teremos sinais de recuperação a partir do terceiro trimestre.”

    Para Victor Beyruti, economista da Guide Investimentos, a recuperação no segundo semestre deve dar o tom dos mercados daqui para frente. Isso porque a queda acentuada do PIB já estava precificada pelos investidores.

    “Na quinta temos os dados da produção industrial de julho. É o primeiro grande indicador. Queremos saber como a nossa economia entrou no segundo semestre”, afirma Beyruti. Para o especialista, o foco do dia é o anúncio da retomada da reforma administrativa – que vai incidir apenas os servidores que vierem a ser aprovados em concursos públicos – e a extensão do auxílio emergencial de R$ 300 de setembro a dezembro. 

    Confira abaixo a opinião dos especialistas ouvidos pelo CNN Brasil Business sobre o desempenho da economia brasileira:

    Alessandra Ribeiro, sócia da Tendências Consultoria

    O PIB veio um pouco pior do que o esperado. Esperávamos queda de 9,2%. Do lado de indústria e de serviços veio um pouquinho pior, mas o que chama atenção foi o agronegócio — prevíamos um ganho de 1,5% e veio apenas 0,4%.

    Quando analisadas as linhas serviço, houve aumento nas intermediações financeiras e comunicações, um contrapondo a outras linhas como transportes que tiveram retração. Já a demanda das famílias também veio um pouco pior em 12,5%, ante os 11,5% esperados. Outra grande surpresa foram os gastos do governo que tiveram uma queda de 8,8%, muito maior do que esperávamos de 1,4%. Por sua vez, o setor externo veio positivo – com aumento nas exportações e recuo expressivo das importações. Isso pode ter a ver com a queda no governo. 

    O terceiro trimestre deve mostrar um ganho marginal, mas ainda assim uma queda. Deve vir com uma retração de 7%. Esse número deve ser resultado de uma volta da demanda das famílias, com a reabertura do comércio e da produção industrial. Além disso, os gastos com governo devem cair menos do que no segundo trimestre. Já do lado da oferta, os vetores que mais apanharam entre abril e junho, indústria e serviços, devem apresentar uma retomada.

    Fernando Leite, professor do Insper

    Não houve muita surpresa em relação às projeções recentes. Em maio e junho, a atividade econômica já mostrava uma recuperação econômica, que foi um resultado direto da nossa desobediência civil. No que pesem os mortos, essa elasticidade no respeito à quarentena, que afrouxou de maio para frente, deu algum alento para atividade econômica.

    Estamos em um momento de extrema incerteza, que fica ainda mais intenso quando você vê que, em países onde a situação já estava controlada, houve uma inversão da curva. O PIB está diretamente relacionado às medidas de restrição, portanto vai depender muito disso.

    Falar em ‘recuperação’ soa meio parrudo demais. Estamos apenas saindo do fundo do poço. Claro, não acredito que vamos ver outro tombo como esse no próximo trimestre, talvez seja uma queda de 2,5% ou, com sorte, ficaremos no zero a zero. Mas nada que vá compensar as perdas.

    Isso tudo [a recuperação] depende do [Paulo] Guedes ficar e de quem vai conseguir construir uma hegemonia no palácio do planalto: os militares gastadores, da infraestrutura, ou dos economistas que estão tentando controlar.

    Marcelo Neri, economista e diretor do FGV Social

    A queda de 9,7% é um valor comparável com a média da OCDE, mas a pandemia demorou mais tempo para chegar aqui, e, consequentemente, vai demorar mais para sair. Também houve revisão importante do resultado do primeiro trimestre. 

    O consumo caiu muito, mas o tombo seria muito maior se não fosse o auxílio emergencial. Esse dado é surpreendente, porque mostra que este governo se destacou com uma política keynesiana, com transferência de renda.

    Entre setores, o agronegócio se salvou e a indústria teve forte queda. O resultado como um todo é espetacularmente ruim, porque nos coloca de volta em 2009. O brasileiro tem agora menos renda do que tinha antes da crise anterior.

    Agora, com o anúncio de que o auxílio será reduzido para R$ 300, deve haver efeito negativo no indicador de consumo das famílias. Posto isso, os valores do segundo trimestre serão os piores.

    Quando olhamos para os dados do mercado de trabalho no segundo trimestre, houve queda na renda e aumento na desigualdade. O lado real da economia mostra queda ainda maior. Para 2021, teremos algum nível de retomada, mas diria que em formato de raiz quadrada.

    Sílvia Matos, coordenadora do Boletim Macro do FGV IBRE e pesquisadora sênior da área de Economia Aplicada do FGV IBRE

    A queda do segundo trimestre veio acima do que esperávamos. Prevíamos um tombo de 8,8% e o resultado nos mostrou o recuo de 9,7%. Segundo nossa análise, o principal motivo para o recuo foi em relação aos gastos com saúde pública e educação pública. Por isso, avaliamos que foram questões pontuais e atreladas à pandemia.  Não achamos que seja um evento que vai perdurar.

    Os principais desafios para a economia agora, porém, está em relação à criação de empregos. Isso porque muitos informais perderam renda com a pandemia – e, claro, só não foi pior pelo benefício do auxílio emergencial, que será prorrogado com um valor inferior. Dessa forma, se a atividade econômica continuar fragilizada e não conseguir avançar em empregos, teremos menos geração de renda. 

    Para o ano, porém, nossa projeção é de retração de 5,4%. Já em relação à recuperação, teremos sinais de recuperação a partir do 3º trimestre.

    Alexandre Espírito Santo, economista da Órama Investimentos

    O resultado ficou abaixo das nossas expectativas, que apontavam para uma queda de 9,3%. O agronegócio mostrou alguma resiliência, algo positivo durante a pandemia. O consumo das famílias foi muito penalizado, algo que já era esperado. 

    Não creio que esse número tenha influência sobre o comportamento do mercado financeiro. O mais importante é observarmos o desempenho da economia no terceiro trimestre. A nossa aposta é uma recuperação lenta, com o PIB de 2020 caindo 5,5%.

    Victor Beyruti, economista da Guide Investimentos

    É natural essa queda por causa da parada abrupta de diversos setores da economia. E o medo de contrair a doença ainda está atrapalhando a recuperação. 

    Na minha visão, isto já estava precificado pelo mercado e algo que vai fazer preço a partir de agora é a recuperação no segundo semestre.

    Na quinta temos os dados da produção industrial de julho. É o primeiro grande indicador. Queremos saber como a nossa economia entrou no segundo semestre. Esse tombo no segundo semestre já era esperado e o foco do dia ainda é a parte fiscal, com a extensão do auxílio emergencial.

    Eduardo Moreira, economista e escritor

    Para aqueles que gostam da metáfora do bolo, existe um bolo 10% menor para ser distribuído entre brasileiros e brasileiras. Quando a gente decompõe esse resultado, vemos que a indústria teve uma queda de 12,3%, o setor de serviços uma queda de 9,7% e a agropecuária uma pequena alta de 0,4%.

    Olhando para frente, se imagina que alguma recuperação vá acontecer. Afinal de contas, a demanda das famílias, o consumo das famílias, não teve uma queda tão grande esperada, principalmente por causa do auxílio emergencial de R$ 600 que essas famílias tiveram.

    Mas é uma queda que preocupa, porque vai encontrar um país que já vinha em 2019 com um crescimento muito abaixo do esperado. Um mundo com atividade econômica muito deprimida e um setor nacional com uma capacidade pública de investir muito pequena e uma capacidade privada limitada pela desconfiança dos empresários.

    Talvez os números sejam percentualmente altos, porque vão ser comparados com uma base muito pequena, o que a gente chama de efeito base. Algo que caiu de 10 para 2, caiu 80%. Se sobe de 2 para 4, subiu 100%. Mas, está ainda 60% abaixo do que estava antes. Temos que tomar cuidado com os números que vão ser divulgados daqui em diante. 

    Por fim, pensar numa recuperação em V não é algo que me parece de bom senso. E mesmo assim, não podemos jamais nos esquecer que qualquer recuperação não vai compensar o desastre que foi a administração do governo federal em relação à crise sanitária. Mais de 120 mil pessoas morreram no Brasil, e nenhuma recuperação econômica vai justificar essas vidas que foram perdidas indevidamente. Mortes que poderiam ser evitadas.

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