Inspirada em teias de aranha, startup japonesa inventa tecidos mais sustentáveis
Com material sintético molecularmente idêntico à seda de aranha, a empresa Spiber desenvolveu uma variedade de tecidos que são alternativas sustentáveis à lã, cashmere e jeans
Cinco vezes mais forte que o aço, as qualidades únicas da seda de aranhas foram reconhecidas pelos gregos antigos — e, mais recentemente, os cientistas analisaram suas aplicações desde a medicina até a engenharia.
Agora, uma startup japonesa, a Spiber, está explorando como as teias de aranha podem transformar a indústria têxtil.
A empresa de biotecnologia começou fazendo uma réplica de seda de aranha no laboratório e, desde então, expandiu a sua linha de tecidos para incluir alternativas mais sustentáveis à lã, cashmere e o jeans, diz Kenji Higashi, chefe de desenvolvimento de negócios da Spiber.
A fibra de marca registrada da empresa, Brewed Protein, tem sido usada em coleções de edição limitada com marcas como a marca japonesa de streetwear, Sacai, e nos especialistas em roupas ao ar livre, The North Face Japan.
Atualmente ampliando a produção e se preparando para um lançamento comercial completo de seus têxteis, a Spiber espera que sua tecnologia ajude a “resolver alguns dos grandes desafios globais que estamos enfrentando”, diz Higashi.
Tecidos de fermentação
As aranhas criam as teias ao girar proteínas líquidas em seda. Embora os bichos-da-seda tenham sido criados para produzir seda há milhares de anos, as aranhas são canibais, o que as torna impossíveis de cultivar.
É por isso que os amigos Kazuhide Sekiyama e Junichi Sugahara, fundadores da Spiber, decidiram criar um material sintético que é molecularmente idêntico à seda da aranha.
A dupla começou a experimentação quando eram estudantes na Universidade de Keio, na província de Yamagata, em 2004, e fundou a empresa em 2007.
A Spiber estudou “milhares de diferentes espécies de aranhas”, bem como outras espécies produtoras de seda, e compilou um banco de dados das variedades de seda, diz Higashi.
Tendo produzido com sucesso a seda de aranha alternativa, a equipe desenvolveu uma variedade de tecidos Brewed Protein alterando a sequência de proteínas, diz Higashi.
As fibras da Spiber são feitas fermentando a água, açúcar e nutrientes com micróbios especialmente modificados em tanques de aço, semelhantes aos usados na fabricação de cerveja, para produzir polímeros de proteína. Os polímeros são alimentados através de um bico e transformados em fibra, diz Higashi.
Não tem sido uma jornada fácil, no entanto. Em 2015, a Spiber fez uma parceria com a The North Face Japan para produzir uma edição limitada de 50 jaquetas impermeáveis “Moon Parka” para comemorar o 50º aniversário dos pousos na lua.
Mas durante o processo de design, a equipe descobriu que a seda da aranha encolhe quando molhada e teve que modificar a proteína para tornar a fibra adequada para uma jaqueta ao ar livre.
Levou quatro anos “para produzir uma roupa que atendesse aos seus padrões”, diz Higashi. As jaquetas impermeáveis foram vendidas por ¥ 150 mil (cerca de US$ 1.400 em 2019) e a pequena coleção esgotou.
Uma revolução na reciclagem
A moda é uma das indústrias mais poluentes do mundo. Produz cerca de 2,1 bilhões de toneladas métricas de CO2 todos os anos, de acordo com os consultores de gestão McKinsey & Company. Cerca de 70% disso vem da produção, e a fabricação de têxteis usa grandes quantidades de matérias-primas e água.
Higashi diz que os têxteis biodegradáveis da Spiber devem gerar apenas um quinto das emissões de carbono geradas pelas fibras de origem animal quando estiverem em produção em grande escala, de acordo com uma análise de ciclo de vida realizada pela empresa.
A Spiber quer reduzir ainda mais seu impacto ambiental. A empresa atualmente usa cana-de-açúcar e milho para seu processo de fermentação – culturas que usam grandes volumes de terra e desviam recursos alimentares, diz Higashi.
Para resolver isso, a Spiber está desenvolvendo um processo chamado “circulação da biosfera” que converterá roupas descartadas feitas de materiais naturais, como o algodão, em açúcares necessários para a fermentação.
Cerca de 40 milhões de toneladas métricas de resíduos têxteis são produzidas todos os anos e a maior parte vai para aterros sanitários ou incineradores: manter esses têxteis no circuito pode criar uma alternativa mais sustentável, diz Higashi.
Expansão global
A Spiber não é a única empresa que se inspira nos aracnídeos. Em 2016, a Adidas incorporou a fibra Biosteel, da AMSilk, em um tênis e, em 2017, o inovador têxtil da Califórnia, Bolt Threads, revelou sua linha inspirado em seda de aranha, Microsilk, aplicada em um vestido dourado desenhado por Stella McCartney.
Além de suas colaborações com a The North Face Japan, o Brewed Protein da Spiber tem sido usado pelo designer japonês, Yuima Nakazato, para várias de suas coleções e pela marca de streetwear Sacai para uma linha de camisetas de edição limitada.
Higashi diz que a Spiber também está explorando oportunidades na indústria automotiva.
De acordo com a empresa, a Spiber levantou cerca de ¥ 100 bilhões (US$ 783 milhões) de investidores, incluindo empresas financeiras Carlyle e Mitsubishi UFJ Morgan Stanley Securities, além de doações de organizações governamentais e fundos de desenvolvimento de startups.
Esse financiamento permitirá que a empresa se expanda além de sua fábrica piloto, em Yamagata, abrindo uma pequena fábrica na Tailândia ainda este ano e uma instalação maior nos Estados Unidos no próximo ano em parceria com a multinacional de processamento de alimentos Archer Daniels Midland Company.
Higashi diz que isso permitirá a produção de milhares de toneladas do Brewed Protein até o final de 2023.
Higashi diz que o escalonamento ajudará a reduzir o preço do Brewed Protein e permitirá que a Spiber se expanda além do mercado de designer de alta qualidade.
“Temos os meios para criar soluções para viabilizar uma moda mais circular”, diz Higashi. “É a nossa missão trazer essas soluções para o mundo”.