Incubadoras ajudam novos empresários a desenvolver negócios; veja como funciona
Oferecimento de infraestrutura, orientações e networking são as principais vantagens das instituições
O processo de criação, gestão e crescimento de uma empresa é repleto de armadilhas e desafios que muitas vezes não conseguem ser superados por empresários com pouca experiência. As incubadoras universitárias surgem para ajudar esse público, atuando como guias no mundo do empreendedorismo.
Como o nome sugere, essas incubadoras estão vinculadas a universidades. Elas recebem os futuros empresários quando a companhia ainda está no mundo das ideias, oferecendo um sistema de suporte na formação e elaboração da empresa, do produto, do plano de negócios, das metas e métricas e em outros aspectos que, muitas vezes, pegam empreendedores de surpresa.
“A incubadora é um ambiente que vai suportar o nascimento de uma empresa e a própria empresa nos primeiros anos de vida dela”, afirma Eduardo Cicconi, gerente do Supera Parque.
“O legal de quem vai procurar a incubadora é que no começo não precisa ter nenhum grau de amadurecimento da startup. Pode vir com a ideia, e a incubadora ajuda a desenvolver. Tem um processo seletivo, já com capitação, que constrói o modelo de negócios e submete ao processo. Se for aprovado, valida na incubadora e melhora esse projeto”, explica Cicconi.
O Supera Parque, por exemplo, surgiu da parceria da USP com a prefeitura de Ribeirão Preto, e possui diversas instalações, incluindo uma incubadora. Reunindo 83 startups, ela foi escolhida em 2019 pela UBI Global – comunidade sueca de inovação – como uma das 20 melhores incubadoras universitárias do mundo.
“A gente parte do princípio que as pessoas têm uma boa ideia, um conhecimento técnico, mas não entendem necessariamente de negócios, e precisam dessa formação complementar, ajuda”, afirma Luciana Nedel, diretora do CEI, uma incubadora da UFRGS focada na área de informática e criada em 1996.
Por estar vinculada a uma universidade, a incubadora acaba privilegiando projetos que saíam desse ambiente, sejam eles de alunos de graduação ou de pós-graduação. Entretanto, é possível incubar projetos do público externo.
“A gente, como incubadora, é parte de um ecossistema de empreendedorismo maior, e a gente tem uma comunicação bem forte com outras entidades, espaços de coworking, investidores, aceleradoras, fundos de investimento. A vantagem de estar dentro da universidade é dar um suporte técnico bem importante para as empresas incubadas, conversar com quem pesquisa a área, ter mentorias, interagir com grupos e acessar laboratórios”, diz Nedel.
As incubadoras também podem receber um certificado da Anprotec (Associação Nacional de Parques, Incubadoras e Ambientes de Inovação) que, segundo Nedel, mostra que o local fornece uma formação em cinco eixos: “tornar a pessoa um empreendedor melhor, desenvolver a tecnologia da empresa, facilitar o acesso ao mercado, formar bons gestores e cuidar bem das finanças”.
Décadas de história
Cicconi afirma que os primeiros incentivos para a formação de incubadoras e de parques tecnológicos ocorre no Brasil no início da década de 1980, a partir de ações do Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico (CNPq).
As primeiras incubadoras universitárias surgiram na mesma década, nas cidades de São Carlos (SP) e Florianópolis (SC). “Elas começam a se desenvolver e crescer em número mesmo a partir de meados dos anos 90, início dos anos 2000”, diz o gerente. A Supera, por exemplo, surgiu em 2003. Já na UFRN, a primeira incubadora surgiu em 2013.
“Em relação a outros países, e apesar de ser um movimento até antigo, a quantidade de incubadoras é pequena se comparada aos Estados Unidos”, afirma. Ele observa, porém, que nos últimos anos os investimentos e interesse nas incubadoras, associada à ideia de empreendedorismo, têm aumentado.
“As instituições de ensino começam a olhar para isso, e passam a ser cobradas com a questão do empreendedorismo, então, acabam tentando criar esses ambientes de inovação”, explica. Ele também notou uma procura cada vez maior por parte de estudantes.
“No passado, para descobrir bons projetos tínhamos que fazer alguns programas, lançar desafios, fazer eventos e oficinas de construção. Tínhamos que criar isso para descobrir ideias e pessoas com interesse em empreender. Hoje o fluxo é muito mais fácil, empreendedorismo e inovação estão em alta, então existe um interesse do estudante em olhar para essa área”, avalia Cicconi.
Um levantamento de 2019 do Ministério da Ciência, Tecnologia e Inovação indicou que existem 363 incubadoras ativas no Brasil. Destas, 232 estão nas regiões Sudeste e Sul, o que destaca a concentração desses centros de inovação.
Daniel Pontes, diretor da Agência de Inovação da UFRN, considera que era mais difícil as incubadoras fora do Sudeste e Sul movimentar grupos de investidores. “Mas hoje conseguimos ter um ecossistema de inovação bastante pujante. Mas logicamente, estando mais afastados, temos uma procura um pouco menor”. Responsável pelas cinco incubadoras da universidade, ele considera que, hoje, esse cenário “está mudando”.
“Realmente temos algumas áreas que despontam fortemente, em especial TI, engenharias e biológicas. A área de humanas ainda não está plenamente envolvida nesses ambientes, mas possibilidades existem. Por mais que não tenha um grande envolvimento com as incubadoras tecnológicas, elas têm uma aproximação com incubadoras sociais, mais voltadas para atender a sociedade de forma diferente, sem criar novas tecnologias para o mercado, mas sim parar melhorar a vida, o dia a dia”, diz Pontes.
Trampolim para empresas
Criada em 2013, a startup Proradis passou pela Supera Incubadora, e saiu dela, ou se “graduou”, há quase seis anos. Ela atua no segmento de gestão interna de clínicas de teleradiologia, uma escolha que está ligada à incubadora.
“Nós começamos focando em teleradiologia, mas vimos que as clínicas precisavam de ferramentas de gestão interna, então mudamos o plano de negócios. Tivemos ajuda da incubadora, em um processo de mentoria com pessoas que dificilmente teríamos acesso”, afirma Eduardo Alvarez, presidente da empresa.
Alvarez fez sua graduação e seu mestrado na USP de Ribeirão Preto, e foi durante esse período que ele conheceu a Supera. “Eu fui perguntar como funcionava, o que é empreendedorismo, o que deveria fazer, o que era ter uma empresa, um CNPJ, e entender isso com eles. O apoio da incubadora foi fundamental”, diz.
Hoje, a Proradis possui 60 funcionários, e atua em todos os estados do Brasil e na América Latina, chegando inclusive a fazer uma aquisição recente de uma empresa do mesmo setor. “Fomos evoluindo e aprendendo com o tempo, mas a semente foi plantada na incubadora”.
Para Alvarez, a Proradis não necessariamente deixaria de existir sem a passagem pela Supera, mas teria sido um processo diferente. “Para as empresas que nascem do zero, do sonho do empreendedor, é bem importante passar pelo processo de incubação”, afirma.
O processo pelo qual a Proradis passou é semelhante ao que a startup Presavi deve passar na Supera. Criada em 2020, ela também atua no segmento de saúde, mas voltada para a área de prevenção, focada em pacientes que podem ter diabetes e buscam reverter essas chances.
Yabian Alberto Perón Reyes, presidente da empresa, não conheceu a Supera no ambiente universitário. Ele participava de grupos de empreendedores quando recebeu a recomendação de buscar a incubadora.
“A empresa estava muito no começo, era simplesmente uma ideia e a vontade de construir um negócio. No nosso caso, estar incubado é uma oportunidade sem igual, porque é o ecossistema certo para crescimento e desenvolvimento do nosso projeto”, afirma Reyers.
Ele destaca as oportunidades de estabelecer parcerias, fazer networking e o contato com possíveis investidores, além de aumentar o conhecimento sobre empreendedorismo e ferramentas de desenvolvimento de startups.
A própria ideia da startup foi mudando ao longo do processo, conforme os idealizadores entenderam melhor o mercado, as demandas do público e outros elementos, além da ajuda para elaborar um plano de negócios e a sua validação.
“Primeiro a pessoa precisa procurar a incubadora para entender como é processo seletivo, os pré-requisitos, e a partir daí, se planejar. Ideia, time, modelo de negócio modificam-se com o tempo, o importante é ir atrás, ter proatividade”, afirma.
As incubadoras também permitem que pesquisadores entrem em um novo ambiente, o do mercado. Foi o caso de Arnóbio Antonio da Silva Junior, professor da UFRN e um dos fundadores da ISnano, que está incubada na faculdade. A empresa trabalha com o oferecimento de nanotecnologia para farmácias de manipulação, e surgiu em 2019.
“[A incubação] é muito importante porque nós sabemos muito sobre nanotecnologia, mas muito pouco sobre modelos de negócio”, diz Junior.
Também incubada, a Altervision foi criada entre 2019 e 2020, mas hoje já possui lucro e funcionários. Julio Milani de Lucena, sócio-fundador, conta que a startup atua no varejo, integrando câmeras de segurança para gerar métricas sobre os clientes para o varejo físico.
“Fomos incubados no CEI no final de 2019, com uma proposta inicial mais genérica, visão computacional como um todo, e aí convergimos para esse modelo mais escalável, com só uma dor do mercado”, afirma. Todos os fundados estudaram na UFRGS, onde conheceram a incubadora.
“Foi interessante conhecer outras empresas que atuam em fases, histórias semelhantes e problemas semelhantes e ter essa troca. Para mim, é o grande diferencial”, diz. “A empresa existiria fora [da incubadora], mas ela seria com certeza diferente, mais desconectada do ecossistema de inovação e talvez mais técnica que era a visão inicial, diferente de uma startup”.
*Sob supervisão de Thâmara Kaoru e Ana Carolina Nunes