Entenda como a política de zero-Covid da China impacta as empresas brasileiras
Até agora, mais de 30 cidades na China estão sob bloqueio total ou parcial, afetando até 187 milhões de pessoas em todo o país
Desde o começo da pandemia, a China adotou políticas duras de isolamento e limitação de atividades em cidades com casos confirmados de Covid-19. Porém, a medida chamada de “zero-Covid” adotada pelo país nas últimas semanas interrompeu o crescimento econômico chinês para este ano e causou uma instabilidade nos mercados globais, deixando um risco de uma possível recessão mundial.
Os impactos serão sentidos no Brasil, já que o país possui fortes relações econômicas com a China.
Em abril, o crescimento das exportações chinesas desacelerou um dígito – nível mais fraco em quase dois anos, enquanto as importações ficaram estáveis nos primeiros meses do ano.
Vale ressaltar que o país asiático é a segunda maior economia por conta do consumo de commodities. Sua produção exige muitos bens-primários. Diferente da primeira maior economia do mundo, os Estados Unidos, que é focado em tecnologia e na área financeira.
Os lockdowns na China impactam as exportadoras brasileiras, principalmente de matérias-primas, como minério de ferro e petróleo.
Rodrigo Leite, professor de finanças e controle gerencial do Instituto de Pós-Graduação e Pesquisa em Administração da Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ), avalia que, por conta dos números mundiais de casos estarem diminuindo, a preocupação das companhias com o coronavírus também caiu.
Dessa forma, os negócios relaxaram as projeções e as medidas na China “acabaram afetando as empresas”. Especialistas consultados pelo CNN Brasil Business apontam que tanto a Vale quanto a Petrobras tiveram um desempenho afetado por conta do país asiático.
Marcelo Oliveira, CFA e fundador da Quantzed, afirmou também que um dos setores mais impactados foi o de varejo, pois a ação sanitária chinesa trouxe “um grande problema” no fornecimento de produtos.
O movimento colaborou para a escalada da inflação causada por redução de oferta no Brasil, obrigando o Banco Central a aumentar as taxas de juros. Com isso, as companhias do setor que não estavam capitalizadas, além da queda na receita, tiveram taxas mais altas para pedir empréstimo.
“Quem não tinha um controle muito bom de fluxo de caixa ficou em maus lençóis”, declarou Oliveira.
Ibovespa
Como o principal índice da bolsa brasileira é composto por quase 30% de companhias que trabalham com commodities, e a Vale corresponde a 15,4% do índice, enquanto a Petrobras a 12%, o cenário impactou o mercado brasileiro.
O sócio-fundador da Nord Research aponta que as commodities não caíram, mas reduziram as altas que protagonizavam devido à guerra entre a Rússia e a Ucrânia, o que fez o índice subir menos nos últimos dias.
A Vale, por exemplo, estava cotada em 24 de fevereiro (quando o exército de Vladimir Putin invadiu a Ucrânia), a R$ 87,54, e no pregão de terça-feira (24) encerrou a R$ 84,04. Já a Petrobras (PETR3) estava no mesmo período de fevereiro a R$ 29,88, e fechou na véspera a R$ 34,40.
Rodrigo Leite, professor de finanças, ressaltou ainda o movimento da China impactou todas as bolsas porque esfriou o crescimento futuro do país asiático, o que interrompeu o caixa futuro das companhias, “recuando o valuation e, consequentemente, tombando os papéis pelo mundo”.
Valuation significa a posição que a empresa ocupa no mercado e a previsão do retorno de investimento nas ações negociadas em bolsa.
Veja o desempenho do Ibovespa em 2022:
Por outro lado, o fundador da Quantzed afirmou que grande parte das empresas do varejo na bolsa brasileira já está com cotações quase iguais aos preços da época quando estourou a crise da Covid-19 no mundo.
Futuro
Os especialistas afirmam que é difícil prever o que acontecerá na China e quando será o fim do lockdown no país. O fundador da Quantzed ressaltou que ainda não há sinais de melhora no crescimento do PIB chinês, nem em países mais desenvolvidos como os Estados Unidos e a Europa.
Mas o sócio-fundador da Nord Research aponta que, no segundo semestre, a China terá eleições, “então me parece muito tempo para ficarem [até meados de outubro] com medidas de isolamento, porém, nunca diga nunca”.
A Vale também informou em nota que “o governo chinês está mantendo a meta de 5,5% para o crescimento do PIB, o que torna provável que haja novos estímulos para a economia”.
“Esses estímulos seriam positivos para os setores imobiliário e de infraestrutura e, por consequência, para a demanda por aço, impactando de forma favorável o mercado de minério de ferro.”
A Petrobras, por outro lado, não respondeu um pedido do CNN Brasil Business sobre as expectativas para o futuro com relação aos lockdowns na China.
Relembre a economia da China
O Índice de Gerentes de Compras (PMI, na sigla em inglês) do Caixin (publicação financeira), um indicador observado de perto para avaliar o estado da economia, despencou para 36,2 em abril, de 42 em março, de acordo com uma pesquisa divulgada pela IHS Markit. Uma leitura abaixo de 50 indica contração, enquanto qualquer coisa acima desse indicador mostra expansão.
O setor de serviços responde por mais da metade do PIB do país e mais de 40% de seu emprego. E com os dados da pesquisa mostrando que o setor manufatureiro da China também encolheu no mês passado, a segunda maior economia do mundo retrocedeu em abril.
Embora as condições possam melhorar este mês, à medida que as taxas de infecções por Covid-19 diminuem e as autoridades tentam limitar os danos à economia, grande parte de Pequim acaba de ser colocada sob restrições mais rígidas e alguns economistas agora estão prevendo que o PIB chinês diminuirá no segundo trimestre.
O declínio de quase 6 pontos na atividade de serviços em abril ficou atrás apenas do colapso em fevereiro de 2020, quando a economia da China quase parou enquanto lutava para conter o surto inicial de coronavírus que começou em Wuhan. Naquele mês, o PMI de serviços da Caixin caiu para 26,5 de 51,8 em janeiro.
Até agora, mais de 30 cidades na China estão sob bloqueio total ou parcial, afetando até 187 milhões de pessoas em todo o país, segundo cálculos da CNNi.
Com isso, o UBS BB reduziu sua previsão de crescimento anual do PIB chinês de 4,2% para 3%. Como justificativa, a companhia citou o impacto das políticas de Covid-zero. Já o JPMorgan rebaixou suas expectativas de 4,3% para 3,7%, devido os mesmos motivos.
*Com informações de Laura He, do CNN Business