RJ tem quase 40% dos escritórios de alto padrão vazios — não só pela pandemia
Levantamento da Buildings mostra que redimensionamento dos escritórios durante a pandemia afetou mercado
Com a maioria das empresas funcionando em sistema de trabalho remoto, ainda que parcialmente, os escritórios de grandes capitais foram se esvaziando ao longo do ano passado. No Rio de Janeiro, houve até um recorde: 24% dos escritórios estão desocupados pela primeira vez na série histórica de um levantamento da Buildings, que teve início em 2005.
Entre as salas comerciais de alto padrão na capital carioca, o número de espaços desocupados chega a representar 40% do total. Um nível saudável de espaços vagos, de acordo com Fernando Didziakas, sócio da Buildings Pesquisa Imobiliária, seria de cerca de 10%.
“Uma taxa de vacância em torno disso permite um bom equilíbrio no poder de negociação entre proprietários e inquilinos. Abaixo dos 10% veríamos os preços subirem desproporcionalmente e, da mesma forma, uma taxa muito mais alta, como a que vemos agora, deixa o inquilino com mais força na mesa.”
Em São Paulo, o nível de salas comerciais vazias saltou de 13% no primeiro trimestre de 2020, antes do início da pandemia de Covid-19, para mais de 17%. Desde o início da série, a capital paulista nunca tinha apresentado três trimestre seguidos de encolhimento na ocupação de imóveis corporativos de alto padrão.
Do segundo trimestre de 2020 até o fim do ano, São Paulo registrou queda na absorção líquida — índice que determina o quanto as empresas alugaram em espaço ocupado. No último trimestre do ano, houve uma absorção líquida negativa de 18,5 mil metros quadrados.
Mas esse impacto da pandemia no mercado imobiliário corporativo ainda varia bastante de acordo com a região de cada cidade, explica o sócio da Buildings. “Quando olhamos para São Paulo, estamos falando de 2,8 mil edifícios comerciais, sendo mais de 250 de alto padrão. É uma cidade muito plural e a localização desses imóveis importa muito”, diz.
De acordo com ele, a região da Faria Lima permanece aquecida mesmo com a finalização de um grande empreendimento em meio a pandemia, que colocou em oferta mais de 50 mil metros quadrados. Aliás, a depender das exigências, faltam escritórios: para os de alto padrão, a taxa de vacância gira atualmente em torno dos 2,7% (bem abaixo dos 10% ideais).
Não foi só a pandemia
Os números refletem o impacto da pandemia de Covid-19 no mercado imobiliário do país, em que quase todas as grandes empresas precisaram implementar o sistema de home office, ainda que de forma híbrida (com funcionários que trabalham presencialmente e outros de forma remota).
Mas essa não é a única razão para a “debandada” dos escritórios. Como já noticiou o CNN Brasil Business em outras ocasiões, uma das tendências do mercado corporativo, apenas acelerada pela pandemia, é o redimensionamento de escritórios e a formação de equipes híbridas.
Numa pesquisa da KPMG entre os líderes corporativos dos EUA, por exemplo, 68% dos CEOs de grandes empresas americanas disseram que planejam pelo menos reduzir o tamanho de seus escritórios — se não os deixar completamente. O coronavírus fez com que esse tipo de estratégia chegasse mais cedo no Brasil.
“O home office já era uma tendência em grandes multinacionais e agora se apresenta de uma forma mais definitiva. Isso tem sim impacto no mercado imobiliário, mas são raríssimos os casos de empresas que vão deixar de ter escritórios”, acredita Didziakas.
Além disso, os prédios comerciais já começam a adotar saídas como o coworking e o aluguel para universidades e instituições de ensino. Mas nada que descaracterize o espaço, como hospitais ou iniciativas residenciais. De acordo com Didziakas, esse tipo de transformação estrutural é muito onerosa e não deve ser aplicada pelo mercado.
“Mas os prédios comerciais vão continuar funcionando. O escritório tem um papel muito importante quando falamos em cultura empresarial, ambiente de negócios, é algo que afeta a percepção do funcionário, do cliente, ainda tem essa função.”
Luz no fim do túnel
Essa debandada, aliás, deve ser temporária, de acordo com os especialistas da Buildings. Mas espera-se que o esvaziamento dos escritórios continue em alta pelo menos até o fim do primeiro semestre de 2021, já que as devoluções continuam aumentando e há previsão de numerosas entregas de edifícios — que começaram a ser construídos muito antes de qualquer sinal de pandemia.
Os sinais disso estão nos próprios números do quarto trimestre de 2020. A quantidade de devoluções no período foi menor do que no anterior — só que ainda assim mais expressiva que o aluguel de novos espaços, deixando um saldo negativo expressivo, como vimos acima.
“Se o PIB desse ano sair de acordo com as expectativas, e demonstrar uma recuperação da economia, isso faz com que as empresas retomem a confiança. Além disso, vamos acompanhar o andamento da vacinação. Pode até ser que a vacância caia antes do fim do ano”, diz o sócio da Buildings.
A coisa já esteve muito pior, conta o especialista. Ele compara a complexa situação que vive o mercado imobiliário corporativo hoje com a crise enfrentada em 2017. “O impacto naquela época foi muito maior e a gente sobreviveu. Naquele ano, houve realmente uma crise imobiliária, foram mal calculadas as entregas. Hoje não. Vivemos um problema de saúde, uma crise sanitária”
Ele destaca que, na época, uma série de medidas de estímulos foram aplicadas para auxiliar na recuperação do setor. E que, agora, elas podem ser repetidas, embora ainda não seja o caso. “Ainda não precisamos de medidas radicais. Esse primeiro trimestre de 2021 vai ser importante para entender se vão ser necessárias.”