Real depreciado e juro baixo formam bom cenário para concessões, diz Tarcísio
Segundo o ministro da Infraestrutura, há demanda para os projetos que o governo quer leiloar e o momento, apesar da pandemia, é positivo
O fato de o Brasil estar mergulhado numa crise sanitária em razão da Covid-19 não é considerado pelo governo impeditivo para o País avançar na agenda de concessões. O investidor que vai disputar uma série de leilões neste mês, quando a União pretende contratar R$ 18 bilhões em investimentos, está de olho no longo prazo e no cenário macroeconômico, avaliou o ministro da Infraestrutura, Tarcísio de Freitas.
Juros baixos em economias desenvolvidas e o real depreciado no País costuram um cenário interessante para quem é de fora, disse o ministro.
Além dos R$ 10 bilhões previstos na próxima semana, com leilões de aeroportos, portos e um trecho de ferrovia, no fim do mês, o governo ainda coloca para disputa a concessão da BR-153/080/414, entre Goiás e Tocantins, que prevê cerca de R$ 8 bilhões em investimentos.
O Brasil enfrenta um momento de crise e instabilidade pela pandemia do novo coronavírus. Há segurança para seguir com a agenda de concessões?
Tudo tem timing para acontecer. Nós estamos num momento bom para fazer concessões de infraestrutura. Temos uma situação de câmbio depreciado, o que para atrair investidores é interessante. Os ativos em dólar ficam baratos, o risco cambial nessa situação diminui para quem está trazendo dinheiro de fora. Também há uma situação de taxa de juros ainda baixa. Como os governos ao redor do mundo estão fazendo pacotes onde despejam muito dinheiro nas economias, a tendência é de começar a admitir um certo nível de inflação em vários países, e de em pouco tempo observar um movimento de subida de taxa de juros no mundo inteiro. Então aproveitar este momento para fazer leilões de infraestrutura é interessante.
Há um cenário positivo descrito, mas também vivemos numa situação ruim no Brasil pela pandemia. Esse cenário visto como positivo dá conta de compensar o atual contexto negativo?
Precisamos pensar sempre que o investidor de infraestrutura pensa a longo prazo. E o Brasil é interessante porque já tem tradição de respeito a contrato. Nós vamos fazer este ano leilões de ativos que foram concedidos pela primeira vez na década de 90. Foram contratos que atravessaram os governos FHC, Lula, Dilma, Temer, Bolsonaro e vão ser relicitados. É isso que o investidor enxerga. Há um potencial muito grande de crescimento.
Os projetos foram repensados para absorver os impactos da crise?
Amadurecemos muito os estudos para medir o impacto na demanda próxima e futura, reavaliar elasticidade e velocidade de recuperação que teríamos em cada um dos ativos. Obviamente, tudo o que fazemos é sempre ouvindo muito o mercado. Não adianta estruturar sonhos, um ativo que ninguém quer. Se seguimos em frente, é porque o mercado deu esse feedback. Nós não inventamos demanda. Não íamos lançar uma série de leilões que não vão dar ninguém, uma sequência de leilões desertos. Nós trabalhamos no espaço que temos.
Estamos num momento da pandemia com várias restrições de deslocamento. Não sabemos como estará o cenário nas próximas semanas. Há receio sobre os leilões em São Paulo?
A Bolsa de Valores tem um protocolo rígido. Limitou muito a participação das pessoas, de representantes por interessado nos ativos. Íamos fazer uma reunião na Bolsa no dia 6 com todos os investidores, fundos, bancos, e decidimos fazer de forma virtual. E também teremos ao longo da semana reuniões one-on-one. Já estamos acompanhando o movimento de investidores estrangeiros que estão obtendo seus vistos para participar pessoalmente.
E desses leilões programados, quando o impacto de geração de emprego e renda serão sentidos? Até porque o investimento mais expressivo não chega no início das concessões…
Os investimentos de serviços iniciais já começam no ano que vem, e o investimento vai se materializar de forma mais contundente em 2023, 2024, quando vamos sentir de forma muito expressiva a geração de empregos. No caso dos ativos de 7 a 9 de abril são mais de 200 mil empregos, geração direta e indireta e efeito renda. A semana é bastante emblemática, pois contrata R$ 10 bilhões de investimentos, mais que o orçamento anual do ministério (em torno de R$ 7 bilhões).
De acordo com esse cronograma, o ano seria o de maior volume de investimento privado contratado, olhando o histórico dos últimos anos?
Com toda certeza. Será na ordem de R$ 120, R$130 bilhões de investimentos. Vamos ver muito investimento chegando em todas as áreas da Federação. Imagina de repente você ter um operador europeu no Aeroporto de Tefé (AM), Tabatinga (AM), de Cruzeiro do Sul (AC)? E tem interesse. Nós vamos ter grupos disputando o Bloco Norte.
Onde o sr. enxerga chance de concorrência mais agressiva?
Eu acho que vamos ter principalmente nos aeroportos uma grande concorrência. Mercados portuário e de ferrovias são um pouco diferentes. De ferrovias é muito intensivo em termos de capital e de certa forma dependente de quem tem o domínio da carga. De portos também há mais proeminência da verticalização. Então, normalmente, o dono da carga é quem vai operar os terminais portuários. Por exemplo, são quatro terminais de líquidos no Porto de Itaqui (MA) que serão leiloados. Quem vai entrar? São as distribuidoras de combustíveis, como já tem sido praxe no setor. Mas todos os ativos vão ter bid (lance).
Onde dá para apostar que vai haver novos entrantes?
Nos aeroportos devemos ver novos players participando da licitação. Na quinta rodada, por exemplo, tivemos a participação de players que não levaram. Alguns deles estarão novamente presentes. Não descarto a possibilidade de termos fundos participando do leilão desses ativos. (O governo mudou uma regra para operador aeroportuário na sexta rodada com a intenção de atrair fundos). Você tem empresas com dificuldade de caixa, e quando abre as portas para fundos de investimento, abre a porta para mais players. E devemos começar a assistir, nas rodovias, por exemplo, ao ingresso de alguns operadores, sobretudo europeus, que não estão no Brasil.