“Questão do petróleo vai muito além do meio ambiente”, diz professor à CNN
Pesquisador defende que é preciso falar sobre qual será o papel do estado na produção a partir da exploração na Margem Equatorial
O professor Jadson Porto, um dos principais estudiosos do Amapá, disse em entrevista à CNN que o debate sobre a exploração de petróleo na Margem Equatorial vai muito além da mera questão ambiental.
Ele defende que é preciso falar sobre qual será o papel do estado na produção e a forma como a academia local enxerga o assunto.
A seguir, leia os principais trechos da entrevista.
Professor, qual a sua avaliação sobre a exploração de petróleo na Margem Equatorial?
A questão do petróleo na Margem Equatorial vai muito além da questão ambiental. Isso implica dizer que, no Amapá, especificamente, se for encontrada toda a potencialidade do produto aqui, insere o Amapá na economia mundial. Entretanto, em nenhum momento, está sendo alocada a implantação de uma refinaria aqui. Por outro lado também, qual vai ser a função do Amapá dentro da exploração? Porque até agora, o que está sendo colocado é que muitas das atividades irão para Belém, e não aqui no Amapá.
Então, é muito mais da questão ambiental, a questão ambiental é um dos aspectos a ser colocado. Considerando, então, o investimento e o possível retorno para essa região, se for bem aplicado, seria interessante, mas, senão, continuaremos na mesma lógica de exportação de commodities.
Ser bem aplicada em quê?
Ciência e tecnologia, infraestrutura, saneamento, proteção na questão ambiental, investimento em pesquisa na questão ambiental. O estado do Amapá é muito recente, então, tudo está por ser construído.
Como que a academia, tanto do Amapá da região Norte, está participando desse debate?
Tem muitos grupos de pesquisa que estão diretamente inseridos nessa discussão. Aqui no Amapá, por exemplo, tem o Iepa, Instituto de Pesquisas do Amapá, que tem feito muitas pesquisas sobre isso, avaliando o impacto dessa exploração. Só que tem um detalhe, Caio, este momento é o de exploração. Então, dentro das atividades, nós temos criação, construção, amadurecimento, modernização. Nós estamos aqui nessa primeira fase, estamos explorando. Se for avaliada a potencialidade, aí vem o processo de construção. Isso vai durar aproximadamente cinco anos, de três a cinco anos. Nós estamos aqui, nessa primeira fase, logo no início.
Demora ainda.
Demora. Então, se nós pensamos a longo prazo, criação, construção, amadurecimento, modernização, eu levo pelo menos 20 anos.
A Foz do Amazonas em si é o quê? São vários rios?
A Foz do Amazonas é composta pelo final da bacia do Rio Amazonas. Há milhões de anos, o Rio Amazonas escorria naquela direção, para o oeste, em direção ao Pacífico. Com o surgimento da cordilheira dos Andes, ele inverteu e veio nesta situação. Se você olhar o mapa, por exemplo, da Bacia Amazônica, ele tem o formato de uma garrafa. Ela é larga no final e estreita por conta desse soerguimento e essa mudança da direção do rio.
Dá para a gente dizer que um eventual vazamento lá chega aqui?
Chega, por conta do refluxo. Veja só: essa ilha que nós estamos aqui, nós estamos na maré baixa, ou seja, você tem a maré alta e maré baixa. Então, a água do oceano entra aqui. Por outro, ali no oceano, tem a corrente marítima norte equatorial. Essa corrente marítima segue acompanhando desde o Rio Grande do Norte, onde tem a outra ponta da bacia petrolífera que nós estamos discutindo aqui, e segue em direção até os Estados Unidos. Ele leva a corrente quente até os Estados Unidos, a corrente norte equatorial. Então, se houver um vazamento, primeiramente, ele leva o óleo em direção à Guiana Francesa, chegando até a Venezuela e podendo chegar até os Estados Unidos. A dinâmica das correntes marítimas é um dos fatores que leva em consideração.
Mas retornar?
Pode voltar. Aí, o Iepa tem feito trabalhos fantásticos sobre esse assunto.
O senhor sempre escreve sobre a questão da fronteira impactando nesse debate.
A fronteira é uma coisa muito séria, porque veja só: essa bacia que está sendo explorada está exatamente no limite entre Brasil e França, Amapá e Guiana Francesa. Então, a bacia petrolífera, se tiver, estará aqui. Se não houver exploração desse lado, mas houver exploração aqui, não houver no Brasil, mas houver na França, a bacia está aqui embaixo, então, acabará sendo utilizada. Isso significa que provavelmente poderá ter algum conflito internacional, como acontece entre Irã e Iraque, como acontece entre Chile e Argentina, por conta da bacia petrolífera que eles possuem que está exatamente na fronteira. Então, perceba que não é só uma questão ambiental. Existem muitas outras escalas para serem levadas em consideração que, até o momento, não estão vindo à tona no debate.
A CNN publica nesta semana a série especial Petróleo na Amazonia. Confira aqui as reportagens