Queda do desemprego ainda é reflexo da retomada pós-pandemia, dizem analistas
Em menor nível desde 2015, taxa de desemprego caiu a 8,7% no trimestre encerrado em setembro, mostraram dados da Pnad Contínua, do IBGE, nesta quinta-feira
As sucessivas quedas registradas na taxa de desemprego —que, no trimestre encerrado em setembro, caiu a 8,7%, menor número desde junho de 2015—, ainda refletem um processo de retomada do mercado de trabalho após a pandemia, segundo especialistas consultados pelo CNN Brasil Business. O motor desse cenário vem sendo o setor de serviços, que mais sofreu com os efeitos da crise sanitária.
“Houve uma rápida retomada nos setores mais afetados pela pandemia. Por exemplo, teve um salto muito grande nas atividades de educação, já que as escolas voltaram e as atividades extracurriculares, que empregam bastante gente, também”, comenta Fernando Holanda Barbosa Filho, pesquisador sênior da área de Economia Aplicada do Instituto Brasileiro de Economia da Fundação Getulio Vargas (FGV Ibre).
“No ano passado, o país teve uma forte recuperação no Produto Interno Bruto (PIB), mas fraca no emprego. Era, digamos assim, uma ‘jobless recovery’ (recuperação sem emprego no inglês). Os setores que estavam aquecidos eram intensivos em produto, mas pouco intensivos em mão de obra. Esse ano aconteceu o oposto: setores intensivos em mão de obra, mas relativamente fracos em PIB, tiveram uma forte retomada. Isso explica, na minha visão, o aquecimento do mercado de trabalho, sobretudo no começo do ano.”
Os dados, aferidos pela Pnad Contínua (Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios Contínua), também mostram que o contingente de pessoas ocupadas cresceu 1% ao longo do trimestre, atingindo um novo recorde na série histórica, iniciada em 2012.
Agora, são 99,3 milhões de pessoas que trabalham ao menos uma hora completa durante a semana com remuneração, seja em dinheiro, benefícios, produtos ou regalias.
Para a economista-chefe do Banco Inter, Rafaela Vitoria, o bom desempenho do mercado de trabalho este ano também é explicado, em partes, pelo crescimento da economia na totalidade. A “prévia do PIB”, medida pelo indicador IBC-Br, do Banco Central, registrou alta de 1,17% em julho na comparação com o mês anterior.
Rodolfo Tobler, também economista do FGV Ibre, interpreta de forma semelhante. Para ele, além da retomada do setor de serviços, principalmente no comércio, o reaquecimento da economia no 2º e no 3º trimestre impulsionou a criação de empregos.
“O principal desafio daqui para frente é uma possível desaceleração da atividade, já que a pandemia está saindo do radar. Vai ser o desempenho da economia que vai ditar o mercado de trabalho”, disse ele, em entrevista ao Live CNN nesta manhã.
“O momento ainda guarda juros muito altos, a 13,75% ao ano, que ainda não surtiram efeito. Para o ano que vem, a tendência é de uma desaceleração da economia para controlar a inflação, o que vai, naturalmente, desacelerar o mercado de trabalho também.”
Para ele, o final deste ano deve mostrar uma queda mais branda na taxa de desemprego, ou até um cenário de estabilidade, enquanto 2023 guarda, possivelmente, um mercado de trabalho menos aquecido.
Outro fato que preocupa, segundo Fernando Holanda, é que ainda que o dado de subutilização da mão de obra apresente queda, o número de trabalhadores subutilizados, que trabalham menos horas do que gostariam, ainda é elevado.
Informalidade em alta
A Pnad ainda trouxe um cenário de estabilidade no contingente de trabalhadores sem carteira assinada, em 13,2 milhões de pessoas. Trata-se do maior nível desde o início da série histórica, em 2012.
Ao mesmo tempo, o número daqueles com emprego formal apresentou alta de 1,3% em relação ao trimestre anterior, ao patamar de 36,3 milhões de pessoas. Na comparação anual, cresceu 8,2%.
Para Holanda, essa é uma característica da economia brasileira, que “sempre teve uma dualidade de emprego informal elevado com emprego formal elevado”.
“O número de trabalhadores com carteira assinada está no maior nível desde a crise de 2015 e 2016, que, na minha opinião, deve ser a referência para fazer comparação no mercado de trabalho, e não a pandemia. Com 36,3 milhões de pessoas empregadas formalmente, o nível é bom. Já foi melhor, principalmente antes de 2015, mas ainda é bom.”
Tobler ainda diz que o emprego formal tem custos, de forma que “o empregador precisa de previsibilidade econômica para abrir vagas e processos seletivos”. O bom desempenho da economia este ano, na visão dele, ajuda a entender o porquê dessa forma de inserção no mercado de trabalho ter ido bem. Para 2023, porém, pode ser que a coisa mude de figura.