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    Páscoa: preço do cacau dispara e chocolates devem ficar mais caros, dizem especialistas

    Clima em regiões produtoras do fruto tem prejudicado produção e encarecido insumos

    Amanda SampaioDébora Oliveirada CNN , São Paulo

    Quem tem costume de comprar chocolates na Páscoa, é bom começar a preparar o bolso. A menos de dois meses da data comemorativa, especialistas ouvidos pela CNN afirmam que os preços devem estar mais altos este ano — e desta vez a culpa é do clima.

    Desde meados do ano passado, os preços do cacau têm renovado máximas de forma constante no mercado internacional, especialmente pelas variações do tempo.

    O recente La Niña, por exemplo, já vinha impactando a produção global do fruto e, no último semestre, o El Niño aumentou as temperaturas e diminuiu a chuva em algumas regiões.

    Isso reduziu ainda mais a produtividade dos cacaueiros nos dois principais países produtores do mundo: Costa do Marfim e Gana.

    Outro motivo para a disparada é a chegada de ventos do deserto do Saara, chamados de Harmattan, ao oeste da África. Inclusive, o fenômeno pode ter sido um dos responsáveis pela morte de grande parte da florada do cacau na região.

    E essa alta de preços deve ser repassada ao consumidor final nos próximos meses.

    Fernando Vichi, COO do Grupo CRM, dono da Kopenhagen e Brasil Cacau, confirma que os preços dos chocolates na Páscoa deste ano terão um preço mais “salgado” do que o planejado em toda a indústria, justamente por conta da alta do mercado de cacau.

    Ele explica que a produção para a Páscoa deste ano, começou entre setembro e outubro de 2023 para a maioria do setor, quando também foi definida a precificação dos itens.

    “Quando a gente olha lá atrás, o preço do cacau rondava na ordem de US$ 3,5 mil a tonelada. Se a gente olhasse para média histórica de cinco anos, ele já estava de 30% a 40% mais caro”, afirma.

    O executivo acrescenta que, na ocasião, a indústria acreditava que o preço do fruto já tinha atingido um patamar excessivamente elevado. No entanto, a cotação seguiu galopante, passando para US$ 4 mil na virada do ano e, recentemente, alcançando a cifra de US$ 6 mil.

    “Obviamente que a fotografia de hoje, o preço de hoje em tela, não vai influenciar mais a Páscoa, porque toda a indústria comprou cacau la atrás e se preparou, mas efetivamente a indústria fez a Páscoa de 2024 com um cacau de 30% a 40% mais caro do que ela fez a Páscoa de 2023, então, sim, vai ter uma inflação”, acrescenta.

    Mas, segundo Vichi, o percentual desse aumento vai depender da caraterística de cada produto.

    Para itens mais simples, com embalagens modestas e mais industrializados, o custo de matéria-prima influencia mais o preço final do que outros, como gastos de mão de obra ou custos indiretos de fabricação.

    “Em tese, esses produtos vão sofrer uma inflação um pouco maior”, afirma.

    Por outro lado, produtos mais “elaborados”, com embalagens mais caras ou de produção artesanal, conseguem “diluir” o impacto do preço do cacau em relação aos demais custos de produção.

    Apesar da alta dos preços, a Kopenhagen espera uma Páscoa recorde para este ano, especialmente pelo aumento significativo no número de lojas.

    “Temos, sim, um reajuste de preço em relação à Páscoa do ano passado, mas pelo que já vimos do que tem de Páscoa no mercado, estamos vindo muito mais competitivos do que os reajustes que os demais players colocaram no mercado”, conclui.

    Para o professor de economia da Strong Business School, Valter Palmieri Jr., apesar do cenário pouco otimista para a indústria, os consumidores de chocolate de grandes fabricantes devem ser os menos afetados pela alta nos preços.

    Por outro lado, o especialista avalia que as indústrias menores podem replicar a alta de forma mais expressiva ao consumidor, especialmente em eventuais casos de desabastecimento.

    “É claro que nós não sabemos qual o estoque de cacau que todas as empresas têm. Acredito que haverá uma desigualdade. Algumas fabricantes vão ter uma redução de cacau e vão reajustar os preços, e outras talvez vão tardar um pouco mais”, acrescenta.

    A alta já se mostrou presente nos preços em janeiro, segundo dados do Índice de Preços ao Consumidor Amplo (IPCA), o indicador oficial da inflação doméstica, com a majoração de 1,09% de chocolates em barra e bombom.

    “Acho que esse 1% foi um aumento até muito pequeno em relação ao grande problema de preços que estamos observando. É apenas o início, e infelizmente haverá um aumento de preço muito mais expressivo nos próximos meses”, pontua Palmieri Jr.

    Alê Delara, diretor da Pine Agronegócios, afirma que as exportações de fevereiro estão 33% menores do que o mesmo período de 2023.

    “Como estamos em um período em que a demanda começa a crescer no mundo, com o Dia dos Namorados [nos EUA] e, aqui no Brasil, com a Páscoa, teremos um aumento do consumo em relação à pandemia e uma queda na produção. Esses são os fundamentos que acabam sustentando os preços altos que temos acompanhado”, explica.

    Um relatório do Citibank deste mês, prevê que o preço do cacau pode chegar até US$ 6,1 mil por tonelada nos Estados Unidos, preço recorde para o período. Por isso, Delara diz que, além do clima, também é preciso acompanhar o final de colheita da principal safra, que está ocorrendo neste momento.

    Porém, segundo ele, isso não deve fazer com que o cacau retorne aos preços de três ou quatro anos atrás. Mesmo assim, a expectativa é de que 2024 seja o quarto ano de déficit global na oferta do fruto.

    “Por isso que a indústria de chocolate está extremamente preocupada, porque há uma escassez de matéria-prima, já que a produção de cacau vem caindo há quatro anos consecutivos. Os preços subiram mais de 115% no período de um ano, e eles não conseguem repassar esse custo para o chocolate”, pontua.

    “Aqui no Brasil, teve uma alta próxima a 15% no último ano. Então, você tem um cenário de menor oferta de matéria-prima e um encolhimento muito grande das margens de produção”.

    A Associação Brasileira da Indústria de Chocolates, Amendoim e Balas (Abicab) aponta que a tonelada do fruto já atingiu o pico, e diz que a tendência agora é de baixa.

    Além disso, a entidade afirma que as empresas brasileiras têm planos de longo prazo para dar respostas a cenários de alta. Segundo ela, são iniciativas que contemplam desenvolvimento local e lucratividade para produtores rurais, visando a ampliação da oferta.

    “Evidente que um salto de US$ 2,5 mil na tonelada para US$ 6 mil, como registrou a bolsa de Nova York, é muito forte. A maior parte desse impacto será absorvida pela indústria, mas algo terá que ser repassado. A expectativa é de que a curva alta tenha chegado ao pico. As colheitas de abril, tanto na Costa do Marfim, maior produtora, quanto no Brasil, darão um desafogo e estabilizarão os preços”, afirma Jaime Recena, presidente da Abicab.

    De acordo com dados da Comissão Executiva do Plano da Lavoura Cacaueira (Ceplac), o Brasil produziu 220 mil toneladas em 2022, e a safra de 2023 deve ser concluída com 265 mil toneladas produzidas. Por isso, a Abicab afirma que não há risco de desabastecimento.

    Preço pode afetar lucro da Hershey’s

    A Hershey’s, grande fabricante de chocolates, disse na última semana que espera que os preços históricos do cacau limitem o crescimento de seus lucros este ano, em meio a uma desaceleração ainda maior da demanda por seus produtos mais caros.

    “O pânico já está muito presente no mercado, mas, potencialmente, podemos subir ainda mais”, afirmou o analista do Rabobank, Paul Joules.

    “Para mim, o risco real é a próxima temporada. Quando tivermos safras no segundo trimestre, se a contagem for baixa, as pessoas vão questionar se isso é sistêmico”, acrescentou.

    Joules explicou que as doenças que atualmente afetam os cacaueiros na principal região produtora da África Ocidental são muito piores do que nos últimos anos, e que não há outro tratamento além de cortar as árvores e replantá-las.

    Em Nova York, os futuros de cacau da ICE atingiram um novo recorde de US$ 6 mil por tonelada na sexta-feira (9), quase o dobro do início do ano passado.

    Uma pesquisa da Reuters prevê um déficit global de 375 mil toneladas na temporada 2023/24, mais do que o dobro do indicado na pesquisa anterior, em agosto, e marcando o terceiro déficit consecutivo do mercado.

    Os negociantes afirmam que, apesar dos altos preços recordes, os vendedores de cacau físico se retiraram na maioria do mercado, deixando-o com um problema contínuo de liquidez.

    Com informações da Reuters e de Marien Ramos, da CNN.

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