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    Novo marco fiscal prevê que gastos do governo não sejam menores que no ano anterior

    Contudo, conforme texto apresentado pelo relator do projeto, quase sempre, os gastos crescerão menos do que a receita

    Juliana Eliasda CNN , em São Paulo

    O projeto para o novo marco fiscal do país já está pronto para começar a tramitar na Câmara dos Deputados, com a previsão de que possa ser votado no plenário na próxima semana.

    O relator do texto na Câmara, o deputado Cláudio Cajado (PP-BA), apresentou na terça-feira (16) o seu substituto para o texto, com as alterações feitas sobre a proposta original apresentada pelo governo em abril. É esta versão que deve agora ser debatida e aprovada pelos parlamentares.

    Entre as alterações, estão contrapartidas e gatilhos de contenção de gastos mais duros para o caso de descumprimento das regras anuais de resultado primário, além de tornar os cortes do orçamento obrigatórios novamente ao longo do ano caso o saldo nas contas do governo esteja se encaminhando para ficar pior do que a meta estipulada.

    A nova versão do deputado para a proposta do governo, entretanto, manteve praticamente intacto um dos núcleos do projeto apresentado pelo ministro da Fazenda, Fernando Haddad: justamente, os mecanismos que definirão o novo teto de gasto.

    “É um arcabouço bem mais complexo”, diz o economista especializado em contas pública Murilo Viana.“Algo complexo demais dificulta a transparência e a fiscalização, mas não tinha muito como fugir, se não, também, fica muito simples e pode perder a aderência com a realidade, como acabou acontecendo com o teto de gastos”, acrescenta.

    Para a diretora do Instituto Fiscal Independente (IFI), Vilma Pinto, os mecanismos para a correção do teto, como ficaram na versão final, são um exemplo disso.“A regra original do Executivo já era complexa e, com os mecanismos que eles [deputados] colocaram, ficou ainda mais complexo”, disse. “Isso piora os instrumentos de monitoramento.”

    Como fica a trava para os gastos

    O novo marco fiscal foi apresentado pelo governo no mês passado e tem o objetivo de ser a nova legislação do país a controlar o crescimento das despesas e da dívida pública, no lugar do atual teto de gastos.

    O teto de gasto atual, em vigor desde 2017 no país, permite o aumento das despesas do governo apenas pela inflação, o que, na prática, congela os gastos em termos reais.

    Com a nova proposta, o governo continuará tendo um limite anual acima do qual não poderá gastar, seguindo o mesmo conceito introduzido em 2017 pelo teto de gastos.

    O novo teto, entretanto, é menos rígido e um pouco mais complexo.

    Ele passa a atrelar o tamanho do aumento dos gastos ao avanço das receitas, e não só permite, como obriga as despesas a terem sempre um crescimento mínimo acima da inflação. Por outro lado, estipula também um limite máximo para esse reajuste.

    Pela proposta, o gasto previsto no Orçamento para um determinado ano será sempre reajustado pela inflação do ano anterior — como era o teto de gastos original — mais uma pequena variação, limitada a um piso e a um teto de reajuste.

    Essa banda fica estipulada em um piso de crescimento de 0,6% e um máximo de 2,5%, já considerados as correções acima da inflação.

    Dentro desta banda, a correção não poderá ser maior do que 70% do crescimento da arrecadação do governo no ano anterior, também considerado o quanto a receita cresceu acima da inflação.

    Por exemplo:

    • Se a arrecadação do governo crescer 3% além da inflação, os gastos de 2024 poderão crescer a inflação mais 70% desses 3%, ou seja, mais 2,1%.
    • Se a arrecadação federal cair 1% nos 12 meses até junho de 2023, os gastos previstos para 2024 serão reajustados pela inflação mais o reajuste mínimo garantido de 0,6%.
    • Se, por outro lado, a arrecadação crescer 5% mais que a inflação, os gastos poderiam, em teoria, ser aumentados em até 70% disso, ou seja, em 3,5% além da inflação. A regra, porém, limita esse crescimento real ao máximo de 2,5%.

    Isso significa que o gasto de cada ano nunca será menor que o ano anterior, como chegou a acontecer depois do teto de gasto.

    Mas significa, também, que, quase sempre, os gastos crescerão menos do que a receita. A exceção serão os anos em que a arrecadação caia ou cresça menos do que 0,6% além da inflação.

    A inflação usada, já considerada a versão atualizada pelo relator, será a variação do IPCA, índice oficial de preços do país, em 12 meses até junho do ano anterior — exatamente como era feita a correção do teto de gastos original.

    Isto porque o Orçamento para o ano seguinte deve ser sempre apresentado até agosto pelo governo.

    Mas, em um novo ajuste adicionado ao texto pelo relator, o governo poderá, ao fim do ano, ampliar o teto previsto no orçamento para o ano seguinte caso a inflação até dezembro acabe maior do que aquela observada e aplicada até junho.

    Este novo teto “inflado”, porém, não valerá para a correção do teto de gasto do ano seguinte.

    Tanto a correção pela inflação quanto do adicional de aumento real, depois, serão aplicados sobre o valor menor do teto, calculado originalmente pela lei orçamentária apresentada em agosto, com a inflação de junho.

    A ideia é corrigir uma distorção que foi comum nos anos de vigência do teto de gasto: o limite para as despesas do governo cresciam pela inflação de junho, mas o reajuste do salário mínimo, que é doutrinado pela Constituição, deve seguir a inflação do ano completo, em dezembro.

    O salário mínimo, porém, é a base para alguns dos maiores gastos do governo, como aposentadorias, pensões, BPC, abono salarial e seguro desemprego.

    Um aumento maior para ele significa que todas essas despesas crescerão mais do que o previsto no Orçamento, obrigando o governo a cortar em outras frentes para conseguir manter tudo sob o teto de gasto estipulado.

    Foi o que aconteceu, por exemplo, em 2020: a inflação até junho e a ampliação do teto de gastos para 2021 foi de apenas 2,1%, mas a inflação até dezembro, o salário mínimo e todos os benefícios sociais subiram 5,3%, o que “engoliu” a verba disponibilizada para outras frentes.

    O descompasso levou a uma revisão na metodologia da conta pelo governo, no que foi o primeiro de uma série de remendos que vieram depois na lei do teto de gastos e que renderiam a sua morte lenta até aqui.

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