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    Mercosul vê proposta da UE para avançar em acordo como “dura” e “desequilibrada”

    Grupo formado por Brasil, Argentina, Uruguai e Paraguai reagiu de forma negativa à proposta da UE de exigências adicionais na área de proteção ambiental

    Daniel Rittnerda CNN , em Brasília

    O documento da União Europeia que exige novos compromissos ambientais para desbloquear um acordo de livre comércio com o Mercosul foi considerado “duro” e “desequilibrado” pelo bloco sul-americano.

    O grupo formado por Brasil, Argentina, Uruguai e Paraguai reagiu de forma negativa à proposta da UE de exigências adicionais na área de proteção ambiental. Representantes dos dois lados estão reunidos até esta quarta-feira (8), em Buenos Aires, para discutir os próximos passos das negociações.

    Um acordo UE-Mercosul, exaustivamente negociado nas duas últimas décadas, foi finalmente fechado em 2019. O tratado diminui para zero, em um prazo máximo de 15 anos, as tarifas de importação sobre 91% do intercâmbio comercial. A estimativa do Itamaraty é de ganhos de quase US$ 100 bilhões para as exportações brasileiras até 2035.

    Diante dos números crescentes de desmatamento, no governo Jair Bolsonaro, a UE travou a assinatura do acordo. Depois disso, ainda teria que ser ratificado pelo Parlamento Europeu.

    Vários países —como França, Áustria, Holanda— são contra a entrada em vigência do tratado. Parte do governo brasileiro vê essa resistência como mero protecionismo e tentativa de fugir da concorrência em produtos agropecuários, mas o fato é que o acordo simplesmente travou.

    Para contornar as divergências, os dois lados acertaram a negociação de um documento com compromissos adicionais na área ambiental, que incluem a proteção da floresta amazônica. Esse documento — chamado de “side letter” no jargão diplomático — foi apresentado pela UE ao Mercosul na quinta-feira da semana passada (2).

    Na avaliação de fontes do bloco sul-americano ouvidas pela CNN, porém, o texto dos europeus é “duro, ambicioso e desequilibrado”. Para os negociadores do Mercosul, o documento colocado sobre a mesa de negociações extrapola os princípios combinados no passado. A proposta é que o documento seja juridicamente vinculante, ou seja, e caráter obrigatório e válido para os dois lados.

    Um exemplo (sempre de acordo com a versão de funcionários do Mercosul): referências a metas quantitativas no âmbito de outros acordos internacionais, como o Acordo de Paris, que podem limitar o acesso de produtos brasileiros caso não sejam cumpridas — com a suspensão da tarifa zero ou de cotas com tratamento privilegiado.

    O medo dos negociadores sul-americanos é que haja brechas para elevar tarifas e fechar acesso ao mercado europeu para produtos como carne bovina, em uma postura protecionista da UE, contrariando o espírito do tratado comercial e usando o suposto descumprimento de metas como justificativa.

    Procurada, a delegação da UE no Brasil não se manifestou até agora.

    Mercosul rebate

    Desde segunda-feira (6), nas reuniões prévias e nos encontros com a UE, os negociadores do Mercosul discutem a possibilidade de apresentar também uma “side letter” aos europeus.

    O alvo do bloco seria uma nova lei antidesmate, aprovada pelo Parlamento Europeu em dezembro do ano passado, que também pode servir de pretexto para a imposição de barreiras comerciais

    A lei impede a entrada no bloco de produtos com origem em áreas desmatadas depois de 31 de dezembro de 2020 — mesmo que a supressão vegetal tenha sido regular, de acordo com a legislação de cada país, como o Código Florestal Brasileiro.

    Um dos pontos de maior aflição entre os exportadores brasileiros é a exigência de que as companhias apresentem relatórios demonstrando a rastreabilidade de sua cadeia de produção, podendo criar burocracia e excluindo pequenos produtores que terão dificuldade de se adequar.

    A lei aprovada inclui várias commodities brasileiras, como soja, milho, café, carne bovina, suína, frango e ovinos, madeira, cacau, borracha e papel.

    Revisão do acordo

    Um ponto já mencionado pelos governos do Brasil e da Argentina, incluindo o próprio presidente Luiz Inácio Lula da Silva, é a parte do acordo de livre comércio que aborda o tema de compras públicas.

    Como é comum em tratados comerciais, a parceria UE-Mercosul estabelece tratamento nacional para produtos e serviços dos países signatários nas licitações de bens e serviços.

    Isso significa, por exemplo, que as Forças Armadas não poderiam comprar uniformes mais caros para seus recrutas unicamente para fortalecer um segmento da indústria brasileira e nem poderiam ser dadas preferências a equipamentos nacionais em alguma obra de infraestrutura. Não pode haver vantagens nas licitações em relação aos fornecedores da UE.

    Lula e o presidente da Argentina, Alberto Fernández, veem esse ponto com preocupação e já mencionaram a intenção de renegociar o assunto. A UE rejeita a hipótese de reabrir as discussões.

    A Argentina tem eleições presidenciais em outubro, o que é sempre visto com sensibilidade para a negociação ou a ratificação de acordos de livre comércio. Principalmente no caso do tratado UE-Mercosul, que o país vizinho enxerga como ameaça à sua indústria.

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