Mercado reage bem à alta dos juros, mas fiscal e exterior devem voltar a pesar
A perspectiva de uma política monetária mais restritiva agora, as taxas curtas e médias, mais sensíveis às perspectivas para as decisões do Copom, tendem subir
Os mercados de juros e câmbio reagiam bem à elevação de tom pelo Banco Central na noite de quarta-feira, quando os juros foram aumentados em 1 ponto percentual, mas analistas ponderam que o fôlego dos ativos pode se limitar ao curtíssimo prazo, devido a todo o ambiente de riscos que circunda a política monetária, com destaque para o fiscal doméstico e revezes no exterior.
A inclinação da curva de juros (uma medida de percepção de risco) caía nesta quinta, com o spread entre os DIs janeiro 2027 e janeiro 2023 em baixa de 6,5 pontos-base, para 116 pontos-base. E o dólar chegou a cair 1,5%, com o real no topo dos melhores desempenhos globais no dia. O dólar, contudo, já reduziu a baixa para 0,4%.
Investidores ainda estavam sob efeito do texto mais duro do Copom, que na véspera não apenas acelerou o passo de aumento de taxa como contratou novo movimento agressivo na Selic para setembro e virou de mão ao dizer que o juro agora deve ficar acima do patamar neutro para debelar pressões inflacionárias.
Com a perspectiva de uma política monetária mais restritiva agora, as taxas curtas e médias –mais sensíveis às perspectivas para as decisões do Copom– tendem a subir. Ao mesmo tempo, os vértices mais longos, pelo livro-texto, experimentam alívio, já que com a inflação controlada haveria menos necessidade de se manter juros mais altos no futuro.
Porém, mesmo a desinclinação da curva de juros brasileira nesta quinta refletia certa desconfiança do investidor. O desenho da curva nesta sessão é o que profissionais do mercado chamam de “bear flattening” –quando os juros curtos saltam e os longos resistem a cair ou caem menos–, revelando ansiedade sobre a capacidade de o BC evitar mais aperto monetário no futuro.
“Teria tudo para começar uma desinclinação da curva pela política monetária e teria tudo para um dólar mais fraco pelo diferencial de juros, mas existe um problema fiscal”, disse Adauto Lima, economista-chefe da Western Asset.
“No fim, você está sinalizando ao mercado: fique desconfiado sobre o teto de gastos”, completou, lembrando o noticiário recente acerca de despesas fora do teto de gastos e discussões sobre adiamento de pagamento de precatórios, as quais sacudiram os mercados locais.
Um ponto importante a nortear as apostas na curva é se o próximo movimento do BC, findo o processo de normalização monetária, será de alta ou queda dos juros. Para Sérgio Zanini, sócio-gestor da Galapagos Capital, com o BC mais rigoroso no curto prazo, há chances de o próximo ciclo ser de alívio.
“Isso por si só deveria ajudar na estrutura a termo da curva, mas de toda forma vai ficar um prêmio de risco por expectativa de deterioração fiscal pelas questões dos últimos dias.”
De toda forma, com o rali dos DIs nos últimas dias, Zanini disse ter aproveitado para adicionar posições vendidas em taxa. De maneira resumida ele afirmou que as posições atuais representam “um terço do tanque cheio” e que os “forwards” de juros (taxas acumuladas entre trechos específicos da curva) poderiam convergir para cerca de 9%, o que se traduziria em queda de 40 a 50 pontos-base nos DIs janeiro 2025 e janeiro 2027.
“Esse seria o primeiro movimento de reconquista de credibilidade pelo BC, tirando o fiscal”, afirmou o gestor. “Os níveis de taxa que estamos vendo já embutem muito prêmio de risco político-fiscal.”
Câmbio
Para o dólar, há um componente forte vindo de fora que turva os cenários de uma moeda muito abaixo dos patamares atuais. Os bancos centrais globais têm acelerado os debates sobre saída das medidas adotadas em 2020 em combate aos efeitos econômicos da pandemia, o que pode levar a redução de estímulos e a alta nas taxas de juros.
“São um componente a favor e três contra: o juro (doméstico) alto ajuda o real, mas tem commodities que devem parar de subir, política monetária lá fora e uma percepção de risco para emergentes como um todo e Brasil”, disse Roberto Padovani, economista-chefe do banco BV.
Com isso, ele espera que o dólar suba ante os patamares atuais e feche 2021 em 5,40 reais, indo a 5,60 reais ao fim de 2022. A moeda rondava 5,17 reais nesta sessão.
“O dia está mais calmo hoje no câmbio, reação do dia seguinte, mas juro sozinho não segura o dólar. Ele ajuda a conter pressões, mas não implica tendência de apreciação.”
Apesar de ver um cenário mais benigno para o real contra moedas diversas, Zanini, sócio-gestor da Galapagos Capital, prefere evitar um confronto direto com o dólar, justamente pela incerteza sobre o que vem da política monetária norte-americana.
“Sexta-feira tem ‘payroll’, e a gente acha que esse dado vai ser superimportante para a trajetória do dólar nas próximas semanas”, disse.
Nas posições contra outras divisas, dois terços são de alta do real contra o rand sul-africano e o restante dividido entre real/dólar australiano e real/euro.